quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Alfredo Sendim - Histórias de Mudança


Alfredo Sendim, em Portugal, tinha sempre vivido em Lisboa e era um apaixonado pelo mar – a sua ligação à terra era inexistente. Queria entrar em Oceanografia mas acabou por entrar em Engenharia Zootécnica em Évora, na altura um desterro aos seus olhos. Acabou por se render aos encantos da cidade e, consequentemente, do campo.

Inesperadamente, após um período de 15 anos de nacionalização, surgiu a oportunidade de voltar à Herdade do Freixo do Meio, outrora da sua família e, acabado de se licenciar, abraçou o projecto com a mãe, ainda que sem qualquer experiência. Voltaram à Herdade no ano de 1990 com três culturas: a cortiça, as ovelhas e o trigo (já em completo declínio).

No início não tinha quaisquer noções de questões relacionadas com a natureza mas foi descobrindo através da experiência e também por casualidade – por exemplo, começou a trabalhar com Ana Fonseca no Freixo, que acabada de se licenciar em Ciências do Ambiente lhe pediu para fazer uma tese de mestrado sobre o montado. E, de repente, metade da sua vida é investida e dedicada à produção de alimentos e matérias primas na agricultura, na floresta e na pecuária.

Alfredo não identifica um momento em que mudou radicalmente e passou a ser muito mais consciente em relação a problemas sociais ou ambientais, olha apenas como uma construção gradual, de consciência crescente, que provavelmente terá começado a ser mais firme a partir dos seus 30 anos.

É perante esta consciência de colaboração activa com a Natureza, numa linha muito humilde entre a responsabilidade e desapropriação da terra, que Alfredo foi percebendo e vai concretizando a sua vocação em voltar a investir no montado, através da agroecologia.
A agroecologia surge como a solução por excelência: resolve todas as nossas necessidades respeitando a lógica e os tempos da Natureza, não matando os bichos que matamos diariamente, não saturando a terra mas contribuindo para o melhor funcionamento da terra, dos seus ecossistemas e biodiversidade – dá-nos exactamente o que precisamos, na quantidade e diversidade que precisamos.

E é assim que o grande projecto Herdade do Freixo do Meio ganhou bases firmes para se lançar e acolher os demais projectos que lá podemos encontrar hoje em dia, procurando a sustentabilidade económica a par da prática efectiva de políticas sociais e ambientais adequadas.

Por exemplo, quando percebeu que a falta de clientes se devia a uma enorme ignorância, da qual o próprio Alfredo já tinha sido alvo, relativamente às vantagens deste modo de gestão e produção, criou também serviços turístico-didácticos, para promover a informação e, desta forma, maior consciência. Também nesta lógica, integrou e fez outros integrarem o programa CSA, gerando mais comunidade, mais partilha, mais cooperação e, claro, mais segurança. O programa CSA combate, também, a desresponsabilização de tudo o que é importante e comum tornando todos aqueles que o integram co-responsáveis por tudo o que se pratica na Herdade do Freixo, neste caso.

A este projecto já se renderam agricultores, escolas, consumidores… isto porque a Herdade do Freixo do Meio garante uma sustentabilidade e segurança alimentar inigualáveis. Hoje em dia o Freixo do Meio acolhe também pequenos negócios complementares (produção de ovos, mel, entre outros), assentando a sua gestão na complementaridade. 

Alfredo é um exemplo de alguém que não desistiu até encontrar soluções sustentáveis e rentáveis para a agricultura biológica. E mostra-nos como é acessível a todos, não numa perspectiva imediata mas gradual e sobretudo de desenvolvimento pessoal, sugerindo a consciência como primeiro passo.

“Estou cada vez mais convencido de que um dos papéis mais dignos do homem é a capacidade de entendermos o funcionamento do que está à nossa volta. Temos essa capacidade por termos a ligação com o material e o espiritual. Quando percebemos o funcionamento da natureza, somos capazes de verdadeiramente criar édenes.”

Alfredo Sendim desafia-nos a uma função muito simples: contribuirmos para a construção de uma realidade maravilhosa neste planeta quer a nível de relacionamento humano, quer a nível da natureza.

Livro: Agroecologia- Miguel Altieri

Conceitos:

Agricultura Biológica: tipo de produção que visa produzir alimentos e fibras têxteis de elevada qualidade, saudáveis, ao mesmo tempo que promove práticas sustentáveis e de impacto positivo no ecossistema agrícola. Através do uso adequado de métodos preventivos e culturais, tais como as rotações, os adubos verdes (não se recorre à aplicação de pesticidas nem adubos químicos de síntese, nem ao uso de organismos geneticamente modificados), a compostagem, as consociações e a instalação de sebes vivas, entre outros, melhora a fertilidade do solo e a biodiversidade.

Agroecologia: é uma abordagem integrada da agricultura e alimentação, a nível local, espelho da sabedoria e experiências tradicionais. Que une a ecologia, a cultura, a economia e a sociedade e permite a manutenção de uma agricultura produtiva que assegura rendimentos regulares e optimiza a utilização de recursos locais ao mesmo tempo que reduz os impactos ambientais e socio-económicos negativos resultantes de práticas intensivas. Conserva o ambiente saudável e potencializa o futuro das comunidades exactamente porque respeita activamente os ecossistemas.

CSA - Community-Supported Agriculture: agricultura que é suportada pela comunidade, isto é, uma forma alternativa de produção alimentar em que os consumidores e produtores cooperam e partilham os riscos e benefícios.


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