quinta-feira, 19 de maio de 2005

Encontros Improvávei- Mário de Sá-Carneiro, Paul Valéry e Huber Reeves

Tal como acontece com o título da edição original de "Um Pouco Mais de Azul", de Hubert Reeves, Patience dans l´Azur [1], que reproduz um verso do poeta Paul Valéry, o título da edição Portuguesa, proposto pelo editor ao autor que o aprovou, Quase de Mário de Sá-Carneiro.


Quase

Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...

Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!

De tudo houve um começo ... e tudo errou...
— Ai a dor de ser — quase, dor sem fim...
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...

Momentos de alma que,desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...

Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol — vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...

Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...

Um pouco mais de sol — e fora brasa,
Um pouco mais de azul — e fora além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

                           Paris, 13 de Maio de 1913

[1] “Patience, patience.
Patience dans l'azur
chaque atome de silence
est la chance d'un fruit mûr !”
Paul Valéry



"Quase" é um poema melancólico e introspectivo de Mário de Sá-Carneiro que reflete sobre a solidão e a incompletude da vida.

O poema começa com a expressão "Quase que tudo se esvai" sugerindo uma sensação de perda e frustração em relação ao que poderia ter sido alcançado, mas não foi. A seguir, o poema evoca imagens da natureza e de elementos naturais como o mar, a areia e o vento, que simbolizam a passagem do tempo e a transitoriedade da vida.

O eu lírico parece refletir sobre a fugacidade da vida e como ela pode ser vista como uma busca constante e inacabada. A sensação de vazio e falta de sentido é expressa na frase "Busco algo, que sem saber, / Já vem longe de mim fugindo."

A presença de uma segunda pessoa, mencionada na expressão "Alguém que por aqui passou" pode ser interpretada como um símbolo da busca por conexão e sentido, mas a passagem rápida dessa pessoa sugere que essa busca é muitas vezes frustrante e efémera.

O poema termina com a imagem de um pássaro que voa livremente no céu, o que pode ser interpretado como uma metáfora para a liberdade e a busca constante pela plenitude que muitas vezes não é alcançada.

Em suma, "Quase" é um poema que trata de temas universais como a busca pelo sentido da vida, a transitoriedade da existência e a sensação de incompletude.

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