quinta-feira, 16 de novembro de 2023

Chuva e vento permitem vários dias de consumo renovável. Vai ser cada vez mais frequente


Durante dois dias, no final da semana passada, o consumo de eletricidade em Portugal foi assegurado por fontes renováveis, sobretudo energia eólica e hídrica, devido às "condições favoráveis de vento e chuva". O anúncio da REN - Redes Energéticas Nacionais entusiasmou o Governo e a maioria dos agentes ligados ao ambiente.

Num comunicado divulgado no sábado, dia 28, a REN dava conta de que o consumo de eletricidade estava a ser assegurado por fontes renováveis desde as 22.30 de sexta-feira. E prolongou-se até domingo. Desde essa hora até às 00.00 de sábado foram gerados 97,6 Gigawatts-hora (GWh) de energia eólica, 6,6GWh de energia solar e 68,3GWh de energia hídrica, que "asseguraram o consumo de 137,1GWh", adiantava a REN, anunciando que "os excedentes de produção têm sido exportados através da interligação com Espanha".

Segundo a empresa, desde as 09.00 horas do dia 24 de outubro, o consumo de eletricidade em Portugal foi assegurado por energias renováveis, apesar de "recorrer à importação de eletricidade de Espanha em alguns períodos".

De acordo com o comunicado, "a passagem à exportação plena decorreu na sexta-feira, dia 27 outubro, pelas 17.00 horas, em que Portugal passou a exportador de eletricidade em 100% do tempo".

Citada pela Agência Lusa, a REN sublinhava que, por questões de equilíbrio entre a geração e o consumo, entraram, no mesmo dia, em operação dois grupos em duas centrais térmicas de ciclo combinado a gás natural entre as 16.00 e as 22.30, "findas as quais o consumo de eletricidade em Portugal passou a ser abastecido com produção 100% renovável, e ainda com saldo exportador para Espanha".

Pedro Nunes, coordenador do grupo de Energia, Clima e Mobilidade da associação ambientalista Zero, acredita que os dois dias verificados nesta semana fazem parte de "uma boa notícia que antecipa já, de alguma maneira, aquela que será a realidade do sistema elétrico português em 2030". Isto quer dizer que, nessa altura, o país deverá ter "100 por cento de eletricidade renovável e que, para já, conseguimos ter o sistema a funcionar sem ir abaixo". Por ora, "isto só é possível em situações excecionais, mas a tendência será tornar-se a norma", afirma o dirigente daquela associação.

Não é a primeira vez que a situação de pleno consumo renovável se verifica, embora só aconteça "quando temos um quadro excecional de vento e chuva abundante. Neste caso, até foi mais o vento: tivemos mais energia eólica do que hídrica a ser produzida", sustenta Pedro Nunes.

A verdade é que, apesar de dias nublados, até a energia solar acabou por ter algum peso. E isso, em 2030, será uma constante. "Teremos uma grande bossa (é assim que ela aparece nos gráficos durante o dia, porque começa a produzir de manhã, tem ali um apogeu a meio do dia e depois, à noite, volta a deixar de ser produzida) de energia solar".

No grupo de Energia, Clima e Mobilidade da Zero, não há dúvidas de que "esta situação tenderá a repetir-se cada vez com mais frequência, até ser a norma".

O facto é que temos cada vez maior incorporação de energia renovável no sistema elétrico. De acordo com a revisão do PNEC (Plano Nacional de Energia e Clima), "temos 47GW previstos de energia renovável - o que é muita potência instalada - em 2030. E portanto isto será muito mais a norma do que a exceção".

Uma viagem ao futuro
O regozijo tomou conta também da Associação de Energias Renováveis (APREN), ao cabo de mais dois dias em que fizeram o pleno. "Estamos a desenhar todo um sistema elétrico para ter incorporação de renovável cada vez maior e que permita chegar ao maior número possível de consumidores", afirma ao DN Pedro Amaral Jorge, presidente da direção.

"As renováveis vão suprir uma dimensão adicional que é a segurança energética. Quando nós temos dias em que o conjunto da eletricidade em Portugal é 100% suprido em fontes renováveis, isso é uma viagem ao futuro", sublinha Pedro Amaral Jorge. Também ele antevê que, nos próximos anos, teremos "esse comportamento na maior parte dos dias do ano e não apenas quando as condições concomitantes de eólica e hídrica o permitem".

"Este é o desenho do mercado de eletricidade. Obviamente que ficamos muito contentes que tenhamos já dias em que isso acontece e que todo o sistema elétrico - os produtores de eletricidade, as redes, os consumidores - conseguem gerir toda esta incorporação de renovável sem haver falhas", conclui o presidente da APREN, que espera ver, em 2030, "cerca de 85 a 90% renovável o consumo de energia no país".

Mas o que à partida parece uma boa notícia reveste-se de outras preocupações para a Iris - Associação Nacional de Ambiente. O presidente, Paulo Pimenta de Castro, aponta, por exemplo, "a questão da biomassa, porque vai ter impacto na redução do arvoredo e consequentemente na biodiversidade".

Além disso, o ambientalista lembra que tanto os fotovoltaicos como os parques eólicos "são muitas vezes projetados para áreas de reserva ecológica ou da Rede Natura 2000, como está atualmente a acontecer em Sines".

"Nós somos favoráveis a fontes de energia renovável, mas não à conta da destruição dos ecossistemas". "O que se passa em Portugal é que vamos cumprir metas, mas com custos ambientais elevados", considera Pimenta de Castro, para quem "não há, da parte do Governo, critérios definidos, apesar das metas de 2030".

Relacionados

Sem comentários: