sexta-feira, 31 de outubro de 2025

Novo livro de Nancy Fraser denuncia o capitalismo que devora as condições que o sustentam


A filósofa norte-americana Nancy Fraser defende que o capitalismo contemporâneo está a “devorar as próprias condições que o sustentam” e propõe repensar as bases do sistema, no livro intitulado “Capitalismo Canibal”, que chega este mês às livrarias portuguesas.

Com o subtítulo “O capitalismo está a devorar a democracia, os cuidados sociais e o planeta”, o ensaio de Nancy Fraser, publicado originalmente em 2022 e editado agora pela Antígona, alerta para a forma como o capitalismo atual, que descreve como “omnívoro e alarve”, é capaz de canibalizar todas as esferas da vida.

Segundo a autora, trata-se de um sistema que devora as bases que o sustentam, desde a natureza às instituições democráticas, passando pelo que chama de “reprodução social”, ou seja a sustentação material, emocional e relacional da vida humana.

Essa dinâmica manifesta-se na exploração intensiva dos recursos naturais, nas desigualdades de classe e etnia, na precarização do trabalho e no esvaziamento das práticas políticas, como se lê num excerto da obra.

Nancy Fraser defende que as múltiplas crises contemporâneas, sejam económicas, sociais, ambientais ou democráticas, têm como origem comum o apetite insaciável de um modelo económico que consome as próprias condições que o tornam possível.

No livro, a autora parte de uma releitura crítica de Marx para propor uma conceção alargada de capitalismo, que ultrapassa o domínio estritamente económico.

No primeiro capítulo da obra – “Omnívoro: Porque Precisamos de Alargar a Nossa Concepção do Capitalismo” -, sustenta que o sistema não se limita à exploração do trabalho assalariado, apoiando-se também em “fenómenos ‘não-económicos’ como o aquecimento global, o ‘défice das prestações de cuidados’ e o esvaziamento a todos os níveis do poder público”, que são simultaneamente indispensáveis e sistematicamente degradados.

“O capital expande‑se apropriando-se do excedente do tempo de trabalho dos assalariados explorados e igualmente expropriando a riqueza não-capitalizada e subcapitalizada dos prestadores de cuidados, das populações racializadas e da natureza. Por outras palavras, não se expande por si mesmo, mas canibalizando-nos”, apropriando-se do excedente humano e natural, sem reabastecer o que destrói, escreve Nancy Fraser no livro.

Numa entrevista dada em 2022 à revista The New Republic, a filósofa explicou que a metáfora do canibalismo procura inverter o uso colonial e racista original do termo: “Quem se dedica a acumular capital é que é o verdadeiro canibal”.

E acrescenta que o capitalismo destrói as próprias infraestruturas que o sustentam, entre as quais os sistemas políticos, jurídicos e sociais que garantem o funcionamento económico.

Nancy Fraser identifica uma crise global da reprodução social, resultante do neoliberalismo e do “capitalismo financeirizado”, de que são exemplo as mulheres, incluindo com filhos pequenos, que nas últimas décadas foram massivamente integradas na força de trabalho, enquanto os Estados reduziram os apoios públicos, criando uma “tempestade perfeita” de sobrecarga e falta de tempo.

Simultaneamente, o endividamento crescente – por via de hipotecas, cartões de crédito e empréstimos – desvia o rendimento familiar, “que poderia ser dedicado à construção de uma espécie de infraestrutura de cuidado”, para os bancos e para a ‘indústria de crédito’, numa nova forma de expropriação.

Na mesma entrevista, a autora alerta também para uma crise de “hegemonia”, conceito herdado de Antonio Gramsci, segundo o qual uma classe dominante mantém o seu poder não apenas pela força, mas também pelo consentimento.

Esta crise manifesta-se em dissidências e numa polarização, decorrente do “surgimento de narrativas concorrentes, que lutam entre si pelo que será a nova hegemonia”, que “substituirá o senso comum neoliberal de que tudo o que precisamos são mercados mais livres e uma menor interferência do Estado”.

Para a filósofa, a perda de confiança nas instituições e nas elites políticas está a abrir espaço tanto a movimentos emancipatórios, como o socialismo democrático e novas plataformas mediáticas de esquerda, como a forças reacionárias, incluindo o ‘trumpismo’, os movimentos antivacina e os discursos xenófobos.

A dimensão ecológica ocupa igualmente um lugar central na análise de Nancy Fraser, segundo a qual “o capitalismo separou brutalmente os seres humanos dos ritmos naturais e sazonais”, transformando a agricultura e a indústria em sistemas subordinados ao lucro e sustentados por combustíveis fósseis e fertilizantes químicos, descreve a sinopse do livro.

Ao mesmo tempo, o neoliberalismo promete fazer desaparecer a fronteira entre o humano e a natureza, com técnicas reprodutivas e tecnologias ciborgue, que em vez de reconciliar, intensificam a canibalização da natureza pelo capital.

Na entrevista à Common Wealth , a autora reconhece que o sistema capitalista demonstrou grande capacidade de reinvenção, mas considera que a mudança climática representa “um limite objetivo”, podendo tornar “a vida literalmente impossível para um número cada vez maior de populações”.

A filósofa defende a necessidade de imaginar novos sistemas para substituir o modelo atual, reduzindo as emissões, evitando que os custos recaiam sobre as populações mais vulneráveis e reconstruindo as bases da democracia e do cuidado.

Nancy Fraser desafia leitores e decisores a repensarem as estruturas fundamentais da vida social e económica antes que o sistema consuma tudo o que o sustenta.

As pressões militares ocultas por trás do novo impulso para pequenos reactores nucleares



A recente visita de Donald Trump ao Reino Unido resultou numa chamada «parceria histórica» em matéria de energia nuclear. Londres e Washington anunciaram planos para construir 20 pequenos reatores modulares e também desenvolver tecnologia de microrreatores – apesar do facto de ainda não terem sido construídas centrais deste tipo em nenhum lugar do mundo.

O primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, prometeu que estes planos irão proporcionar uma «era dourada» da energia nuclear, que também irá «reduzir as faturas» .

No entanto, a história da energia nuclear tem sido marcada por décadas de exageros, custos crescentes e atrasos constantes. Em todo o mundo, as tendências apontam na direção errada.

Então, porquê o entusiasmo renovado em relação à energia nuclear? As verdadeiras razões têm menos a ver com segurança energética ou alterações climáticas e muito mais com poder militar.

