ETC Group, 23 de Maio de 2006
Alarme sobre biologia sintética: coalizão global pede debate público Uma coalizão de trinta e oito organizações internacionais, a que pertencem cientistas, ambientalistas, sindicalistas, peritos em armas biológicas e defensores da justiça social, alerta para a urgência de um debate público sobre a biologia sintética, uma área de investigação em rápida expansão que abrange a criação de novas formas de vida artificiais, bem como a regulação e supervisão deste novo tipo de biologia. No fim-de-semana de 20 a 22 de Maio, um grupo de biólogos reuniu-se em Berkeley, Califórnia, no intuito de elaborar um código de conduta voluntário para auto-regular o seu trabalho. As organizações que assinaram a Carta Aberta pedem aos biólogos que abandonem as propostas de auto-regulamentação e que se envolvam num processo global de discussão pública sobre as consequências do seu trabalho (vide Carta Aberta que segue). Os investigadores presentes na reunião de Berkeley reconhecem os perigos da biologia sintética que poderão advir por parte de malfeitores, mas descuram ingenuamente da possibilidade ou probabilidade de que os membros da própria comunidade científica não possam ser capazes de controlar ou prever o comportamento dos organismos criados pela biologia sintética, bem como as consequências sociais- disse Jim Thomas do ETC Group. Cientistas que criam novas formas de vida estão actuando como se fossem juízes e membros de um júri- explica a Dra. Sue Mayer, Directora do GeneWatch UK- As possíveis implicações sociais, ambientais e do âmbito das armas biológicas são demasiadamente graves para se deixar nas mãos de bem-intencionados cientistas que, no entanto, defendem os próprios interesses. É urgente iniciar um debate público, bem como formas de regulamentação e supervisão. Nos últimos anos, os biólogos sintéticos, ao reescrever o código genético do DNA, demonstraram serem capazes de criarem novos vírus e estão presentemente a desenvolver formas de vida artificias. Em Outubro pretérito, cientistas do Center for Disease Control dos EUA recriaram o vírus da Gripe Espanhola de 1918 que matou 50 a 100 milhões de pessoas [1]. No passado mês investigadores da University of Wisconsin-Madinson criaram uma nova versão da bactéria E. coli [2] Entretanto, Craig Venter, um dos magnatas da investigação sobre o genoma, cuja empresa Celera liderou a corrida para a descodificação do genoma humano, está agora à frente de uma nova companhia, a Genomics Synthetic, que pretende comercializar micróbios artificiais a serem utilizados nos campos da energia, agricultura e redução da mudança do clima. É uma de entre umas 40 empresas de biologia sintética que sintetizam genes e/ou criam ADN artificial. A biotecnologia já despertou um movimento de protesto em todo o mundo, mas a biologia sintética é como engenharia genética aplicada a esteróides- adverte a Doutora Doreen Stabinsky da Greenpeace International.
Experimentar com organismos vivos novos e artificiais que poderão ser libertados no meio ambiente é uma enorme ameaça para a biosegurança dos seres humanos e do planeta-acrescenta Stabinsky. Em Outubro de 2004 um editorial da revista Nature advertiu - Se de facto os biólogos estão prestes a serem capazes de criar novas formas de vida, as possibilidade de abuso ou desastres involuntários são enormes. O editorial sugeriu que poderia existir a necessidade de se organizar uma conferencias to tipo ASILOMAR (referindo-se a uma reunião histórica ocorrida em 1975, onde cientistas discutiram os perigos para a biodiversidade associados à manipulação genética e optaram por uma forma de auto-regulamentação que acabou por evitar políticas governamentais de regulamentação) dedicada à biologia sintética. Seguindo o modelo de ASILOMAR, a Comunidade da Biologia Sintética pretende com esta segunda reunião de Maio de 2006 adoptar um código de auto-regulamentação a fim de cuidar dos perigos que esta nova tecnologia acarreta para a segurança biológica do planeta. De acordo com a Carta Aberta, a consequência da declaração de ASILOMAR foi atrasar a implementação de políticas governamentais adequadas e evitar uma discussão sobre os impactos socioeconómicos mais abrangentes. ASILOMAR veio a revelar-se um passo errado. Synthetic Biology 2.0 é um novo passo errado. Nós cientistas temos que aceitar o facto de a ciência já não poder afirmar desenrolar-se num reino abstracto sem nenhuma ligação com o resto da sociedade - diz Alexi Vlandas da International Engineers and Scientists for Global Responsibility (INES). Os signatários da Carta Aberta apelam aos biólogos que se reuniram em Berkeley que retirem a sua declaração e que entrem num diálogo público mais vasto. Uma nota de imprensa está disponível na página da ETC Group: www.etcgroup.com e www.etcblog.org [Na reunião de Berkeley foi elaborada uma declaração provisória que está a ser discutida na Internet antes de ser oficialmente divulgada]
Para mais informações: EUA: Jim Thomas -- ETC Group, email: jim@etcgroup.org, ph: +1 613 2412267
Pat Mooney -- ETC Group, email: mooney@etcgroup.org , cell: +1 613 2610688
Hope Shand -- ETC Group, email: hope@etcgroup.org ph: +1 919 960-5767
Edward Hammond -- Sunshine Project (biological weapons expert) email: Hammond@sunshineproject.org, cell: +1 510 717 7772
Beth Burrows -- Edmonds Institute: email: beb@igc.org, ph: +1 425-775-5383
Europa: Dr Sue Mayer -- GeneWatch UK, email: sue.mayer@genewatch.org, ph: +44 1298 871898 (office); mobile: + 44 7930 308807
Alexis Vlandas -- International Network of Engineers and Scientists email: alexis.vlandas@materials.ox.ac.uk, ph: +44 7747 036446
Notas: [1] Tumpey, TM et al (2005) Characterization of the Reconstructed 1918 Spanish Influenza Pandemic Virus. Science 310: 77-80.
