sexta-feira, 11 de julho de 2025

Dia Mundial da População


Crónica de Pedro Vieira

não é não.
não, filha, a imigração não está no topo dos problemas deste retângulo amaldiçoado e abençoado; a desigualdade, o acesso à habitação, à saúde e a educação de qualidade, sim.

não, amor, não são os imigrantes amontoados em camaratas que andam a destruir o teu direito constitucional à habitação; são os "imigrantes" dos vistos gold, os fundos imobiliários predadores e os autarcas amigos de hotéis de 5 estrelas e alojamentos locais e fantasias de equídeos com chifres que estão a rebentar com o tecido social das cidades.

não, miga, os imigrantes não estão cá a mamar subsídios e a viver à tua conta; eles andam a contribuir para um sistema que é desbaratado pelos destruidores de bancos e pelas multinacionais à boleia de borlas fiscais e pelos liberais com pés de barro que se agarram às tetas do estado que adoram vilipendiar.

não, fofo, a imigração nunca foi tão alta como agora; continua a haver 3% de deslocados no mundo, valor igual desde o final da segunda guerra mundial, lançada pelos tiranos que o teu novo partido favorito gosta de glosar.

não, meu bem, o teu novo partido favorito não existe para te defender e gritar "vergonha"; existe para te convencer que a culpa é dos de baixo, enquanto mama nos de cima.

não, mor, os imigrantes não roubam empregos e puxam os salários para baixo; eles deslocam-se para os lugares onde há trabalho disponível, mesmo por valores indecentes, e muitos regressam às famílias e lugares de origem quando têm a vida mais orientada.

não, coração, não és só tu que preferes estar junto dos teus; eles também.

não, querido, os imigrantes não têm sangue de monhé ou de preto; têm sangue com hemoglobina como o teu.

não, riqueza, os imigrantes não matam mais do que o teu companheiro violento e abusador.

não, minha jóia, os imigrantes não estão a invadir-nos; em muitos lugares, estão a repor vida, num país que adora exportar cortiça, conservas e jovens sem futuro.

não, cariño, tu não és descendente de um pastor de cabras da zona de Viseu com pouco jeito para escolher guarda-costas; és descendente de iberos que ninguém sabe de onde vieram, de celtas e de romanos, de fenícios, cartagineses, mouros, castelhanos e de franceses, mais os negros de África e de europeus de fracas sortes e de gente dos orientes. e de neandertais, também, e às vezes nota-se. és como um daqueles pratos do honest greens - cantina preferida dos colarinhos brancos jovens e dos empreendedores, na qual são os imigrantes que cozinham - aqueles pratos com muitas cores e paladares, sem perceberes bem o que lá está.

não, meu doce, os imigrantes não são os teus inimigos de classe; esses são os que enviam anualmente o valor de um SNS para offshores, enquanto se riem da tua fúria (e das tuas filas de espera e das tuas crianças nascidas em ambulâncias) no deck de um iate.

não é não é não

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