À primeira vista, o caso pode parecer óbvio. Os defensores da energia nuclear apresentam os pequenos reatores modulares, ou SMRs, como vitais para reduzir as emissões e atender à crescente procura por eletricidade por parte dos automóveis e centros de dados. Com as grandes centrais nucleares agora proibitivamente caras, os reatores menores são apresentados como uma alternativa empolgante.

Mas hoje em dia, mesmo as análises mais optimistas do sector admitem que a energia nuclear — mesmo os SMRs — provavelmente não conseguirá competir com as energias renováveis. Uma análise publicada no New Civil Engineer no início de 2025 concluiu que os SMRs são “a fonte mais cara por quilowatt de eletricidade gerada quando comparados com o gás natural, a energia nuclear tradicional e as energias renováveis”.

Ghost Town - original The Specials e cover dos Lankum


A canção “Ghost Town” (1981), do grupo britânico The Specials, é um poderoso retrato social e político do Reino Unido no início dos anos 80. A música reflete o desemprego em massa, a violência urbana e o declínio das cidades industriais durante o governo de Margaret Thatcher. Com uma sonoridade sombria e lenta, “Ghost Town” evoca a imagem de ruas desertas, discotecas fechadas e juventude sem perspetivas — um grito de alerta sobre a desintegração social. Tornou-se um hino de protesto e símbolo do descontentamento social da época, combinando reggae e ska com crítica política.


“Ghost Town” é uma canção que denuncia o colapso social e ambiental das cidades britânicas dos anos 80, espelhando o impacto humano do desemprego e da desigualdade — um retrato musical da decadência urbana e da perda de comunidade.

quinta-feira, 30 de outubro de 2025

Explosions In The Sky - Postcard From 1952

‘Change course now’: humanity has missed 1.5ºC climate target, says UN head

Humanity has failed to limit global heating to 1.5º C and must change course immediately, the secretary general of the UN has warned.

In his only interview before next month’s Cop30 climate summit, António Guterres acknowledged it is now “inevitable” that humanity will overshoot the target in the Paris climate agreement, with “devastating consequences” for the world.

He urged the leaders who will gather in the Brazilian rainforest city of Belém to realise that the longer they delay cutting emissions, the greater the danger of passing catastrophic “tipping points” in the Amazon, the Arctic and the oceans.

“Let’s recognise our failure,” he told the Guardian and Amazon-based news organisation Sumaúma. “The truth is that we have failed to avoid an overshooting above 1.5ºC in the next few years. And that going above 1.5C has devastating consequences. Some of these devastating consequences are tipping points, be it in the Amazon, be it in Greenland, or western Antarctica or the coral reefs.

He said the priority at Cop30 was to shift direction: “It is absolutely indispensable to change course in order to make sure that the overshoot is as short as possible and as low in intensity as possible to avoid tipping points like the Amazon. We don’t want to see the Amazon as a savannah. But that is a real risk if we don’t change course and if we don’t make a dramatic decrease of emissions as soon as possible.”

The planet’s past 10 years have been the hottest in recorded history. Despite growing scientific alarm at the speed of global temperature increases caused by the burning of fossil fuels – oil, coal and gas – the secretary general said government commitments have come up short.

Fewer than a third of the world’s nations (62 out of 197) have sent in their climate action plans, known as nationally determined contributions (NDCs) under the Paris agreement. The US under Donald Trump has abandoned the process. Europe has promised but so far failed to deliver. China, the world’s biggest emitter, has been accused of undercommitting.

António Guterres giving his speech at Cop29 in Baku, Azerbaijan, in November 2024. 

Guterres said the lack of NDC ambition means the Paris goal of 1.5ºC will be breached, at least temporarily: “From those [NDCs] received until now, there is an expectation of a reduction of emissions of 10%. We would need 60% [to stay within 1.5ºC]. So overshooting is now inevitable.”

He did not give up on the target though, and said it may still be possible to temporarily overshoot and then bring temperatures down in time to return to 1.5ºC by the end of the century, but this would require a change of direction at and beyond Cop30.

He called for governments to rebalance representation at Cops so that civil society groups, particularly from Indigenous communities, will have a greater presence and influence than people paid by corporations.

“We all know what the lobbyists want,” he said. “It’s to increase their profits, with the price being paid by humankind.”

He said a transition away from fossil fuels was a matter of economic self-interest, because it was clear that the era of fossil fuels was coming to an end: “We are seeing a renewables revolution and the transition will inevitably accelerate and there will be no way in which humankind will be able to use all the oil and gas already discovered,” he said.

Asked if he had raised this with the Brazilian president, Luiz Inácio Lula da Silva, whose government has just given the green light for oil exploration near the mouth of the Amazon, he said: “Not yet. I’ll take advantage of the Cop [to do this].

O que a Grokipedia diz sobre Sánchez ou Feijóo? As diferenças entre a nova enciclopédia de Elon Musk e a Wikipédia tradicional.




"Diga a verdade, toda a verdade e nada além da verdade." Sob esse lema, o bilionário Elon Musk anunciou o lançamento da Grokipedia , uma nova enciclopédia online gratuita com a qual espera desafiar a Wikipédia, que ele criticou em diversas ocasiões por ser, em sua opinião, excessivamente tendenciosa em relação à ideologia woke e aos princípios progressistas . Lançada esta semana com mais de 800 mil artigos (ainda muito longe dos mais de 7 milhões que a Wikipédia possui em inglês), a intenção de Musk é expandir seu acervo usando seu modelo de Inteligência Artificial (Grok) e, aos poucos, conquistar a adesão dos usuários.


Por ora, as diferenças e nuances ideológicas já são mais do que evidentes em alguns artigos, a começar por aquele que se refere ao próprio Musk. Segundo a Wikipédia, ele "apoia figuras, causas e partidos políticos de extrema-direita em todo o mundo", enquanto para a Grokipedia, ele "influenciou debates mais amplos sobre progresso tecnológico, declínio demográfico e vieses institucionais (...) em meio a críticas da mídia tradicional, que apresenta uma cobertura consistentemente de esquerda".