[2] Posfai, G et al (2006) Emergent Properties of Reduced-Genome Escherichia coli. Published online April 27 2006; 10.1126/science.1126439 (Science Express Reports).
Carta Aberta:
Carta Aberta de movimentos sociais e outras organizações civis ou não-governamentais a propósito da Synthetic Biology 2.0 Conference de 20-22 de Maio de 2006, realizada em Berkeley, Califórnia, referente ao amplo voto da comunidade sobre as resoluções a tomar no contexto da segurança biológica (a implementar a 1 de Janeiro de 2007). Vimos, por este meio, exprimir o nosso profundo receio a respeito do campo da biologia sintética que se encontra em rápida expansão, cujo objectivo é a criação de novas formas de vida artificiais e únicas. Acreditamos que esta tecnologia poderosa está a ser desenvolvida sem uma discussão pública sobre os efeitos socioeconómicos e ambientais, bem como as consequências sobre a saúde, segurança e os direitos humanos. Estamos alarmados pelo facto de biólogos sintéticos se terem reunido em Berkeley com o objectivo de votarem uma declaração de auto-regulamentação sem consultarem ou envolverem grupos sociais mais amplos. Rogamos os signatários que retirem as suas propostas de auto-regulamentação e que entrem num processo de vigilância aberta e participativa a respeito desta nova tecnologia. Asilomar 2.0? Em 1975 um grupo de cientistas reuniu-se em ASILOMAR a fim de discutir os perigos provenientes da engenharia genética. A reunião promoveu uma forma de auto-regulamentação que acabou por evitar uma discussão pública e políticas governamentais de regulamentação. Synthetic Biology 2.0 segue o mesmo caminho de auto-regulamentação. O âmbito das discussões levadas a cabo em Asilomar estava limitado às questões de segurança, excluindo expressamente implicações mais vastas de cariz socioeconómico e ético. A declaração de Asilomar acabou por atrasar o desenvolvimento de uma adequada regulamentação oficial por parte do governo e evitar uma discussão sobre os enormes impactos socioeconómicos. ASILOMAR veio a revelar-se um passo errado e Synthetic Biology 2.0 é agora outro passo errado. Reconhecemos que os biólogos têm uma preocupação muito justificada sobre certos riscos da biologia sintética, mas para limitar esses riscos são necessárias fortes medidas vinculativas que estejam de acordo com o princípio de precaução. Como afirmou recentemente o presidente de mesa no Town Hall Meeting de Bóston, a propósito das propostas feitas - Não acredito que sirvam muito para evitar o abuso desta tecnologia. Concordamos com a afirmação de que as propostas sejam pouco eficientes. Além disso, as preocupações de ordem social, económica, ética, ambiental e jurídica (Direitos Humanos) que a biologia sintética faz surgir vão muito além da dissuasão de terroristas biológicos ou malfeitores. Dever-se-ia igualmente estudar aprofundadamente questões ligadas à propriedade (incluindo a intelectual), ao rumo e controlo da ciência, à tecnologia, processos e produtos resultantes. A sociedade e particularmente movimentos sociais e comunidades marginalizadas têm o direito de serem envolvidas no diálogo sobre a regulamentação da biologia sintética. Devido ao enorme potencial e alcance deste campo novo, as discussões e decisões sobre a tecnologia em questão devem ter lugar de forma acessível a nível local, nacional e global. Na ausência de uma regulamentação eficaz, é compreensível que os cientistas procurem estabelecer as melhores práticas possíveis; no entanto, a solução seria juntarem-se à sociedade a fim de se procurar uma ampla vigilância pública da tecnologia e acções governamentais que assegurem o bem-estar social. Além disso, desde Asilomar, tem-se verificado uma cada vez maior dependência da ciência de interesses comerciais, pelo que é possível que seja a própria industria a declarar que se tem de auto-regulamentar a biologia sintética. Rogamos, pelo exposto, que retirem a sua declaração de auto-regulamentação e que se juntem a nos em busca de um diálogo mais vasto e participativo.(Créditos da tradução: António Dinis, Prof. Un.Viena).
