quarta-feira, 17 de agosto de 2022

Documentário - Cabra Marcado para Morrer


Numa de suas viagens, Eduardo Coutinho teve contato com a história de João Pedro Teixeira, um líder camponês paraibano que foi assassinado, e a saga de sua família em busca de justiça. E surge daí, a ideia de fazer um filme  que abordasse o fato.

“Cabra Marcado para Morrer” – titulo inspirado no poema de cordel “João Boa-Morte, cabra marcado para morrer”, do poeta Ferreira Gullar -, que a princípio seria um filme ficcional, tem suas gravações iniciadas na década de 60.

Os personagens da história eram atores amadores que interpretavam os seus papéis reais no filme. Devido ao Golpe Militar em 1964, as gravações foram interrompidas e parte da equipa foi presa na época sob a acusação de serem comunistas.

Após dezassete anos, o cineasta retorna ao local das gravações, porém, muitas coisas mudaram ao longo dos anos na região e o projeto inicial do filme acaba tomando outros rumos. A longa-metragem, que antes seria apenas uma reconstituição de um fato, torna-se um registo sobre o resgate das memórias coletivas de um acontecimento, que passa assumir um tom documental.

A morte de João não é mais destaque nas pautas dos jornais, em “Cabra Marcado para Morrer”, a voz reprimida durante tanto tempo ganha força e espaço. Apoiado no estilo híbrido, a obra cinematográfica é composta por encenações – imagens das primeiras gravações -, registos jornalísticos, imagens de outros filmes e entrevistas.

Segundo o Coutinho, numa entrevista cedida a Mariana Rebuá Simões (clique aqui para ver na íntegra), a longa-metragem é um “trabalho de História, de jornalismo, de cinema, tudo misturado. […] é um filme que conta a história do filme, cinema e história todo tempo, lado a lado. (…) Enfim, é um filme que aguenta até hoje porque ele não é um filme triunfalista. Ele lida com uma verdade do personagem e não com discurso."

Mas se Coutinho tivesse conseguido finalizar sua obra naquela época, sem as interrupções? Ao analisar nesse sentido, talvez a proposta do filme fosse, por exemplo, similar à longa-metragem “O Bandido Giuliano”(1962), do cineasta italiano Francesco Rosi, em que as pessoas interpretam seus próprios papéis reencenando os fatos reais que ocorreram nos locais que aconteceram.

É importante ressaltar que “Cabra Marcado para Morrer” inovou a estilística no documentário brasileiro. Para quem ainda não assistiu essa obra-prima ou não conhecia, recomendo-a.

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