Essas inconsistências também são observadas em artigos que fazem referência a Donald Trump, Joe Biden e outras figuras públicas, como George Floyd , cuja morte nas mãos da polícia desencadeou uma onda de protestos antirracistas nos EUA . Sobre Floyd, a Wikipédia inicia seu artigo afirmando que ele "era um homem afro-americano que foi morto por um policial branco em Minneapolis" após ser preso "depois que um funcionário de uma loja suspeitou que Floyd estivesse usando uma nota falsa de 20 dólares". A introdução da Grokipedia é bem diferente: "Ele era um americano com uma longa ficha criminal que incluía condenações por roubo à mão armada, posse de drogas e furto no Texas, de 1997 a 2007".

Existem também diferenças nas definições do movimento feminista Me Too ou simplesmente na palavra "gênero" em referência ao sexo biológico de uma pessoa. De acordo com a Wikipédia, "gênero é o conjunto de aspectos sociais, psicológicos, culturais e comportamentais de ser homem (ou masculino), mulher (ou feminina) ou um terceiro gênero", e enfatiza que "embora o gênero frequentemente corresponda ao sexo biológico, uma pessoa transgênero pode se identificar com um gênero diferente do sexo que lhe foi atribuído ao nascer". A Grokipedia, por outro lado, afirma que "gênero se refere à classificação binária dos seres humanos como masculino ou feminino de acordo com seu sexo biológico, definido pelo tipo de gametas produzidos e pela anatomia reprodutiva associada". Afirma ainda que "evidências empíricas apoiam o sexo biológico como um binário estrito em humanos, com distúrbios do desenvolvimento sexual (condições intersexuais) afetando aproximadamente 0,018% dos nascimentos e representando anomalias de desenvolvimento, e não terceiros sexos viáveis".

Mas as diferenças entre a Grokipedia e a Wikipédia também são evidentes em artigos que se referem à Espanha , a começar pelo que menciona o primeiro-ministro, Pedro Sánchez. Aqui estão alguns exemplos (comparando a versão em inglês da Wikipédia, já que a Grokipedia está disponível apenas em inglês):

Pedro Sánchez
O artigo da Grokipedia enfatiza, em seus parágrafos iniciais, que sob sua liderança, a Espanha experimentou um "crescimento do PIB superior à média da zona do euro nos últimos anos", mas também cita sua "relutância em cumprir as metas de gastos com defesa da OTAN , o que diferencia a Espanha de seus aliados em termos de compromissos de segurança". Menciona ainda "as recentes investigações de corrupção envolvendo sua esposa" e que ele aceitou uma lei de anistia "para permanecer no poder".

A Wikipédia, por outro lado, não menciona as investigações judiciais sobre o círculo de Sánchez até depois dos primeiros 20 parágrafos e salienta que as acusações contra a sua esposa foram feitas pelos Manos Limpias, "um sindicato de extrema-direita".

Alberto Núñez Feijóo
No caso de Alberto Núñez Feijóo, a Wikipédia menciona, em seus parágrafos iniciais, a infame foto dele com o narcotraficante Marcial Dorado , "amplificada por adversários políticos durante a campanha de 2023", e indica posteriormente que o líder do PP "negou qualquer irregularidade, afirmando que os contatos foram casuais e anteriores à sua presidência, e que não havia acusações legais contra ele". A Wikipédia, que dedica cinco parágrafos a essa fotografia em sua versão em espanhol, mal a menciona em inglês, afirmando apenas que "em 2013, membros da oposição pediram sua renúncia após a publicação de fotografias de meados da década de 1990 nas quais ele aparecia com Marcial Dorado, que mais tarde foi condenado por narcotráfico".
Santiago Abascal

A Wikipédia o define como "um político espanhol que é presidente do Vox, um partido político de extrema-direita, desde 2014", enquanto a Grokipedia não menciona o Vox e afirma que ele o fundou "para defender a unidade constitucional espanhola, o controle rigoroso da imigração ilegal, a defesa das estruturas familiares tradicionais e o liberalismo econômico", além de mencionar que ele recebeu "duras críticas da grande mídia e de instituições de esquerda".

Arnaldo Otegi
"Na sua juventude, foi membro da ETA, uma organização armada separatista, e foi condenado. Participou ativamente nas negociações de paz malsucedidas em Loyola e Genebra em 2006, bem como nas negociações subsequentes que culminaram no cessar-fogo definitivo da ETA em 2011 e no seu desarmamento completo em 2017", afirma a Wikipédia no seu primeiro parágrafo. No entanto, as ligações do líder do EH Bildu à ETA são detalhadas muito mais extensivamente na Wikipédia: "Ele é um político separatista basco e antigo membro da ETA , o grupo armado nacionalista basco responsável por mais de 800 mortes na sua campanha pela independência de Espanha. Juntou-se à ETA na adolescência, durante a transição espanhola para a democracia na década de 1970, participou nas suas operações de comando e fugiu para França em 1977 para evitar a prisão, antes de ser encarcerado pelo seu envolvimento num rapto."

Franco
Ambas as enciclopédias online definem Franco como um ditador, embora a Grokipedia afirme que sua liderança "pôs fim à instabilidade política e à violência revolucionária da Segunda República Espanhola , que testemunhou greves generalizadas, incêndios de igrejas e assassinatos cometidos por milícias de esquerda".

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NDC 3.0: planos pouco ambiciosos e ausência de grandes emissores deixam o mundo longe da meta climática


Um novo relatório faz uma avaliação integral da terceira rodada de Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), que são fundamentais para a implementação do Acordo de Paris. Aqui, analisamos quatro dos eixos que serão discutidos na COP30.

“Dez anos após sua adoção, podemos afirmar, sem sombra de dúvida, que o Acordo de Paris está dando resultados reais. Mas ele precisa funcionar de forma muito mais rápida e justa, e essa aceleração deve começar imediatamente.” A declaração é de Simon Stiell, Secretário Executivo da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC, na sigla em inglês), após a apresentação, nesta terça-feira (28), do Synthesis Report, relatório sobre a nova rodada dos planos climáticos que os governos devem apresentar para avançar na implementação do Acordo de Paris.

Esses planos são conhecidos tecnicamente como Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs, na sigla em inglês). Neles, a cada cinco anos e de forma cada vez mais ambiciosa, os países devem compartilhar seus compromissos e ações de mitigação e adaptação. A soma de cada compromisso de redução de emissões deve contribuir para limitar o aquecimento global a menos de 1,5 °C, principal meta do acordo firmado em 2015.

