sexta-feira, 20 de novembro de 2020

A ESQUECIDA PANDEMIA NUCLEAR


A absoluta contaminação mediática pelas informações (e desinformações) associadas à COVID-19, alimentando o clima de pânico entre as populações, tem ainda outro efeito perverso: omite às mesmas populações outras situações igualmente graves e que têm todo o direito a conhecer. Uma delas é a escandalosa decisão do governo do Japão e da empresa que gere a central nuclear de Fukuchima de lançar no mar mais de um milhão de toneladas de águas radioactivas originárias dos reactores fundidos na catástrofe de 2011. Águas que entrarão na cadeia alimentar de milhões e milhões de pessoas. Um acto criminoso que apenas engrossa essa pandemia esquecida: a de índole nuclear – civil e militar.

Não se trata de COVID, portanto a informação passou quase despercebida: o Japão vai descarregar no mar mais de um milhão de toneladas de água radioactiva proveniente da central nuclear de Fukuchima.
O catastrófico acidente de Fukuchima foi provocado pelo tsunami que atacou a costa nordeste do Japão em 11 de Março de 2011, submergindo a central e dando origem à fusão dos núcleos de três reactores nucleares. A central fora construída mesmo na orla costeira a apenas quatro metros acima do nível do mar, com diques de quebra-mar de cinco metros de altura numa zona sujeita a tsunamis com ondas de 10 a 15 metros de altura. Além disso, houve graves falhas do controlo das instalações por parte da Tepco, a empresa privada gestora da central: no momento do terramoto os dispositivos de segurança não entraram em funcionamento. Para arrefecer o combustível fundido foi bombada água durante vários anos através dos reactores.
Essas águas, tornadas radioactivas, foram armazenadas no interior da central em mais de mil grandes reservatórios, que acumularam 1,23 milhões de toneladas. A Tepco está em vias de construir outros reservatórios que também eles estarão cheios em meados de 2022. Uma vez que tem de continuar a bombar água nos reactores fundidos, a Tepco, em acordo com o governo de Tóquio, decidiu descarregar no mar as águas acumuladas até agora, depois de as ter filtrado para as tornar menos radioactivas (não se sabendo em que medida) através de um processo que se prolongará por 30 anos.
Existem, além disso, lamas radioactivas acumuladas nos filtros do local de descontaminação, armazenadas em milhares de contentores, e enormes quantidades de terra e de outros materiais radioactivos.
Como a própria Tepco admitiu, uma situação particularmente grave é a fusão que aconteceu no reactor 3 carregado com mox, uma mistura de óxidos de urânio e plutónio, bastante mais instável e radioactiva. O mox utilizado neste reactor e em outros no país é produzido em França a partir de detritos nucleares enviados pelo Japão.

A praga nuclear universal
A organização Greenpeace denunciou os perigos resultantes do transporte deste combustível com plutónio através de dezenas de milhares de quilómetros. Alertou ainda para o facto de o mox favorecer a proliferação de armas nucleares porque permite uma extracção mais fácil de plutónio e, no ciclo de exploração de urânio, não existe uma clara linha de demarcação entre a utilização civil e a utilização militar desta matéria físsil.
Até ao momento foram acumuladas (segundo estimativas de 2015) cerca de 240 toneladas de plutónio para utilização militar directa e 2400 toneladas para utilização civil, com as quais, contudo, é possível produzir armas nucleares, que se somam a cerca de 1400 toneladas de urânio enriquecido para fins militares.
Algumas centenas de quilos de plutónio seriam suficientes para provocar cancro nos pulmões aos 7700 milhões de habitantes do planeta, e o plutónio continua letal durante um período de tempo correspondente a quase dez mil gerações humanas.
Foi acumulado, portanto, um potencial destruidor capaz, pela primeira vez na história, de fazer desaparecer a espécie humana da face da Terra.
Os bombardeamentos de Hiroxima e Nagasaki; as mais de duas mil explosões nucleares experimentais na atmosfera, no mar e em terra; o fabrico de ogivas nucleares com uma potência equivalente a mais de um milhão de bombas de Hiroxima; os numerosos acidentes com armas nucleares e os que acontecem em locais nucleares civis e militares, tudo isto provocou uma contaminação radioactiva que atingiu centenas de milhões de pessoas.
Uma parte das cerca de 10 milhões anuais de mortes por cancro no mundo – documentadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) – pode ser atribuída aos efeitos a longo prazo das radiações. Em dez meses, sempre segundo dados da OMS, a COVID-19 provocou no mundo cerca de 1,2 milhões de mortes. Um perigo que não pode ser subavaliado mas que não justifica o facto de os meios de comunicação de massas, designadamente as televisões, não terem informado que mais de um milhão de toneladas de água radioactiva serão descarregadas no mar a partir da central nuclear de Fukuchima, tendo como resultado o facto de, entrando na cadeia alimentar, fazer aumentar posteriormente as mortes por cancro.

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