Léopold Sédar Senghor dizia que a emoção é negra como a razão é grega. Senghor às vezes tinha ideias parvas. Um negro africano que é educado num ambiente intelectualmente estimulante onde se promove o espírito científico, que tem acesso a uma boa escola, pode tornar-se um especialista em física quântica ou nanotecnologia, e um grego ou americano ou sueco educado numa aldeia onde o único intelectual é o feiticeiro local pode vir a ser um brilhante dançarino e um excelente declamador de poesia tradicional. Há uns anos atrás (antes do acelerado processo de modernização de Portugal nas últimas três décadas), a vida de um camponês português era o trabalho duro não-mecanizado no campo, com intervalos para dançar o vira e rezar aos santinhos para que a colheita das batatas fosse boa. Era esperado que a vida do filho dele fosse semelhante.
Os movimentos nativistas como a negritude, de que Senghor foi um expoente, tinham subjacente a ideia de que o contacto com a cultura dos colonizadores corrompia e que o verdadeiro nacionalista tinha que ir procurar uma suposta pureza cultural nativa, intocada e magnífica, vinda directamente das raízes da mãe-terra, ligada aos rituais ancestrais. Em Timor o nativismo revelou-se no mauberismo, que exaltava aqueles que, ao contrário dos assimilados, tinham supostamente conseguido não ser conspurcados pelo colonialismo. O mauberismo produziu pouco em termos literários, alguma coisa ao nível da chamada poesia de combate (má, na maior parte) e algumas cantigas políticas. Mostrou-se contudo muito produtivo como forma de propaganda política e mobilização, e nalguns sectores a sua influência continua até hoje.
Porém, nesta época de marketing new age, em que muita gente anda à procura de autenticidade e de culturas e práticas medicinais milenares, e outras coisas que tais, Portugal também exporta malais nativistas para Timor. São uma espécie engraçada, querem tudo típico, pitoresco, e realmente tradicional: as roupas, o artesanato, a música, a comida... (Indignam-se se alguém lhes sugere que comam nasi goreng, por ser indonésio, e exigem katupa, que crêem verdadeiramente timorense, sem saberem que a palavra katupa é ela própria um antigo empréstimo lexical do malaio). Os nativistas acham que o bom nativo é o nativo genuíno, gostam que os indígenas sejam autênticos e ficam chateados quando os autóctones não colaboram.
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