O dia 10 de fevereiro de 2025 era a data final para os países apresentarem essa terceira edição das NDCs, mas poucos cumpriram o prazo. Em diversas ocasiões ao longo do ano, a ONU e a presidência brasileira da COP30 convocaram as Partes a fazer suas respectivas apresentações.

O relatório apresentado hoje pela Convenção inclui as 64 novas NDCs que 64 Partes apresentaram formalmente entre 1º de janeiro de 2024 e 30 de setembro de 2025. Estão incluídos os compromissos anunciados pela China e pela União Europeia na Assembleia Geral em Nova York, em setembro? Não na análise geral, porque foram apenas discursos anunciando metas que, naquele momento, não vieram acompanhados da publicação formal dos documentos de NDC completos e detalhados, mas foram incluídos em algumas estimativas específicas.

Também estamos cientes de que os dados contidos no relatório oferecem uma visão bastante limitada, uma vez que o total das NDCs que ele resume representa cerca de um terço das emissões globais.Simon Stiell, Secretário Executivo da UNFCCC

O que o relatório revela sobre esta terceira rodada de NDCs? A seguir, aprofundamos cinco das conclusões da análise que estão vinculadas aos principais temas a ser discutidos na COP30 em Belém.

1- Uma tendência à redução de emissões, ainda sem os maiores emissores
Todos os anos, a principal expectativa em relação ao relatório é qual será a soma total dos compromissos de redução de emissões dos países. Em outras palavras: o quanto estamos perto ou longe de limitar o aquecimento a menos de 1,5°C? Esta edição parte de uma realidade específica: os maiores países emissores ainda não apresentaram seus planos climáticos.

“Este relatório apresenta apenas uma visão parcial. Os principais emissores, como China, União Europeia e Índia, ainda não apresentaram formalmente suas NDCs atualizadas, enquanto vários países em desenvolvimento estão demonstrando como a ação climática pode ser integrada às oportunidades de desenvolvimento”, disse Kaysie Brown, diretora associada de Diplomacia Climática e Geopolítica da E3G.

As 64 NDCs analisadas só cobriram cerca de 30% do total das emissões globais em 2019. O cumprimento dos compromissos de mitigação permitiria uma redução de 17% nas emissões em relação aos níveis de 2019. “De acordo com suas NDCs, as partes estão reduzindo ainda mais as suas curvas de emissões, mas ainda a uma velocidade insuficiente”, afirma o relatório.

“Celebrar uma redução de 17% nas emissões até 2035, quando o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) nos diz que precisamos de 60%, é profundamente enganoso. É uma ilusão de avanço”, disse à InfoAmazonia Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa, e acrescentou: “Sim, há avanços na economia real. Mas não se vê um resultado correspondente na política. A pior coisa que pode acontecer agora é a negação na COP30. Os líderes devem transformar o mal-estar político em uma resposta coletiva em Belém.”

As ações com maior potencial para atingir esses objetivos seriam florestamento e reflorestamento, energia solar, eletrificação de veículos e redução de emissões da agricultura.

Em relação a um dos temas que já gera debates no período que antecede a COP30 – a transição que deixe para trás os combustíveis fósseis – quase metade das NDCs analisadas apresentou objetivos quantitativos para reduzir uma proporção de combustíveis fósseis em sua geração de eletricidade até 2030.

A esse respeito, Camila Mercure, coordenadora de Políticas Climáticas da Fundación Ambiente y Recursos Naturales, avalia: “No setor energético, e de acordo com o apelo do Balanço Mundial a uma transição que abandone os combustíveis fósseis, é essencial que as NDCs estabeleçam roteiros claros e progressivos para descarbonizar as matrizes, garantindo que a transição busque a suficiência energética e o acesso universal, acessível e contínuo à energia para pessoas e territórios.”

2- Mais foco na adaptação
Setenta e três por cento das 64 NDCs apresentadas incluíram um componente de adaptação, ou seja, como se preparar melhor diante dos impactos atuais e futuros das mudanças climáticas.

As principais áreas em que esses países estão concentrando suas políticas de adaptação são segurança alimentar e nutrição, recursos hídricos, saúde, ecossistemas terrestres e setores econômicos estratégicos.

As secas apareceram como o fator climático de maior impacto sobre os países que apresentaram planos, com consequências sobre recursos hídricos, ecossistemas terrestres, pobreza e meios de subsistência. As inundações afetam principalmente áreas urbanas e rurais, transporte, infraestrutura e saúde. E o aumento do nível do mar ameaça áreas costeiras, ecossistemas oceânicos, património cultural e turismo.

Em comparação com os planos anteriores dessas 64 partes, observou-se um aumento no número de países que descreveram o estado de seus Planos Nacionais de Adaptação e identificaram sinergias e cobenefícios entre medidas de adaptação e mitigação.

Dos planos que incluíram políticas de adaptação, 94% se referiram a perdas e danos causados pelos impactos das mudanças climáticas. Isso demonstra um aumento no interesse pelo tema, em comparação com os 68% dos países analisados ​​que os haviam mencionado em planos anteriores.

O dado importante: os países apontaram a necessidade de financiamento e capacitação para lidar com perdas e danos. O Fundo de Perdas e Danos, estabelecido na COP27 em 2022, ainda está em fase de detalhamento para começar a funcionar, e ainda não tem recursos financeiros suficientes.

3- O financiamento necessário e transversal
Dos 64 novos planos apresentados, 56 apresentaram informações sobre financiamento. Mais especificamente, a maioria se referiu ao que é necessário para implementar suas políticas climáticas.

Os governos aguardam que Azerbaijão e Brasil, que ocuparam as presidências da COP29 e da COP30, divulguem o relatório do Roteiro de Baku a Belém, sobre como aumentar o financiamento de 300 biliões de dólares para 1,3 trilião. Enquanto isso, 33 partes divulgaram cifras orçamentárias concretas sobre o apoio de que necessitam: cerca de 1,97 bilhão de dólares, em conjunto.

Em que atividades esse dinheiro seria usado? Em políticas de redução de emissões nos setores de energia, agricultura e gestão de resíduos, e em políticas de adaptação em agricultura e segurança alimentar, recursos hídricos, saúde e água.

“A maioria dos países em desenvolvimento condicionou grande parte de suas NDCs ao acesso a financiamento internacional, transferência de tecnologia e apoio à capacitação, ressaltando que fechar a lacuna do financiamento climático é essencial para fechar a lacuna de ambição”, disse à InfoAmazonia Rebecca Thissen, coordenadora de global de incidência da Climate Action Network (CAN). E acrescentou: “Os países em desenvolvimento deixaram claro que sua ambição não é limitada pela visão, e sim pelos recursos.”

