Muitas vezes, viajo pelo mundo a falar e as pessoas fazem-me perguntas acerca dos desafios, os meus momentos, alguns dos meus arrependimentos. 1998: Uma mãe solteira com quatro filhos, três meses após o nascimento do meu quarto filho, fui trabalhar como assistente de investigação. Fui para o norte da Libéria. E fazia parte do trabalho a aldeia dar-me alojamento. E fiquei numa casa com uma mãe solteira e a sua filha.
00:44
Essa rapariga era a única, em toda a aldeia, a ter conseguido estudar até ao 9º ano. Ela era motivo de piada pela comunidade. Muitas vezes as outras mulheres diziam à sua mãe "Tu e a tua filha vão morrer pobres". Depois de duas semanas a trabalhar nessa aldeia, chegou a altura de me ir embora. A mãe aproximou-se de mim, ajoelhou-se, e disse "Leymah, leve a minha filha. Eu queria que ela se tornasse numa enfermeira." Muito pobre, a viver em casa dos meus pais, não podia fazer nada. Com lágrimas nos olhos, disse "Não".
01:34
Dois meses mais tarde, fui para outra aldeia com a mesma tarefa e pediram-me que fosse viver com a chefe da aldeia. A mulher chefe da aldeia tinha uma criança pequena, a mesma cor de pele que eu, toda suja. E passava o dia inteiro só com roupa interior vestida. Quando perguntei quem era, disseram-me "Chama-se Wei. O seu nome significa porco. A sua mãe morreu ao dar à luz e ninguém sabe quem é o pai." Fez-me companhia durante duas semanas, dormia comigo. Comprei-lhe roupas usadas e comprei-lhe a sua primeira boneca. Na noite antes de partir, ela veio ter comigo e disse "Leymah, não me deixe aqui. Quero ir consigo. Quero ir para a escola". Muito pobre, sem dinheiro, a viver com os meus pais, voltei a dizer "Não". Dois meses depois, essas duas aldeias entraram novamente em guerra. Até hoje, não sei o que é feito dessas duas meninas.
02:47
Avançando até 2004: No auge do nosso activismo, o Ministro de Género da Libéria chamou-me e disse "Leymah, tenho uma criança de 9 anos para ti. Quero que a leves para casa, pois não temos casas seguras." A história desta criança: Tinha sido violada pelo avô paterno diariamente durante 6 meses. Estava inchada, muito pálida. Todas as noites eu chegava do trabalho e deitava-me no chão frio. Ela deitava-se ao meu lado e dizia "Tia, quero ficar bem. Quero ir para a escola."
03:27
2010: Uma jovem apresenta-se perante a presidente Sirleaf e dá o seu testemunho de como ela e os irmãos vivem todos juntos, os pais morreram durante a guerra. Ela tem 19 anos, o seu sonho é ir para a Universidade para poder sustentá-los. É bastante atlética. Ela candidata-se a uma bolsa de estudos. Bolsa completa. Ela consegue-a. O seu sonho de ir para a escola, o seu desejo de estudar finalmente concretiza-se. Vai para a escola no primeiro dia. O director de desporto, responsável pela sua vinda para o programa, chama-a à parte. E nos três anos que se seguem, o seu destino será ter relações sexuais com ele todos os dias, para pagar o favor de ter sido aceite naquela escola.
04:18
A nível mundial, temos políticas, instrumentos internacionais, líderes trabalhistas. Pessoas incríveis comprometeram-se em proteger as nossas crianças da necessidade e do medo. A ONU tem a Convenção dos Direitos das Crianças. Na América, têm a lei chamada "Nenhuma Criança Será Deixada para Trás". Outros países têm diferentes iniciativas. No Desenvolvimento do Milénio há o objectivo Três que se foca em mulheres jovens. Todas estas grandes iniciativas de pessoas extraordinárias que têm como objectivo levar os jovens até onde queremos que eles vão globalmente, na minha opinião, falharam.
04:59
Na Libéria, por exemplo, a taxa de gravidez na adolescência é de 3 em cada 10 jovens. A prostituição entre adolescentes é a mais alta de sempre. Numa comunidade, dizem, acorda-se de manhã e vê-se preservativos usados como se fossem papéis de pastilha elástica usada. Raparigas de 12 anos a prostituirem-se por menos de um dólar por noite. É desolador, é triste. E alguém me perguntou, pouco antes do meu TEDTalk, há uns dias atrás, "Então, onde está a esperança?".
05:35
Há muitos anos, alguns amigos meus decidiram que era preciso fazer a ligação entre a nossa geração e a geração de mulheres jovens. Não é suficiente dizer que existem duas mulheres liberianas premiadas com o Nobel quando os filhos das nossas jovens estão por aí, sem esperança ou aparentemente sem ela. Criámos um espaço chamado "Young Girls Transformative Project" (Projecto de Transformação de Jovens Mulheres). Dirigimo-nos às comunidades rurais e aquilo que fazemos, assim como nesta sala, é criar o espaço. Quando estas jovens se sentam, libertamos a inteligência, libertamos a paixão, libertamos o compromisso, libertamos objectivos, libertamos grandes líderes. Até hoje, trabalhámos com mais de 300. E algumas dessas jovens, que entram na sala muito tímidas, foram corajosas, enquanto mães jovens, ao manifestarem-se e ao defenderem os direitos de outras mulheres jovens.
