As turfeiras são ecossistemas de zonas húmidas que se caracterizam pela acumulação de matéria orgânica parcialmente decomposta, principalmente os musgos do género Sphagnum (esfagno) e outros detritos vegetais, em solos saturados de água, que se formam em condições ambientais específicas que favorecem a acumulação de matéria orgânica em detrimento de sua decomposição. Apesar de existirem principalmente em zonas montanhosas com elevada precipitação, existiam turfeiras bem desenvolvidas em zonas litorais em Portugal, ocorrendo mesmo em sistemas dunares.
Uma das maneiras pela qual as turfeiras podem se formar em zonas dunares é através da lixiviação de nutrientes na areia. Nesse processo, a chuva ou outras fontes de água percolam pelos solos arenosos e dissolvem os nutrientes presentes no solo. À medida que a água se move pelo solo, ela carrega esses nutrientes dissolvidos para baixo, longe das camadas superficiais do solo onde as plantas não os podem absorver. Isso cria um ambiente pobre em nutrientes na superfície, o que pode limitar o crescimento da vegetação. Como resultado dessa limitação de nutrientes, e em zonas com abundância de água, os musgos do género Sphagnum podem tornar-se dominantes no ambiente. Este grupo de musgos é chamado de “engenheiro de ecossistemas”, porque altera as condições das zonas onde cresce. Na realidade, sem a presença de esfagno, não haveria acidificação do substrato e consequentemente não existiriam turfeiras. Estes organismos têm a capacidade de reter água e nutrientes, o que permite que cresçam e acumulem matéria orgânica. À medida que o musgo se acumula, cria uma espessa camada de matéria orgânica que isola o solo do ar, retardando a decomposição e favorece a acumulação de mais matéria orgânica.
Com o tempo, este processo pode levar à formação de uma turfeira nos sistemas dunares. A turfeira pode crescer em profundidade e espalhar-se lateralmente, eventualmente formando um ecossistema distinto com suas próprias comunidades vegetais e animais características. A presença de algumas turfeiras em sistemas dunares interiores em Portugal poderá ter uma génese relativamente recente, tendo em conta a dinâmica de acreção dunar em algumas áreas costeiras de Portugal Continental. A deposição da areia que permitiu a formação dos cordões dunares ao longo da costa, ocorreu na sua maioria nos últimos 500 anos, no início da Idade Média, e é o resultado da expansão agrícola a solos marginais e ao encurtamento do ciclo de recorrência dos fogos no interior da Península Ibérica, que agravaram os fenómenos erosivos e carregaram de sedimentos os grandes rios. Esse fenómeno de acreção dunar foi mais intenso no período da Pequena Idade do Gelo e a sul da foz do Douro, devido à elevada carga de sedimentos transportados pelo rio que se acumularam a sul por deriva litoral. Estas dunas eram dominadas por sedimentos pobres e espessos, com pouca matéria orgânica. A migração das partículas orgânicas das camadas superficiais destas dunas para a camada mais profunda, diminuiu a carga de nutrientes destes meios e criando um ambiente favorável ao crescimento de esfagno. Link refere no livro “Voyage en Portugal” que na Comporta se explorava turfa no século XVIII, algo muito raro em Portugal.
Sem comentários:
Enviar um comentário