Além do valor em dinheiro em si, os países divulgaram desafios e limitações financeiras enfrentados na implementação de seus planos climáticos. Isso inclui acesso limitado e tardio ao financiamento devido a processos burocráticos longos e complexos, e dificuldades na mobilização de financiamento privado devido à baixa rentabilidade em setores vulneráveis, à percepção de altos riscos, ou mesmo ao escasso interesse dos investidores em medidas de adaptação.

“O relatório destaca que o apoio internacional previsível, acessível e ampliado não é esmola, e sim a condição para se implementar a ambição já incorporada às NDCs dos países em desenvolvimento. Isso deve ser acompanhado por uma reforma ambiciosa dos sistemas financeiros atuais, criando o espaço fiscal e político de que os países em desenvolvimento precisam para acelerar sua transição justa”, comenta Thissen.

Considerando que 69% do financiamento climático mobilizado em 2022 se deu na forma de empréstimos, não surpreende que uma barreira a mais seja o peso da dívida e as restrições fiscais geradas pelas modalidades de financiamento baseadas em mais endividamento em nome da ação climática. Esse foi um elemento qualitativo não resolvido pela nova meta de financiamento climático – a NCQG – decidida na COP29 anterior.

“As NDCs não são apenas compromissos climáticos, mas também o prospecto de investimento de um país, ou seja, o sinal mais claro para os mercados globais sobre onde se alinharão as políticas e oportunidades”, comentou María Mendiluce, diretora executiva da We Mean Business Coalition, e acrescentou: “Governos e empresas devem trabalhar juntos para criar as condições fiscais e financeiras que façam com que a energia renovável, a eficiência e a resiliência sejam os investimentos mais atrativos em todos os setores.”

4- Um interesse cada vez maior nos mercados de carbono
Na rodada anterior, 64% das Partes que apresentaram novas NDCs haviam manifestado interesse em participar dos mecanismos de mercado de carbono previstos no Artigo 6 do Acordo de Paris (que os regula), como forma de atingir seus objetivos climáticos. Agora, esse número subiu para 89%, incluindo países como Brasil e Indonésia, o que demonstra um crescimento considerável do interesse pelo tema.

O relatório também tem uma motivação a mais: finalizar os detalhes de implementação do Artigo 6 na COP29 abre caminho para que mais países comecem a pensar em seus marcos regulatórios, jurídicos e institucionais para se envolver nos mercados de carbono e se beneficiar deles. Na verdade, os que os países têm mais intenção ou possibilidades de usar são o Artigo 6.2, sobre o comércio de redução de emissões entre países, e o Artigo 6.4, que trata do novo mercado internacional de carbono, sobre os quais houve decisões em Baku.

Maximiliano Manzoni, diretor da Consenso e jornalista especializado em mercados de carbono, disse à InfoAmazonia que identifica diversos problemas com a intenção de muitos países desenvolvidos de cumprir seus compromissos climáticos usando os mercados de carbono de acordo com o Artigo 6.

“Um problema essencial é que os países do Sul Global acabarão subsidiando, com suas florestas, os custos de mitigação dos países do Norte Global, transferindo esse carbono, ao mesmo tempo em que os do Norte podem alegar estar apoiando com financiamento climático”, diz Manzoni.

E mais: “Outro problema é que, sem normas firmes, essas transferências de carbono capturado pelos países do Sul Global para as NDCs do Norte aumentarão os custos de mitigação dos países em desenvolvimento e, em casos mais extremos, os colocarão na difícil situação de aceitar acordos desiguais como única forma de ter acesso a dinheiro para suas próprias necessidades de mitigação e adaptação.”

Lisa O'Neill - The Wind Doesn't Blow This Far Right


[Verse 1]
I've lately been thinking of an old friend
Who I haven't seen in a while
Last night I dreamed that the same friend
Passed without sayin' goodbye

[Verse 2]
Oh, to be wild like the roses
Oh, to be red with delight
My blood is red out of fury
The wind doesn't blow this far right

[Verse 3]
Some terrors are born out of nature
Some terrors are born overnight
Some terrors are born out of leaders
With their eye on a different prize

[Verse 4]
The thing is, some leaders are players
And players sometimes can be clowns
And clowns then sometimes can be dangerous
When they're there and yet they can't be found

[Verse 5]
The Big Mac, the big man, the big bomb
The power of money and lies
The power of fear in the people
The wind doesn't blow this far right

“The Wind Doesn’t Blow This Far Right”, de Lisa O’Neill, é uma canção profundamente simbólica e crítica, que aborda a indiferença, o isolamento e a desconexão humana perante o sofrimento e as injustiças do mundo.

O título — “O vento não sopra tão à direita” — sugere uma metáfora geográfica e política: há lugares (ou mentalidades) tão afastados da empatia e da consciência social que nem o vento — símbolo da mudança, da natureza ou da solidariedade — consegue lá chegar.

Na voz intensa e poética de O’Neill, a música denuncia a apatia de sociedades viradas “para o seu próprio lado”, insensíveis ao que acontece fora da sua bolha de conforto. A canção mistura dor, ironia e compaixão, evocando o poder da natureza e da humanidade esquecida.

Para o mim, esta canção pode ser lida como um apelo ecológico e ético: lembra-nos que a crise ambiental e social nasce da mesma raiz — a separação do humano em relação ao mundo natural e ao outro. O vento, que deveria unir e renovar, já não sopra onde reinam o egoísmo e a rigidez ideológica.

A leitura ecológica de “The Wind Doesn’t Blow This Far Right” permite reconhecer a ligação entre alienação social e degradação ambiental. A canção evidencia como a perda de empatia — tanto entre pessoas como entre humanos e natureza — conduz à estagnação ética e ecológica. Quando o “vento” da mudança deixa de soprar, o desequilíbrio instala-se: as comunidades tornam-se insensíveis ao sofrimento e às crises ambientais que as rodeiam. Lisa O’Neill, através da sua voz crua e simbólica, lembra que a reconstrução da harmonia exige reconectar o sentir humano à consciência planetária.


quarta-feira, 29 de outubro de 2025

Principais Críticas ao Mercado Voluntário de Carbono


Avançou no Público, que o Mercado Voluntário de Carbono português passará a estar, finalmente, operacional a partir desta sexta-feira, com a publicação da primeira metodologia nacional entretanto aprovada pela Agência para o Clima (ApC).