06:39
Conheci uma jovem, mãe adolescente com quatro filhos, que nunca pensou em acabar o liceu, formou-se com sucesso; que nunca pensou em ir para a Universidade, matriculou-se numa. Um dia ela disse-me, "O meu desejo é terminar a Universidade e ser capaz de sustentar os meus filhos." Encontra-se numa situação em que não consegue arranjar dinheiro para estudar. Vende água, vende refrigerantes e vende cartões recarregáveis para telemóveis. E podemos pensar que ela iria pegar nesse dinheiro e investir na sua educação. O seu nome é Juanita. Ela pega nesse dinheiro e procura mães solteiras na sua comunidade para que voltem a estudar. Ela diz "Leymah, eu queria estudar. Mas se eu não posso fazê-lo, ao ver algumas das minhas irmãs estudarem, o meu sonho concretiza-se. Quero uma vida melhor. Quero ter comida para os meus filhos. Quero que o abuso sexual e a exploração nas escolas acabe." Este é o sonho da jovem africana.
07:45
Há muitos anos, havia uma rapariga africana. Essa rapariga tinha um filho que queria um donut, porque estava faminto. Zangada, frustrada e muito chateada pelo estado da sua sociedade e o estado dos seus filhos, esta jovem iniciou um movimento, um movimento de mulheres comuns unidas para construir a paz. Eu irei realizar esse desejo. Este é o desejo de outra rapariga africana. Eu não realizei o desejo daquelas duas raparigas. Falhei em fazer isso. Era isto que passava pela cabeça de outra jovem mulher: falhei, falhei, falhei. Então farei isto. As mulheres manifestaram-se, protestaram contra um ditator brutal, falaram sem medo. Não só realizaram o desejo de um donut, como também o de alcançar a paz. Esta jovem mulher também queria estudar. Foi para a escola. Esta jovem mulher tinha outros desejos, que se concretizaram.
08:57
Hoje, essa jovem mulher sou eu, premiada com um Nobel. Embarquei numa viagem para realizar o desejo, com as minhas limitadas capacidades, das meninas africanas o desejo de estudarem. Criámos uma organização. Concedemos bolsas completas de quatro anos a meninas provenientes de aldeias, nas quais vemos potencial.
09:20
Não tenho muito para vos pedir. já estive em alguns lugares aqui nos E.U.A, e sei que as raparigas aqui também têm desejos, querem uma vida melhor algures no Bronx, querem uma vida melhor algures na baixa de L.A., querem uma vida melhor algures no Texas, querem uma vida melhor algures em Nova Iorque, querem uma vida melhor algures em Nova Jérsia.
09:46
Querem embarcar comigo nesta viagem para ajudar aquela rapariga, seja africana, americana, ou japonesa, a concretizar o seu desejo, o seu sonho, a alcançar esse sonho? Porque todos os grandes inovadores e inventores com quem falámos e que vimos, nos últimos dias, estão também sentados em cantos minúsculos, em diferentes partes do mundo, e tudo o que nos pedem é que criemos esse espaço para libertar a inteligência, libertar a paixão, libertar todas as grandezas que guardam dentro de si. Vamos embarcar nesta viagem juntos. Vamos embarcar nesta viagem juntos.
10:32
Obrigado.
10:34
(Aplausos)
10:57
Chris Anderson: Muito obrigado. Actualmente na Libéria, qual é a questão que mais a preocupa?
11:06
LG: Pediram-me para liderar a "Iniciativa de Reconciliação da Libéria". Como parte da minha função, faço estas viagens em diferentes aldeias e cidades, 13 a 15 horas em estradas de terra, e não houve nenhuma comunidade em que não houvesse raparigas inteligentes. Mas infelizmente, a visão de um grande futuro ou o sonho de um grande futuro, é somente um sonho, porque existem todos estes vícios. A gravidez na adolescência, que como eu disse, é epidémica.
11:43
Por isso, o que me preocupa é ter estado nesse lugar e, de certo modo, estou neste lugar, e não quero ser a única a estar neste lugar. Procuro formas de ter outras jovens comigo. Daqui a 20 anos quero olhar para trás e ver que há outra jovem liberiana, do Gana, da Nigéria, da Etiópia, aqui neste palco TED. E talvez, somente talvez, a dizer "Por causa da Leymah estou aqui hoje". Por isso fico preocupada quando vejo que não têm esperança. Mas também não sou pessimista, porque sei que não é preciso muito para as motivar.
12:29
CA: E durante o ano passado, conte-nos algo promissor que tenha presenciado.
12:35
LG: Posso contar-lhe muitas coisas promissoras. Mas no ano passado, na aldeia onde a presidente Sirleaf nasceu, trabalhámos com algumas raparigas. E não encontrámos 25 raparigas que frequentassem o liceu. Todas elas trabalhavam na mina de ouro e a maior parte eram prostitutas que faziam outras coisas. Pegámos em 50 dessas raparigas e trabalhámos em conjunto com elas. E isto foi no início da campanha eleitoral. É um local onde as mulheres, mesmo as mais velhas, nunca se sentavam no mesmo círculo que os homens. Mas estas jovens juntaram-se, formaram um grupo e lançaram uma campanha de registo eleitoral. É uma vila mesmo rural. E o lema que usaram foi: "Até as raparigas bonitas votam". Conseguiram mobilizar as mulheres jovens.
13:24
Mas não só, foram até aos candidatos e perguntaram-lhes "O que é que vão dar às raparigas desta comunidade se ganharem?". E um deles, já eleito, porque a Libéria tem uma das mais pesadas leis sobre a violação e ele era um dos que realmente lutava por isso no parlamento, para mudar essa lei, por considerar bárbaro. Ele dizia que a violação não era bárbara, mas sim a lei. E quando as raparigas começaram a questioná-lo, ele foi bastante hostil para com elas. Elas viraram-se para ele e disseram "Vamos fazer com que não seja reeleito". E ele não foi reeleito.
14:03
(Aplausos)
14:09
CA: Leymah, obrigado. Muito obrigado por ter vindo ao TED.
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