Quando se fala de alterações climáticas, as florestas são sobretudo vistas como reservatórios de carbono. Defende que elas são muito mais do que isto: têm um papel importante no clima, no arrefecimento, nas chuvas e ciclo da água. Isto tem sido ignorado?
Sem dúvida. Tudo o que vemos de momento é o debate sobre queimar madeira em centrais de carvão por causa das fortes acções de lobbying da indústria florestal naquilo que é tido como neutralidade carbónica. O principal efeito das florestas é a influência no clima local e isso já foi escrito em 1831. É sabido há muito tempo e toda a gente pode senti-lo nos jardins, nos parques das cidades, mas tem sido sempre desconsiderado.
Em Portugal há muita discussão sobre o eucalipto – que é a árvore mais comum no nosso território e também uma das que mais arderam nos últimos anos –, sobretudo pela relação com os incêndios florestais. Concorda? Deveria haver mais variedade de árvores, sobretudo autóctones?
Estas alterações contam muito. As florestas naturais, primitivas, consistem sobretudo de diferentes espécies de carvalho e outras, que não ardem tanto nos incêndios florestais. Por natureza, estes incêndios eram um fenómeno muito raro. As plantações de pinheiros, por exemplo, aumentam o perigo de incêndios florestais e o eucalipto ainda é pior. Vemos estas temperaturas elevadas em incêndios florestais em zonas de eucaliptos, que até derretem carros e blocos de alumínio. Não é nada como teríamos num incêndio florestal ‘natural’. Portanto, são inteiramente causados pelos humanos.
Em termos de gestão florestal, qual é a melhor maneira de prevenir incêndios florestais?
A melhor maneira de prevenir é ter mais florestas naturais. Nas florestas naturais temos mais biomassa – que é o principal factor na questão do arrefecimento e da chuva –, mais árvores velhas, com cascas mais grossas, muito mais madeira morta. E há quem pense que florestas com uma maior quantidade de madeira morta ardem mais facilmente, mas é ao contrário. Há arvores que estão completamente repletas de água, mesmo em alturas mais áridas de Verão, portanto funcionam como uma esponja. Esta madeira morta em florestas naturais dificilmente arde. Tudo junto: ter mais florestas naturais, mais florestas húmidas, ter mais chuva nestas florestas. Devíamos olhar para os efeitos das florestas no clima local e menos para a madeira.
Entrevista Público ao escritor e guarda-florestal Peter Wohlleben. 1 de Maio de 2022
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