Porém há muitas críticas
  1. Adicionalidade duvidosa

  2. Medição, Monitorização e Permanência

    • Medir de forma confiável a redução ou remoção de carbono (especialmente em projetos florestais) é complexo: é necessário estimar cenários futuros (“o que teria acontecido sem o projeto”), considerar vazamentos (emissões que migram para outros lugares) e riscos como incêndios, degradação ou reversão. 

    • A permanência também é um problema: por exemplo, florestas usadas para créditos podem ser cortadas ou queimar no futuro, liberando o carbono “sequestrado”. 

  3. Transparência e Governança Fraca

    • Falta de transparência nos preços: muitas revendedoras (“resellers”) não divulgam suas margens nem quanto do valor dos créditos vai para os projetos e comunidades locais.

    • Ausência de regulação forte: como é um mercado voluntário, não há um regulador central forte (ou padronização global), o que permite práticas divergentes entre diferentes certificadoras e projetos. 

    • Problemas de dupla contagem (“double counting”): em alguns casos, o mesmo crédito pode ser reivindicado por mais de uma parte, o que enfraquece a confiança no impacto real.

  4. Risco de “Greenwashing”

    • Empresas podem usar créditos para aparentar ação climática (“net zero”) sem fazer reduções reais — simplesmente comprando créditos para compensar emissões, em vez de reduzir suas próprias emissões. 

    • Há casos em que empresas fazem alegações vagas (“carbon neutral”, “Paris aligned”) que são difíceis de verificar e podem enganar consumidores. 

  5. Qualidade dos Créditos

    • Alguns créditos são de baixa qualidade ou inflacionados: por exemplo, projetos de fogões limpos (“cookstove”) foram recentemente criticados por superestimar seus benefícios climáticos por um fator muito alto. 

    • Segundo a Integrity Council for the Voluntary Carbon Market (ICVCM), uma parte significativa de metodologias (por exemplo, de energia renovável) não atende critérios recentes de integridade (“Core Carbon Principles”), especialmente no que toca à additionalidade. 

  6. Volatilidade de Mercado e Risco Financeiro

    • Os preços dos créditos podem ser altamente voláteis, o que dificulta o planeamento para compradores e desenvolvedores de projetos. 

    • A liquidez pode ser limitada, porque o mercado é fragmentado (muitos padrões, muitos tipos de crédito, muitos intermediários). 

  7. Impactos Sociais e Ambientais Não Intencionais

    • Alguns projetos podem ter consequências negativas para comunidades locais: por exemplo, projetos florestais podem deslocar populações ou gerar conflitos de uso da terra. 

    • A equivalência entre carbono biológico (florestas) e carbono fóssil nem sempre é realista: créditos baseados em florestas (ciclo rápido de carbono) podem não compensar totalmente as emissões fósseis (ciclo lento), especialmente se haver risco de reversão. 

  8. Incentivos Pervertidos

    • perverse incentives: quanto mais emissões, mais procura por créditos, mais lucro para quem vende créditos. Isso pode levar a uma lógica onde emissores grandes preferem continuar poluindo e “compensar”, em vez de reduzir. 

    • Também há críticas de que a existência de um mercado voluntário pode desviar o foco de políticas mais rígidas de regulação (por exemplo, impostos sobre o carbono, metas de redução obrigatórias). 

  9. Credibilidade e Reputação

Conclusão Crítica

  • Não é tudo “golpe”, mas há riscos reais: muitos críticos não rejeitam totalmente o VCM, mas pedem reformas — mais transparência, padrões mais rigorosos, verificação independente, regulação.

  • Complemento, não substituto: para muitos analistas, os créditos voluntários devem ser usados além das reduções diretas, não como a única estratégia.

  • Governança é chave: com a criação de órgãos como o ICVCM (Integrity Council), há movimento para tornar o mercado mais confiável, mas ainda há muito trabalho.

Novo estudo da OXFAM mostra que os 0,1% mais ricos dos EUA queimam carbono a uma taxa 4.000 vezes superior à dos 10% mais pobres do mundo


Segundo uma análise fornecida ao The Guardian, os super-ricos dos EUA estão a consumir carbono a uma velocidade 4.000 vezes superior aos 10% mais pobres da população mundial.

Estes multimilionários e multimilionários, que representam os 0,1% mais ricos da população dos EUA, estão também a reduzir o espaço climático seguro do nosso planeta a um ritmo 183 vezes superior à média global.

Os dados, produzidos pela Oxfam e pelo Instituto Ambiental de Estocolmo antes da cimeira climática COP30, destacam o fosso entre os ricos , grandes consumidores de carbono e principais responsáveis ​​pela crise climática, e os pobres, vulneráveis ​​ao calor, que sofrem as piores consequências. A China ocupa o 2º lugar.

Numa das extremidades da pirâmide social, os 0,1% mais ricos emitem, em média, 2,2 toneladas de CO2 por dia, o equivalente ao peso de um rinoceronte ou de um SUV.

Por outro lado, um cidadão da Somália emite apenas 82 gramas de CO2 por dia, o que equivale pouco à massa de um único tomate ou de meia chávena de arroz.

Entre estes dois extremos, a média para todos no planeta é de 12 kg por dia, aproximadamente o peso de um pneu de automóvel normal.

A análise foi fornecida para o lançamento do relatório anual da Oxfam sobre a desigualdade de carbono, que destaca como os estilos de vida luxuosos de superiates, jatos privados e grandes mansões se combinam frequentemente com investimentos em indústrias poluentes para criar pegadas individuais que desestabilizam o clima.

O estudo, divulgado na quarta-feira, descobriu que 308 dos multimilionários do mundo tinham uma contagem combinada de CO 2 que, se fossem um país, os tornaria o 15º país mais poluente do mundo.

A grande disparidade de carbono aumentou nos últimos 30 anos. Desde 1990, a quota das emissões dos 0,1% mais ricos aumentou 32%, enquanto a quota dos 50% mais pobres desceu 3%.

“A crise climática é uma crise de desigualdade”, afirmou Amitabh Behar, diretor executivo da Oxfam Internacional. “Os indivíduos mais ricos do mundo estão a financiar e a lucrar com a destruição climática, deixando a maioria global a suportar as consequências fatais do seu poder desenfreado.”

