quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Quando James Bond foi Jaime Bravo em Portugal (e teve um jogo de tabuleiro)


Foi em 1957, quatro anos depois da publicação de Casino Royale, o primeiro livro de James Bond, que Ian Fleming foi abordado para adaptar as aventuras de 007 em banda desenhada (BD), em tiras diárias. A proposta, bastante lucrativa, veio do diário Daily Express, e Fleming começou por hesitar, porque pensava que uma versão em BD de James Bond poderia não estar à altura, em termos de qualidade gráfica, da sua escrita. Em vez de beneficiar a divulgação e as vendas dos livros, poderia, pelo contrário, prejudicá-las, bem como desagradar aos leitores e até mesmo fazê-lo desleixar-se enquanto escritor e afetar as futuras histórias de 007.

Ian Fleming acabou por aceitar a oferta, e foi ele a escolher o autor das adaptações, o desenhador John McLusky. A primeira, de Casino Royale, precisamente, saiu em 1958 no Daily Express, escrita por Henry Gammidge. Seguir-se-iam várias outras, com bastante sucesso, e sem fazerem a menor mossa nos livros de James Bond – tudo pelo contrário. Estas adaptações desenhadas por John McLusky e com texto de Gammidge chegaram a Portugal em 1961, pela mão da sempre empreendedora Agência Portuguesa de Revistas, que editava então várias revistas de BD ainda hoje recordadas e referidas com saudade, caso do Mundo de Aventuras, Condor ou Ciclone.

As histórias de James Bond foram publicadas noutro dos títulos da Agência Portuguesa de Revistas, a revista Policial, subsidiária do referido Mundo de Aventuras, e na qual saíam as aventuras de heróis ingleses e americanos como Sexton Blake, Paul Temple, Kerry Drake, Rip Kirby, Maxwell Hawke ou Drake & Drake, entre outras. Nessa altura, era prática comum arranjar nomes portugueses para os heróis estrangeiros (e daí que, por exemplo, Big Ben Bolt se tenha tornado Luís Euripo, ou Joe Palooka, Zé Sopapo, só para referir dois dos mais ridículos), e James Bond não escapou a isto, sendo transformado em… Jaime Bravo.

A revista Policial publicou apenas duas histórias de James Bond/Jaime Bravo: Aventura em Cuba, em abril de 1961, adaptada de Live and Let Die, e Um Caso de Espionagem, em janeiro de 1962, adaptada de From Russia, With Love, e que iria chamar-se Moscovo Contra 007. Um censor mais melindroso (e que ignorava decerto que as aventuras de James Bond eram anti-comunistas…) não gostou da palavra “Moscovo” no título, e este foi alterado pelos responsáveis da Agência Portuguesa de Revistas para o muito mais inócuo Um Caso de Espionagem. Uma ou duas cenas de beijos envolvendo “Jaime Bravo” e as suas conquistas femininas foram também retocadas graficamente.

À altura da publicação destas duas histórias de “Jaime Bravo” em Portugal, os livros de James Bond ainda não tinham sido filmados. Depois destes começarem a ser levados ao cinema, a Policial não voltou a ter mais nenhuma aventura do “aportuguesado” James Bond, o que talvez se possa explicar pela subida do preço dos direitos da BD, causada pelo imediato e enorme sucesso dos filmes. Em 1965, seria também posta à venda cá a versão portuguesa do primeiro – ou um dos primeiros – jogos de tabuleiro da personagem de Ian Fleming, o muito rudimentar The James Bond 007 Secret Service Game. A caixa era igualzinha à da edição original inglesa, excetuando a cor, amarela em vez de roxa. E James Bond desta vez já não era “Jaime Bravo”.

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