Na madrugada de domingo, os relógios europeus vão recuar uma hora e dar entrada no horário de inverno.
Esta convenção, que é seguida em Portugal há cerca de um século, tem sido questionada nos últimos anos. Na UE, está inclusivamente em curso uma proposta para que deixe de ser seguida. Sem decisão à vista, adiada pelas contingências dos últimos anos, permanece a tradição.
Um impasse sem fim à vista
Na Europa, a discussão remonta a 2018. Na altura, a Comissão Europeia publicou um estudo de opinião segundo o qual 84% dos europeus são a favor de acabar com as mudanças de horário duas vezes por ano.
Em 2019, o Parlamento Europeu votou favoravelmente para que esta medida avançasse. Tudo indicava que o fim estava iminente, dependendo apenas da negociação do Conselho Europeu. A previsão era a de que os relógios seriam mexidos pela última vez em 2021, mas isso não aconteceu.
O Conselho Europeu considerou que a medida carecia de uma avaliação de impacto e remeteu o tema para a Comissão Europeia. Começa aqui o impasse que se prolonga até hoje. No site oficial do Parlamento Europeu, a medida está “à espera da posição do Conselho em primeira leitura” e tudo indica que as negociações ainda não começaram.
Pelo caminho surgiram outros temas mais prementes que têm concentrado os esforços europeus, desde o Brexit, à pandemia e mais recentemente à guerra. Entretanto, e com eleições europeias pelo meio, a proposta poderá já não reunir o consenso necessário, não sendo claro quando o tema voltará à agenda do Conselho.
Uma solução para todos será muito difícil de encontrar
Fora o processo legislativo, os contornos práticos desta medida iriam necessitar de uma cuidadosa negociação.
Implementar uma medida única seria difícil, uma vez que tal implicaria mais horas de sol para uns e menos para outros. Por outro lado, permitir a cada país escolher o seu próprio horário (sem um alinhamento de acordo com a geografia ou atuais zonas temporais) teria o potencial de gerar um enorme caos. De uma Europa com três fusos horários, poderíamos potencialmente passar a ter uma panóplia de horários nacionais.
Mesmo a coordenação dos horários com os países vizinhos pode ser problemática. Por exemplo, com a saída do Reino Unido da UE, uma medida destas pode implicar ter horários diferentes na República da Irlanda e na Irlanda do Norte.
Depois, há ainda países, como são os casos de Portugal e Grécia, que pretendem manter a mudança de horário duas vezes por ano por considerarem que adotar permanentemente ou o horário de verão ou o de inverno não traria benefícios.
Mas de onde veio então a mudança de horário?
As primeiras experiências locais em que a mudança de hora foi convencionada remontam ao século XVIII, mas a primeira alteração horária oficial aconteceu já no século XX. Em 1916, devido ao esforço de guerra, o Império Alemão mudou a hora de forma a ajustar o horário de trabalho às horas de sol e assim poupar carvão. A medida foi seguida por outros países europeus, incluindo Portugal.
Ao longo do século, a opção por este horário foi variando ao longo do tempo e entre países.
Atualmente, todos os países europeus (exceto a Islândia) seguem o decreto da UE de 2000 que sincronizou as mudanças no horário europeu, de forma a garantir a coerência dentro do mercado único. Assim, ficou definido que as mudanças acontecem no último domingo de outubro (menos uma hora) e no último domingo de março (mais uma hora).
A Europa está, contudo, do lado da minoria que ainda mantém as mudanças entre horário de verão e inverno. Segundo a Statistica, em 2021 apenas 40% faziam a alteração. Mas nem sempre foi assim, uma vez que mais de 140 países já chegaram a ter horários sazonais em algum momento da sua história.
Além da Europa, mantêm o horário de inverno os EUA (com a exceção dos estados do Arizona e Havai). Isto poderá mudar em breve. Num consenso pouco habitual, o Congresso norte-americano aprovou a 15 de março a Lei de Proteção Solar, que visa abolir a mudança de horário. O plano é o de os relógios dos EUA mudarem pela última vez no próximo ano, mas a medida tem ainda de passar na Câmara dos Representantes e ser promulgada pelo Presidente.
Porquê mudar agora?
O argumento original a favor do horário era a poupança de energia. Contudo, os estudos sobre o tema são inconclusivos ou dão conta de poupanças residuais. A energia que é poupada ao final do dia parece ser compensada pela gasta ao início da manhã, quando temos por exemplo de acender as luzes para nos prepararmos para sair de casa.
Atualmente, a defesa do horário de inverno prende-se, sobretudo, com a ideia de ter mais luz durante a manhã, sobretudo para as crianças nas escolas e agricultores nos campos.
Contudo, os argumentos pelo fim das mudanças de horário têm-se multiplicado. Ao longo dos anos surgiram vários estudos a associar o horário de inverno a vários efeitos nefastos, desde a diminuição da produtividade laboral ao aumento de ataques cardíacos, da criminalidade nas ruas e dos acidentes rodoviários.
Dependendo da latitude, a mudança de horário pode ditar que a noite chega a meio da tarde para muitas cidades e povoações na estação fria. Isto quando, do lado do comércio, anoitecer mais tarde tem sido associado a um maior consumo.
Nos últimos anos, a argumentação baseada na biologia humana tem também ganhado peso. Novas provas científicas surgiram que indicam que cerca de metade dos nossos genes são regulados por uma espécie de relógio biológico (ritmo circadiano, funções que o corpo repete em ciclos de cerca de 24h e que também são influenciadas por estímulos externos).
1 comentário:
Importa consultar:
https://oal.ul.pt/hora-legal/mudanca-da-hora/#seg
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