A desigualdade cria retroalimentações perigosas: quanto mais riqueza é acumulada nas mãos de poucos, mais a responsabilidade pela crise climática se concentra entre um pequeno número de indivíduos poderosos, que usam o seu dinheiro e influência para negar, atrasar e distrair das reduções de emissões.

O relatório apurou que quase 60% dos investimentos dos multimilionários são em “setores de alto impacto climático”, como empresas de mineração ou de petróleo e gás. Isto representa mais 11 pontos percentuais do que o investidor médio.

Um quadro semelhante foi pintado por um relatório separado, também divulgado na quinta-feira, pelo World Inequality Lab , que revelou que o 1% mais rico tem 2,8 vezes mais emissões associadas ao seu capital do que ao seu consumo.

Nos EUA, o relatório da Oxfam referiu que as empresas gastam, em média, 277 mil dólares por ano em lobby anti-clima, liderado pelas empresas de petróleo e gás natural. Na última Cimeira do Clima (COP) em Baku, havia 1.773 lobistas do sector do carvão, petróleo e gás, um contingente superior ao de todos os países, excepto três. O grupo afirmou que isto levou a um alívio das penalizações para os grandes emissores, ao retrocesso nos compromissos internacionais de transição para longe dos combustíveis fósseis e a contestações internas aos impostos sobre o carbono e à legislação destinada a reduzir as emissões. Mais preocupante ainda, segundo a Oxfam, é a tendência para os doadores ricos financiarem movimentos de extrema-direita e racistas, que estão na vanguarda da oposição às políticas de emissões líquidas zero.

As consequências são mortais. O relatório calcula que as emissões do 1% mais rico da população são suficientes para causar cerca de 1,3 milhões de mortes relacionadas com o calor até ao final do século, além de 44 biliões de dólares em prejuízos económicos para os países de baixo e médio-baixo rendimento até 2050. O sofrimento é desproporcionalmente maior no Sul Global, a região do mundo que menos culpa tem pelas alterações climáticas.

As emissões dos super-ricos estão também a afastar cada vez mais o mundo das metas do Acordo de Paris sobre o clima, que visa limitar o aumento da temperatura entre 1,5°C e 2°C acima dos níveis pré-industriais. Desde o acordo global de 2015, o 1% mais rico do mundo consumiu mais do dobro do orçamento de carbono restante em comparação com a metade mais pobre da humanidade combinada, afirma o relatório. A última década foi a mais quente de que há registo, elevando o aquecimento global acima da marca dos 1,5°C em 2024.

A Oxfam disse que os governos precisam de reduzir as emissões e a influência dos super-ricos com impostos sobre eles e indústrias que destabilizam o clima.

“Devemos quebrar o domínio dos super-ricos sobre a política climática, taxando a sua riqueza extrema, proibindo o seu lobby e, em vez disso, colocando os mais afectados pela crise climática no comando da tomada de decisões climáticas”, disse Behar.

The Awakening - Haunting


Something borrowed
Something lost
Something in this circle
Of salt and dust

The candles flicker
As the cards are dealt
A pale reflection
Of another lesser doubt

And I know
I'm holding on to something
I can never hold

So rise
As the shadows stain the wall
I hear you down the hall
I know this feeling
You’re haunting me
Again
Haunting

An old piano
And a little wine
I summon stories
As I rob the vine

Sleep is hiding
In the other room
My eyes are open
In the fading, splintered gloom
I know, I know
You'll be here soon

Oh rise
Like the ashes from your flame
Whispering my name
I love the feeling
Of you haunting me
Again
Haunting

So rise
As the shadows stain the wall
I hear you down the hall
I'm still dreaming
Of you haunting me
Again
Haunting me
Again
Haunting

A canção “Haunting”, da banda sul-africana The Awakening, mergulha no universo do gótico e do simbólico. A melodia e a letra conduzem-nos por um cenário de velas, ecos e recordações — onde o “assombro” não é terror, mas presença do passado.

Trata-se de uma metáfora emocional: as memórias, as perdas e os amores que continuam a habitar-nos, mesmo quando julgávamos tê-los deixado para trás. O narrador sente-se “assombrado” por alguém ou algo que regressa — e, paradoxalmente, acolhe essa presença com ternura.

No imaginário de The Awakening, o “haunting” é também um despertar interior: a consciência de que cada experiência, mesmo a mais dolorosa, deixa marcas que moldam o nosso ser. É um hino à beleza melancólica da impermanência — um eco entre o espiritual e o humano.

terça-feira, 28 de outubro de 2025

O carvalhal


«Nos cumes mais elevados encontram-se, nos lugares húmidos, os bosques de vidoeiros e sobre os rochedos as sorveiras. Nos lugares mais baixos atingem-se no norte de Portugal os bosques de carvalhos, em que as árvores estão suficientemente próximas para darem sombra aos caminhos e suficientemente afastadas para permitirem a passagem.
Os vales do Minho estão cobertos de bosques de carvalhos contínuos. Em seguida surge a região dos bosques de castanheiros, os verdadeiros bosques deste país, cujas árvores se tocam pela folhagem. Ornam as encostas da Serra do Marão, da Serra da Estrela, na direcção do Fundão, da Serra de Portalegre e de Monchique. No sopé das grandes montanhas encontram-se os pomares, onde a cultura dos frutos é sinal de região fria. Mais abaixo surgem a árvore da cortiça, o carrasco, o pinheiro-marítimo, em seguida o limoeiro e finalmente a laranjeira. A oliveira está ainda mais espalhada, encontra-se perto dos vidoeiros do Gerês e ao lado das laranjeiras, perto de Lisboa.»
baseado nas viagens de Hoffmansegg e Link

Parecer negativo: Proposta de definição de âmbito da Central Solar Fotovoltaica da Beira


O meu texto na Consulta Pública
"Discordo da implementação da Central Solar Fotovoltaica de Sophia e das Linhas de Muito Alta Tensão associadas, pois o impacto ambiental e paisagístico em concelhos como o Fundão, Penamacor e Idanha-a-Nova é demasiado elevado face aos benefícios apresentados.
Isto é um crime ambiental! As duas centrais preveem o abate de cerca de 2.000 árvores "protegidas". Mas serão muitos milhares mais! As que não são protegidas não as contam! Em qualquer terreno da Beira Baixa, além dos sobreiros e azinheiras (espécies protegidas) há oliveiras. Muitas delas centenárias. É previsível que sejam arrancadas milhares delas. Iremos ter terras estéreis, de onde antes provinha um azeite de excelente qualidade. Além disso nidificam aves nessa região aves de relevância ecológica (águia-de-bonelli, abutre preto, águia imperial ibérica, águia real) e localiza-se perto do Parque Natural do Tejo Internacional.
Não existe "energia verde" à conta do extermínio do verdadeiro verde da vida, do abate de milhares de árvores, da destruição de ecossistemas, provável extinção de aves sensíveis já referidas e alteração grave de uma ZPE ambientalmente rica e, repito, muito sensível."
E anexei o parecer da SPEA.



