por Maria do Carmo Cruz
Dizer coisas que não agradam a todos é bom sinal, sei-o bem. E quando nos expomos a fazê-lo sabendo, de antemão, que não vamos mesmo agradar a muitos, temos que estar preparados para o que daí pode vir. Tenho quase 75 anos, já fiz, não fiz, disse e omiti muita coisa mas não quero ser cúmplice por omissão num assunto tão importante: é preciso mudar a Escola.
Dizer coisas que não agradam a todos é bom sinal, sei-o bem. E quando nos expomos a fazê-lo sabendo, de antemão, que não vamos mesmo agradar a muitos, temos que estar preparados para o que daí pode vir. Tenho quase 75 anos, já fiz, não fiz, disse e omiti muita coisa mas não quero ser cúmplice por omissão num assunto tão importante: é preciso mudar a Escola.
Sim, é preciso, mas, e perdoem-me os que já mudaram, a começar pelos professores. Mesmo os mais jovens aprenderam pela “antiga cartilha” e há uma tendência natural a manter as coisas. Depois, as editoras escolares, agora muito concentradas, encarregam-se de, através dos materiais que acompanham os manuais, tentar uniformizar estratégias e técnicas. E aquilo que só deveria servir como sugestão torna-se o modelo. Como se todas as turmas fossem um rebanho de iguais. E isto apesar de encontrar cada vez mais erros e estratégias pouco pedagógicas em manuais que por aí andam.
Muitos professores precisam de mudar e eu sei que o querem fazer, mas o seu tempo é curto para tantas tarefas. Mas por que se acomodam? Por que se sujeitam à exaustão, que não é só fruto do muito trabalho mas também da insatisfação que sentem relativamente a si próprios? Por que não tentam, pelo menos, chamar os pais para a sua luta, colocá-los a seu lado para exigir melhores condições para exercerem dignamente a sua importantíssima actividade? Porque, se foi possível conseguir tanta mobilização aquando do assunto escola pública versus escola privada, deverá ser possível mobilizar o país para o seu assunto mais importante, que é a Educação, isto é, o Futuro.
Termino com dois testemunhos que considero muito importantes. O primeiro, retirado da obra “Gramática escolar e (in)sucesso", da Doutora Ilídia Cabral e que é, como verão se lerem, “um dois em um”:
“O modelo escolar vigente, com a sua específica gramática, é um produto que se mantém inalterado desde a sua moderna origem, contemporâneo da revolução industrial e da consolidação da generalidade dos Estados europeus. Sucedendo a um modelo artesanal de ensino, a escola, tal como a concebemos, serve os propósitos da escolarização acelerada da mão-de-obra reclamada pela fábrica e exigida pela identidade dos estados-nação.
Escolarizar os camponeses segundo um padrão fabril de estandardização de tempos, espaços, sequências de trabalho, cumprimento de horários e valores próprios das cadeias de montagem e socializar os cidadãos numa ordem alfabetizada que permitisse a progressiva instauração de uma democracia representativa, foram os dois grandes desígnios da invenção da escola moderna. (…)
“O acesso massificado à educação foi acompanhado de uma correspondente subida dos níveis de reprovação e abandono escolar, precisamente porque a Escola não mudou estruturalmente e “continuou a servir o mesmo menu curricular, utilizando os mesmos utensílios metodológicos e a mesma linguagem de acção pedagógica que a tinham estruturado como uma instituição destinada a uma classe de público tendencialmente homogéneo e socialmente pré-selecionado” (M. C. Roldão, in Inovação, Currículo e Formação, pág.125).”
Retirei o segundo texto de uma carta da Dra. Maria João Peres, publicada no Facebook pela Católica Educação do Porto, a quem desde já peço desculpa pelo abuso:
“Gente, o que vai ser preciso acontecer para os professores perceberem que este modelo de escola não dá mais?! Que não são os miúdos que têm de se moldar a nós, mas nós a eles? Que o tempo não volta para trás - e acelera mais e mais e mais? Que estes miúdos nasceram e vivem num futuro que nós nunca sonhámos e para o qual temos de os preparar? Quando vamos parar de nos queixar deles nos acharem obsoletos quando efetivamente o somos e pouco ou nada fazemos para deixar de o ser?!”
O que não devemos, na minha opinião, é continuarmos a agir como se não tivéssemos culpas nenhumas porque “apenas fazemos aquilo que nos mandam”. Porque, e voltando à minha velha mania dos aforismos, “tão criminoso é o mandante como quem comete o crime”.
1 comentário:
Espectáculo!
Não me posso esquecer "disto"
lá no meu espaço
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