terça-feira, 22 de novembro de 2016

O degelo do Árctico de 1979 a 2016


As tendências da espessura / volume do gelo marinho são um indicador importante da mudança climática no Ártico. Enquanto as observações de espessura do gelo do mar são escassas, aqui utilizamos o modelo de gelo oceânico e marinho, PIOMAS (Zhang e Rothrock, 2003) para visualizar a espessura do gelo marinho de Outubro de 1979 a 2016. O gelo marinho com menos de 1,5 metros está mascarado  (a negro) de modo a enfatizar a perda de gelo mais grosso, mais velho.

Esquizofrenia Climática: A Conferência de Marraquexe e a realidade mundial

Decorreu em Marraquexe a Vigésima-segunda Conferência das Partes sobre Mudança Climática (COP 22). Realizada um ano depois da COP 21, que foi celebrada logo no seu encerramento como uma conjugação de vontades que terá vindo salvar a Humanidade, os especialistas dizem ser esta uma conferência intermédia, que verifica, acompanha e visa garantir a aplicação do Acordo de Paris.

Nesta ocasião, os ecologistas e a generalidade dos cidadãos inquietos perguntam: pode a atual situação acomodar-se a conferências de menor relevância neste domínio, porventura dedicadas à simples gestão do que foi acordado? Está efetivamente consolidado aquilo que foi alcançado pelo Acordo de Paris? E contém este acordo o necessário para fazermos as mudanças – numa escala e numa urgência nunca antes tentados pela humanidade – que impedirão que a vida humana no planeta seja aterradora, se não simplesmente impossível, a muito breve prazo? As respostas, ou sobretudo a falta delas, indiciam a verdade da situação.

A situação global, seja no plano ambiental, seja no político e social, é profundamente inquietante. Os acontecimentos internacionais mais recentes vieram torna-la cristalina, desmentindo o, porventura bem-intencionado, comunicado de Patricia Espinosa, a responsável do Clima nas Nações Unidas, que afirmou ser esta uma conferência que decorre enquanto «todos os países do mundo estão empenhados numa ação global decisiva contra as alterações climáticas». Estão mesmo todos empenhados? Vejamos: o maior produtor e consumidor mundial de hidrocarbonetos, assim como segundo maior emissor de CO2, acaba de eleger – para todas as suas instâncias governativas – responsáveis que manifestam inequivocamente a sua rejeição destas preocupações, reiterando simultaneamente o seu projeto de reinvestimento maciço nas práticas mais agressivas para o clima e para o ambiente em geral. A ratificação do Acordo por parte do Presidente Obama era já extremamente frágil, uma vez que o poder legislativo se lhe opunha. Agora, essa ratificação é mais ilusória do que nunca. Poderão ou quererão os outros países ficar indiferentes a essas tendências que parecem vir repor um industrialismo hoje impossível e arcaico? Sendo notório que as políticas para o ambiente pressupõem necessariamente que o planeta não pode já ter fronteiras nas questões essenciais, e quase tudo está hoje nessa posição, a palavra «fronteira» voltou a ser uma palavra-chave da política contemporânea. À medida que ela reaparece e se volta a enraizar nas consciências, mais as políticas climáticas são impossíveis de concretizar, sobretudo porque essas fronteiras são também as inimigas das comunidades e das economias locais.

Paris: Um Erro de Cálculo?


É certamente importante existir um acordo global sobre as mudanças climáticas. Mas sinais inquietantes previnem-nos de que talvez este acordo esteja a ser entendido, na realidade, como uma permissão para poluir dentro de um quadro de pequenas medidas na área da chamada economia verde, que pouco altera o esquema dos grandes interesses, permitindo abandonar inquietações incómodas e porventura opostas aos negócios usuais. Ora, o que não é de todo usual é a evolução do comportamento do clima. Como disse em setembro passado o Professor Jason Box, um dos membros das equipas que monitorizam constantemente a Gronelândia, «a mudança climática abrupta está a caminho (…): os glaciares estão a mover-se mais rapidamente do que a política». Os mecanismos de realimentação e autorreforço desencadeados pelo aquecimento global associam esse fenómeno a outros efeitos, como a libertação de metano, imensamente mais indutor de efeito de estufa do que o próprio CO2 libertado na atmosfera. Quando julgávamos que a comunidade internacional também começara a mover-se, percebemos que os compromissos climáticos atuais nos conduzem antes aos 3ºC, ou mais, acima dos níveis do período da Revolução Industrial, o dobro do 1,5ºC adiantado pelo Acordo de Paris.

A Conferência de Marraquexe decorreu no preciso momento em que a indústria petrolífera, incluindo em Portugal, se expande globalmente, a uma escala nunca vista, graças a novas tecnologias e a processos cada vez mais invasivos. A deflorestação continua a progredir apesar de existir, supostamente, uma consciência global sobre o desastre que ela representa. A indústria automóvel parece viver de novo belos dias de expansão; a aviação civil emite CO2 como nunca na história; o comércio mundial alcançou uma escala da circulação dos produtos, incluindo dos nossos alimentos, que é ambientalmente e energeticamente absurda. Como pode a COP 22 ser relevante se não for capaz de enfrentar diretamente estes aspetos? Marraquexe só faria sentido se, para além de levar Paris a sério, fosse muito mais ambiciosa e souber ler as tendências que são já visíveis para todos. Para tal, poderia começar por colocar a revisão crítica do modelo industrial, da alimentação humana e dos hábitos de consumo, sem esquecer a anulação urgente de todos os projetos atuais de extração de combustíveis fósseis, na balança das medidas verdadeiramente urgentes. Sem essa agenda, Marraquexe é mais uma etapa no falhanço histórico de um acordo sem potência política, ética ou simplesmente humana.

Texto por Campo Aberto - associação de defesa do ambiente (adaptado)

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