O secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou esta quarta-feira que o planeta se aproxima do "inferno climático", instando os líderes mundiais a tomar medidas nos próximos 18 meses para "criar pontos de viragem" e livrar as populações do desastre.
No Dia Mundial do Meio Ambiente, Guterres fez um discurso no Museu Americano de História Natural de Nova Iorque, e, num "momento de verdade", expôs os limites climáticos que o planeta já ultrapassou e o que as empresas e os países - especialmente o G7 e o G20 - precisam de fazer durante os próximos 18 meses para permitir um futuro habitável para a humanidade.
"Hoje é o Dia Mundial do Meio Ambiente. É também o dia em que o Serviço de Alterações Climáticas Copernicus da Comissão Europeia reporta oficialmente maio de 2024 como o mês mais quente de que há registo. Isto marca 12 meses consecutivos dos meses mais quentes de todos os tempos", disse.
"No ano passado, cada viragem do calendário aumentou a temperatura. O nosso planeta está a tentar dizer-nos algo. Mas parece que não estamos a ouvir", lamentou.
Aproveitando a localização do evento, Guterres fez uma comparação com o período em que um meteoro varreu os dinossauros do planeta, advogando que o mundo vive também agora um impacto "descomunal". Com uma diferença: "No caso do clima, nós não somos os dinossauros. Nós somos o meteoro", frisou. "Não estamos apenas em perigo. Nós somos o perigo. Mas também somos a solução", defendeu.
O ex-primeiro-ministro português alertou que, a este ritmo, todo o orçamento de carbono (o dióxido de carbono que pode ser emitido antes que o aquecimento global de 1,5°C seja inevitável) será destruído antes de 2030.
A Organização Meteorológica Mundial informou esta quarta-feira que há 80% de probabilidade de a temperatura média anual global exceder o limite de 1,5 graus em pelo menos um dos próximos cinco anos.
Em 2015, a probabilidade de tal acontecer "era próxima de zero", sublinhou o líder da ONU.
"Estamos a jogar à roleta russa com o nosso planeta. Precisamos de uma rampa de saída do inferno climático. E a verdade é que temos o controlo da roda. O limite de 1,5 graus ainda é possível", advogou Guterres, que tem na agenda climática uma das prioridades do seu mandato.
Explicando a importância em torno do limite de 1,5 graus, António Guterres indicou que o planeta é uma massa de sistemas complexos e conectados e que cada fração de grau de aquecimento global conta.
"A diferença entre 1,5 e dois graus pode ser a diferença entre a extinção e a sobrevivência de alguns pequenos Estados insulares e comunidades costeiras. (...) 1,5 graus não é uma meta. Não é um objetivo. É um limite físico", reforçou.
Num discurso duro em que usou uma dezena de vezes a palavra "verdade", o secretário-geral observou que a batalha pelo limite de 1,5 graus será vencida ou perdida na década de 2020, sob a vigilância dos líderes atuais.
Colocando a pressão sobre os líderes, Guterres sublinhou que "tudo dependerá das decisões que tomarem - ou deixarem de tomar - especialmente nos próximos dezoito meses".
Entre as medidas urgentes que devem ser tomadas no próximo ano e meio, o secretário-geral da ONU apontou a redução das emissões, a proteção das pessoas e da natureza dos extremos climáticos, o aumento do financiamento climático, e a repressão à indústria de combustíveis fósseis.
Na prática, Guterres instou, entre outros pontos, que o G7 e outros países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) se comprometem a acabar com o carvão até 2030 e criar sistemas de energia livres de combustíveis fósseis e reduzir a oferta e a procura de petróleo e gás em 60% até 2035.
Apelou também às instituições financeiras para que comecem a investir numa revolução global das energias renováveis e instou todos os países a proibirem a publicidade de empresas de combustíveis fósseis.
O líder das Nações Unidas criticou ainda o facto de os menos responsáveis pela crise climática serem os mais atingidos: "as pessoas mais pobres; os países mais vulneráveis; pessoas indígenas; mulheres e meninas".
Enquanto isso, "os padrinhos do caos climático - a indústria dos combustíveis fósseis - obtêm lucros recordes e celebram biliões em subsídios financiados pelos contribuintes", criticou.
"Nós temos uma escolha. Criar pontos de viragem para o progresso climático -- ou aproximar-se de pontos de viragem para desastres climáticos. Nenhum país pode resolver a crise climática isoladamente", dependeu.
Guterres aproveitou ainda para agradecer aos jovens, à sociedade civil, às cidades, às regiões, às empresas e a outros que têm liderado a luta por um mundo "mais seguro e mais limpo", afirmando que "estão do lado certo da história".
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