Todos os alimentos para consumo humano e animal que, na sua composição, incluam ingredientes transgénicos vão ter de informar o consumidor dessa presença. A lei comunitária entra em vigor a partir deste fim-de-semana mas isso não quer dizer que, depois de segunda-feira, os rótulos já estejam todos actualizados. É que todos os bens cujo processo produtivo se tenha iniciado antes do próximo dia 18 não são obrigados a cumprir as novas normas. Daqui para a frente, já não haverá excepções.
Hoje, 16 de Abril de 2004 entra em vigor o regulamento que define que se pode conseguir seguir o rasto de todos os ingredientes utilizados nos produtos alimentares. O objectivo é o de, além de facilitar a rotulagem, conseguir retirar todos os produtos de mercado que tenham como ingrediente um determinado transgénico que se provou que provoca efeitos prejudiciais para a saúde humana, para os animais ou para o ambiente.
No domingo, é a vez de o regulamento da rotulagem que obriga a que qualquer produto alimentar avise o consumidor que existem elementos transgénicos na sua composição entrar em vigor. Até agora, a lei obrigava a fornecer este aviso só quando, no produto final, se detectava a presença de mais de um por cento de transgenes.
As novas normas foram saudadas por ambientalistas e agricultores com culturas biológicas que defendem a opção dada agora aos consumidores de comprar, ou não, produtos com organismos geneticamente modificados (OGM). Além disso, esta legislação cria um "novo patamar de garantias alimentares", congratula-se a plataforma "Transgénicos fora do prato", que inclui diversas associações da área do ambiente e da agricultura.
O consumidor tem o lugar central nestas leis. "O que está em questão não é tanto a segurança alimentar mas mais o direito do consumidor em estar informado, porque tudo o que até agora tem sido avaliado em matéria de OGM tem indicado que estes são seguros", afirmou Lurdes Camilo, da Direcção-Geral de Fiscalização e Controlo da Qualidade Alimentar (DGFCQA).
Mas estes regulamentos europeus cumprem também objectivos políticos. A sua aprovação foi a solução encontrada para tentar travar o diferendo que se arrasta há anos entre a União Europeia e os Estados Unidos em relação aos transgénicos. E pôr um ponto final na moratória informal imposta por alguns países europeus, que fecharam as suas portas à importação de OGM, o que aliás gerou uma queixa colocada pelos EUA na Organização Mundial do Comércio. Porém, esta moratória não está totalmente afastada, já que a lista de produtos geneticamente modificados aprovados pela UE é restrita.
Aplicação complexa
Tanto as autoridades, como a indústria, como até as associações ambientalistas admitem que a aplicação da legislação vai ser complicada. O grande esforço pedido às indústrias é de base documental: as empresas têm de pedir e guardar por cinco anos todas as declarações sobre os diferentes ingredientes que usam, onde se explicitam quais os materiais utilizados e se são transgénicos.
"Temos de ter grande confiança nos fornecedores", explica Jaime Piçarra, da Associação Portuguesa dos Industriais de Alimentos Compostos para Animais (IACA). Ou seja, o produtor tem de acreditar que o seu fornecedor está a dar-lhe todas as informações. Mas esta exigência esbarra nalguma resistência por parte de países como os Estados Unidos, que não consideram que se esteja perante um problema de segurança alimentar.
"Se os documentos não forem verdadeiros, como é que podemos garantir que não há transgénicos?", questiona Isabel Sarmento, da Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares (FIPA). "É que, muitas vezes, não é possível detectar se há transgenes, por mais análises que se façam", acrescenta.
A capacidade de resposta dos laboratórios - que vão passar a ser muito requisitados para o autocontrolo que as empresas vão fazer - e os métodos analíticos, que são limitados, são duas das grandes preocupações dos industriais e ambientalistas.
Apesar de tudo, a indústria diz-se preparada para aplicar os regulamentos, tendo redigido um guia onde se explicam todas as implicações da lei e as mudanças necessárias, a distribuir pelos associados da IACA e da FIPA.
Por enquanto, a grande mudança prende-se com a quantidade de documentação que é pedida às empresas. "A gestão dos 'stocks' terá de ser cirúrgica, pois a rotulagem tem de ser adequada - e modificada - conforme os lotes que se recebem", explica Margarida Silva, da plataforma "Transgénicos fora do prato".
Mas, a prazo, uma outra mudança pode ser ditada pelos consumidores. Isabel Sarmento, da FIPA, diz que "a indústria vai esperar para ver como se comporta o mercado". Mas Lurdes Camilo acredita que muitas empresas vão começar, desde logo, a apostar na substituição dos ingredientes transgénicos por outros alternativos.
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