Lista das entidades signatárias da Carta Aberta:
Accion Ecologica (Ecuador) - http://www.accionecologica.org/ - Elizabeth Bravo
California for GE Free Agriculture - http://www.calgefree.org/ - Becky Tarbotton
Centro Ecologico (Brazil) - Maria Jose Guazzelli
Clean Production Action - http://www.cleanproduction.org/ - Beverley Thorpe
Cornerhouse UK - http://www.thecornerhouse.org.uk/ - Nick Hildyard
Corporate Europe Observatory - http://www.corporateeurope.org/ - Nina Holland
Corporate Watch (UK) - http://www.corporatewatch.org/ - Olaf Bayer
EcoNexus - http://www.econexus.info/ - Ricarda Steinbrecher
Ecoropa - Christine Von Weisczacker
Edmonds Institute - http://www.edmonds-institute.org/ - Beth Burrows
Friends of the Earth International - http://www.foe.org/ - Juan Lopez, Lisa Archer (USA), Georgia Miller (Australia)
Foundation on Future Farming (Germany) - http://www.zs-l.de/ - Benedikt Haerlin
Fondation Sciences Citoyennes (France) - http://www.sciencescitoyennes.org/ - Claudia Neubauer
Gaia Foundation - http://www.gaiafoundation.org/ - Teresa Anderson
GeneEthics Network (Australia) - http://www.geneethics.org/ - Bob Phelps
Genewatch (UK) -http://www.genewatch.org/ - Sue Mayer GRAIN - http://www.grain.org/ - Henk Hobbellink
Greenpeace International - http://www.greenpeace.org/ - Doreen Stabinsky
Henry Doubleday Research Association (UK) - http://www.gardenorganic.org.uk/ - Julia Wright Indigenous People's Biodiversity Network - Alejandro Argumedo
International Center for Technology Assessment - http://www.icta.org/ - Jaydee Hanson
International Network of Engineers and Scientists for Global Responsibility - http://www.inesglobal.com/ - Alexis Vlandas
Institute for Social Ecology - http://www.social-ecology.org/ - Brian Tokar
International Center for Bioethics, Culture and Disability - http://www.bioethicsanddisability.org/ - Gregor Wolbring
International Union of Food and Agricultural Workers - http://www.iuf.org/ - Peter Rossman
Lok Sanjh Foundation (Pakistan) - http://www.loksanjh.org/ - Shahid Zia
National Farmers Union (Canada) - http://www.nfu.ca/ - Terry Boehm
Oakland Institute - http://www.oaklandinstitute.org/ - Anuradha Mittal
Polaris Institute - http://www.polarisinstitute.org/ - Tony Clarke
Pakistan Dehqan Assembly - contact via Lok Sanjh - see above.Practical Action - http://www.practicalaction.org/ - Patrick Mulvany
Quechua Ayamara Association for Sustainable Livelihoods, (Peru) - http://www.andes.org.pe/ - andes@andes.org.pe
Research Foundation for Science, Technology and Ecology (India) - http://www.navdanya.org/ - Vandana Shiva
Soil Association - http://www.soilassociation.org/ - Gundula Azeez
Sunshine Project - http://www.sunshine-project.org/ - Edward Hammond
Third World Network - http://www.twnside.org.sg/ - Lim Li Ching
Sim, é possível assegurar que os tigres, as tribos, as árvores e todas as demais formas de vida sejam protegidas e possam continuar sua viagem evolutiva em paz e harmonia, escreve neste artigo, exclusivo para o Terramérica, a activista indiana Vandana Shiva*
*Vandana Shiva é uma activista e líder ecologista de fama mundial. Directora da Research Foundation for Science, Technology and Ecology, um instituto independente dedicado à investigação de temas ecológicos e sociais importantes em estreita colaboração com as comunidades locais. Além disso é a líder do International Forum on Globalization, junto com Ralph Nader y Jeremy Rifkin.
Em 1991, fundou Navdanya, um movimento nacional para proteger a diversidade e a integridade dos recursos vivos, sobretudo das sementes autóctones. É uma das pensadoras mais provocadoras e dinâmicas em matéria de meio ambiente.
Em 1993, ganhou o Prémio Right Livelihood Award, también conhecido como o prémio Nobel da Paz alternativo.
Es autora de numerosos libros, entre eles, Biopiracy: The Plunder of Nature and Knowledge, Monocultures of the Mind, The Violence of the Green Revolution y Staying Alive.
Além disso, é editora adjunta de The Ecologist.
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