terça-feira, 15 de maio de 2007

Saúde Única


Saúde Única: a interconexão entre diferentes elementos da saúde global
Somos marcados pelas inter-relações entre seres humanos, animais e meio ambiente. Não existe dúvida de que um interfere no outro. As consequências dessa interconexão podem ser harmónicas, mas quando um dos elementos se desequilibra, acaba impactando nos outros com quem ele se relaciona.

Esse impacto pode ter vários desfechos. A análise dessas influências não é fácil e a conclusão de que houve ou não prejuízo depende do ponto de vista. Desastres naturais, como enchentes, desmoronamentos, até doenças que não existiam e passam a ocorrer, são exemplos de consequências que podem impactar essa tríade.

A fim de abordar essa inter-relação e propor soluções sob uma perspectiva interdisciplinar, foi criada a abordagem conhecida como One Health ou Saúde Única.

A Saúde Única é uma abordagem transdisciplinar para temas complexos, envolvendo as interações entre diferentes esferas da saúde global. “Um conceito que exige parcerias inclusivas e sustentáveis, apoio a pesquisas colaborativas transdisciplinares e intervenções que consideram a saúde indissociável de seres humanos, animais e meio ambiente”, disse Francisco Edilson, coordenador substituto da Coordenação-Geral de Vigilância de Zoonoses e Doenças de Transmissão Vetorial do Ministério da Saúde.

Francisco relata que essa abordagem surgiu como um pensamento mais forte devido aos riscos de doenças que podem ser causadas nos seres humanos, em decorrência de desequilíbrios que ocorram entre essa relação homem, animal e meio-ambiente. “Vários surtos, várias pandemias e doenças endémicas ocorrem ou mudam o padrão devido a esse desequilíbrio. Por isso, chegou-se à conclusão que não adianta agirmos apenas tentando prevenir ou controlar a doença com ações voltadas para os seres humanos, porque não haveria uma efetividade, uma eficiência nesse processo. É necessário olhar para o todo.”, explicou ele.

Para Luciana Gallo, consultora Nacional da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), embora a abordagem de Saúde Única seja feita há muitos anos em vários países, no Brasil está mais estruturada nos últimos 15 anos. “Nessa abordagem, a prioridade é proteger e promover a saúde humana. A maioria das doenças infecciosas tem um componente zoonótico, mas temos ainda as doenças que estão relacionadas ao meio-ambiente”, afirmou ela.

A consultora explicou que a equipe de emergências da OPAS Brasil, como parte das agências da Organização Mundial da Saúde (ONU), trata essa temática em tripartite, com a Food and Agriculture Organization (FAO) e a Organização para a Saúde Animal (OIE). “Podemos citar a abordagem de One Health no enfrentamento à covid-19, por exemplo, ao recomendar que as salas de uma unidade de saúde sejam bem ventiladas, e que as janelas fiquem abertas, se possível, mas colocando tela para evitar a entrada de vetores, como o Aedes aegypti”, contou.

Visão interdisciplinar
De acordo com Francisco, é essencial unir pesquisadores, docentes e estudantes de diversos cursos, profissionais de saúde que atuam nos serviços relacionados à interseção interdisciplinar, como saúde animal, humana e ambiental, assim como profissionais de empresas privadas e governamentais para que desenvolvam atividades relacionadas à Saúde Única. “Prevenir o desequilíbrio no meio ambiente, na saúde dos animais e na saúde do humano, é mais eficiente e pode evitar epidemias, endemias e até pandemias”, ponderou ele.

Francisco relata que um histórico de doenças que surgiram em animais por essa interface muito próxima entre animal silvestre, animal doméstico, ser humano e meio ambiente, citando como exemplo a gripe espanhola.

O coordenador falou também de alguns fatores importantes que denotam a necessidade dessa abordagem. “Destacamos o crescimento populacional, a urbanização não planejada, o desmatamento, a ocupação ilegal de terras florestais, além de todo o processo de globalização das viagens, do comércio, que atualmente eliminam as fronteiras da população humana e animal, afetando todo o ecossistema”, frisou.

One Health no Sistema Único de Saúde (SUS)
Em relação às ações de saúde única no Brasil e como ela tem sido trabalhada no SUS, é importante destacar as atividades específicas para o controle e prevenção de algumas doenças, especialmente as doenças zoonóticas, que são transmitidas entre homens e animais. “São ações voltadas para animais ou vigilância de casos de animais, visando identificar mudança de padrão da transmissão, prevenindo doenças neles e consequentemente prevenindo doenças nos humanos”, contou Francisco.

Ele destacou algumas condutas realizadas, como a vacinação e a vigilância de casos de raiva em animais. “A vigilância e a vacinação são consideradas uma abordagem de Saúde Única, pois visam identificar um desequilíbrio na transmissão do vírus na população animal. Quando agimos para proteger aquela população animal por meio da vacinação, diminuímos o risco de transmissão para os seres humanos”, exemplificou.

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