sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Remédios, a bela


Remédios, a bela
Remédios, a bela, ficou vagando no deserto da solidão, sem cruzes de costas, amadurecendo nos seus sonhos sem pesadelos, em seus intermináveis ​​banhos, nas suas refeições sem horários, nos seus silêncios profundos e prolongados sem memórias, até uma tarde de Março, quando Fernanda quis dobrar os seus lençóis de barbante no jardim e pediu às mulheres da casa. Mal haviam começado quando Amaranta notou que Remédios a bela, era transparente com uma palidez intensa.
-Você se sente mal? - perguntou.
Remédios, a bela, que segurava a outra ponta do lençol, deu um sorriso suave.
-Pelo contrário, disse ela, nunca me senti melhor.
Terminou de dizer isso, quando Fernanda sentiu  um delicado vento de luz lhe arrancava os lençóis das suas mãos e espalhava-os em toda a sua extensão. Amaranta sentiu um tremor misterioso renda das saias e tentou segurar o lençol para não cair. No momento em que Remédios, a bela, estava começando a surgir, Úrsula, agora quase cega, foi a única que teve serenidade de identificar a natureza daquele vento irreparável, e deixou os lençóis à mercê da luz, vendo Remédios, a bela, que lhe acenou adeus, entre a vibração deslumbrante das folhas que subiam com ela, que deixavam consigo o ar dos besouros e das dálias, e passaram com ela pelo ar onde terminavam as quatro da tarde, e se perderam com ela para sempre nos altos ares onde nem mesmo os mais altos pássaros da memória poderiam alcançá-la.

"Cem Anos de Solidão", Gabriel García Márquez

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