Os cartazes abjectos do Chega - como denunciar



Não partilho as fotos dos cartazes abjectos.
Partilho que já mandei queixa para CNE, PGR, Internet Segura e outros órgãos de soberania. Qualquer cidadão pode fazer. Não é preciso ser especialista em direito para perceber a violação do artigo 240 do código penal.
Aproveitem agora, porque se continuarmos muito por este caminho e voltarem novos salazares, piar é verbo que pode deixar de existir no dicionário.

"Venho por este meio denunciar e solicitar a atuação da Comissão Nacional de Eleições, Ministério Público e demais órgãos de soberania perante os cartazes colocados em locais públicos associados à candidatura presidencial de André Ventura.
Cartazes que têm por objetivo difamar e acicatar o ódio relativamente a comunidades imigrantes e à comunidade cigana. Tais mensagens, além de chocantes do ponto de vista social e humanitário, além de causarem alarme público e social, violam claramente a Constituição e em específico o Artigo 240 do Código Penal português, "Discriminação e incitamento ao ódio e à violência".
Para mim, enquanto cidadão, é inconcebível que num estado de Direito como é Portugal, cartazes daquele teor sejam expostos e mantidos no espaço público sem serem rapidamente retirados. Tal como não é compreensível que os continuados promotores destas mensagens, contrárias aos princípios da democracia, continuem impunes, apesar de o Artigo 240 prever até penas de prisão em diferentes alíneas."

Seguro diz que cartazes do Chega são inaceitáveis e violam valores constitucionais

O futuro será verde ou não será - a lição de Mancuso


Stefano Mancuso, botânico italiano e um dos maiores especialistas em neurobiologia vegetal, afirmou recentemente, em entrevista à Lusa, que os humanos deveriam aprender com as plantas a resolver problemas, em vez de fugir deles.

Mancuso recordou uma evidência antiga. As plantas não fogem, transformam o lugar onde estão. Essa imobilidade criativa, resultado de milhões de anos de evolução, encerra uma lição de enorme atualidade. Num mundo que procura soluções tecnológicas para todos os males, é nelas que se encontra a sabedoria de permanecer, adaptar e regenerar.
Concordar com Stefano Mancuso é reconhecer uma evidência que se tem tornado impossível de ignorar. Serão as plantas, e não a tecnologia, a oferecer soluções para a resolução de alguns dos maiores problemas da humanidade. Esta é uma afirmação que fere a vaidade moderna, habituada a ver nas máquinas a extensão gloriosa do cérebro humano. E, no entanto, tudo na história da Terra aponta para o contrário.

Muito antes de existirem ferramentas, cidades ou linguagem, os organismos fotossintéticos já haviam criado o oxigénio que respiramos, e as plantas contribuíram para estabilizar o solo e os ciclos que permitem a vida. Quando o homem ainda era sonho, elas já trabalhavam em silêncio na arquitetura do planeta.

A neurobiologia vegetal, campo que Mancuso ajudou a fundar, revela o que a intuição antiga já pressentia. As plantas processam informação, comunicam, ajustam respostas e resolvem problemas sem precisar de cérebro, através de mecanismos fisiológicos e bioquímicos.

Cada raiz, cada folha e as redes subterrâneas da rizosfera, onde fungos micorrízicos e bactérias simbióticas ligam plantas, funcionam como um tecido vivo de processamento e troca. Nesta descentralização está a sua força.

Enquanto a civilização humana constrói sistemas hierárquicos e frágeis, onde a queda de um centro pode paralisar o todo, as plantas operam numa estrutura descentralizada e resiliente. A raiz que morre não compromete o organismo, porque outras se estendem, outras aprendem, outras ocupam o vazio.

Esta lição de organização descentralizada desfaz a crença ingénua de que a tecnologia, criação habitualmente vertical e centralizada, pode substituir a sabedoria dos sistemas vivos. Um algoritmo pode processar dados, mas não compreende a textura da interdependência.

Uma máquina pode reproduzir formas, mas desconhece o ritmo paciente com que a vida se refaz. As plantas, pelo contrário, vivem no tempo longo da Terra. Não correm, não consomem, não conquistam. Regeneram.

É esta paciência vegetal que o homem perdeu. A era digital, com o seu ruído incessante, fez-nos confundir velocidade com progresso. O crescimento tornou-se uma corrida, o desenvolvimento uma métrica de exaustão. As plantas mostram-nos outro caminho. Crescem devagar, mas nunca em vão.

O carvalho que demora décadas a atingir a sua copa é o mesmo que cria sombra, abrigo, alimento e estabilidade para tudo o que o rodeia. Nenhum servidor informático, por mais potente, produzirá jamais uma floresta.

Tree

"I Love a Tree
by Samuel N. Baxter

When I pass on to my reward,
Whatever that may be,
I’d like my friends to think of me
As one who loved a tree.

I may not have a statesman’s poise,
Nor thrill a crowd with speech,
But I can benefit mankind
If I set out a beech.

If I transport a sapling oak
To rear its mighty head,
’Twill shade and shelter those who come
Long after I am dead.

If in the park I plant an elm,
Where children come to play,
To them ’twill be a childhood shrine
That will not soon decay.

Of if I plant a tree with fruit,
On which the birds may feed,
I’ve helped to foster feathered friends,
And that’s a worthy deed.

For winter, when the days grow short
And spirits may run low,
I’d plant a pine upon the ‘scape;
’Twould lend a cheering glow.

I’d like a tree to mark the spot
Where I am laid to rest,
To me ‘twould be an epitaph
That I would love the best.

And though not carved upon a stone
For those who come to see,
My friends would know that resting here
Is one who loved a tree."