Hoje quero falar do luto e homenagear os mortos pelo maldito vírus Covid-19. Por experiência própria, já tenho muitos lutos, uns mais bem resolvidos que outros (perdi o meu pai aos 11 anos, a minha irmã mais velha aos 22, o meu irmão mais velho aos 43, a minha mãe aos 45, a minha esposa aos 49 e este ano, o meu irmão mais novo). Também já perdi alguns amigos da adolescência e só tenho a minha irmã mais nova viva. Sobreviveu a um cancro da mama. Escrevi este poema simples, dedicado às famílias enlutadas em Portugal por causa do covid-19.
A última mão que te acarinhou foi a do enfermeiro António
As regras impuseram duas separações
Alzira, a nossa avó, tinha partido com um sorriso,
Garantiu-nos António.
Dias antes de ires para os cuidados intensivos
Tinhas febre alta, diarreias, queixavas-te de dores fortes por todo o corpo
Das pernas, que não te aguentavas de pé
Mulher de traço magro e leve
Já tinhas 85 anos
Quem te via animada e doce
Mesmo com as rugas marcadas de alegria e de trabalho árduo
As pessoas erravam sempre na tua idade
Diziam que terias 70, outras 75
Fizemos o funeral a correr, pouca gente,
Como ditam as regras
Regressados a casa, foi um dia inteiro de lágrimas
Demoravam a secar
Fez-se silêncios e a dor continuava dentro de nós
De noite ao olharmos para o céu
Vimos uma estrela brilhar mais forte que todas
Eras tu Alzira
João Soares, 16/12/2020
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