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A moda rápida e barata - conhecida como fast fashion - que veio com as grandes cadeias mundiais, mudou a forma como nos vestimos. A produção mundial de roupa duplicou, tendo ultrapassado os cem mil milhões de peças por ano em 2015. Entre as várias consequências deste movimento - nomeadamente a aceleração da moda, a cópia, e a globalização dos estilos - veio também o peso ambiental. É que quando deixa de ser útil grande parte da roupa velha acaba no lixo. Há uma parte que é colocada em contentores para reutilização, mas outra vai parar aos caixotes indiferenciados, e para estes o único destino é o aterro e a incineração. Em Portugal, deita-se para o lixo 200 mil toneladas de têxteis por ano.
De acordo com os dados da Agência Portuguesa do Ambiente (APA) em 2017 foram recolhidas cerca de 200 756 toneladas de têxteis nos resíduos urbanos, um valor ligeiramente superior ao registado no ano anterior (196 865) - o que representa cerca de 4% do total de resíduos produzidos em Portugal (perto de 4,75 milhões). Se analisarmos o período entre 2011 e 2017, foram deitados ao lixo 1,2 milhões de toneladas de têxteis - um problema que não é exclusivo de Portugal. De acordo com o The Guardian, em 2016 foram enviadas para aterros 350 mil toneladas de roupa no Reino Unido. Já nos EUA, são gerados mais de 15 milhões de toneladas de resíduos têxteis por ano, e apenas 2,62 milhões são reciclados.
É lixo a mais. Segundo a Greenpeacecada pessoa compra, em média, mais 60% das peças do que comprava no ano 2000 e só as mantém metade do tempo. E isto é especialmente grave porque a indústria têxtil é uma das mais poluentes do mundo. Em alguns rankings, a moda aparece em segundo lugar entre os setores menos amigos do ambiente, logo a seguir à indústria petrolífera. Para produzir uma T-shirt de algodão, por exemplo, são necessários 2700 litros de água. Já numas calças de ganga, o consumo de água pode chegar aos 10 000 litros. E o consumo de recursos hídricos é apenas um dos muitos impactos desta indústria.
Um dos maiores problemas diz respeito às matérias-primas usadas. "A maior parte da roupa é sintética, provém do petróleo. Estamos a vestir-nos de plástico. Cada vez mais deixamos de comprar roupa de algodão", diz Carmen Lima, coordenadora do Centro de Informação de Resíduos da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza. Por outro lado, há o impacto associado às tintas, que acabam muitas vezes por contaminar os rios: "Muitas têm compostos orgânicos voláteis associados e nem sequer cumprem certificações." Já as emissões atmosféricas de gases de efeito estufa são uma constante desde o processo de produção, ao transporte, ao próprio uso.
Além da produção, há também a reciclagem - que não é feita tanto como devia. A Associação Portuguesa do Ambeite explica que, em Portugal, "não existindo recolha seletiva de resíduos [têxteis], a sua recolha é feita em conjunto com a fração indiferenciada, pelo que o destino será aterro, valorização energética ou, nalgumas situações, produção de combustível derivado de resíduos". No entanto, adianta, "e em alinhamento com a Diretiva (UE) 2018/851 de 30 de maio de 2018 (recolha seletiva de resíduos têxteis obrigatória a partir de 1 de janeiro de 2025) está prevista a implementação de sistemas de recolha seletiva de resíduos têxteis pelos sistemas de gestão de resíduos urbanos, ou pelos municípios que os integram". A partir dessa altura, os têxteis encaminhados como resíduos serão, sempre que possível, preparados para reutilização e reciclagem.
Nos têxteis, há "uma parte significativa" que é recolhida para reutilização, feita em contentores localizados na via pública, com intenção de "que a mesma seja novamente usada para o mesmo fim". Uma das empresas que se dedicam à recolha de roupa em Portugal é a Ultriplo, com sede em Braga. Em 2018 recolheu 6 333 584 quilos de resíduos têxteis, sendo na sua maioria roupas, e contando também com calçado, brinquedos e livros. Atendendo a este valor, estima "uma redução anual de 19 634,1 toneladas de dióxido de carbono".
Anualmente, a Ultriplo recolhe "mais de 6000 toneladas de resíduos têxteis um pouco por todo o país, impedindo que 90% do que é recolhido acabe em aterros". Após a receção dos artigos, estes são separados consoante as suas características e qualidade, podendo ser encaminhados para os parceiros sociais da empresa, para reutilização (uma parte é exportada), para reciclagem (30%) ou para o aterro.
Falta sensibilização dos mais jovens
Carmen Lima, da Quercus, diz que "o que vai parar aos aterros em Portugal ainda tem alguma expressão". Não há dados centralizados sobre a quantidade recolhida nos contentores para reutilização - "e que devia estar quantificada" -, mas acredita que será "francamente superior ao que vai parar ao aterro". Quando chega lá, geralmente encontra-se em mau estado. "Mas não sabemos se chegou assim ao lixo ou se ficou danificada durante o processo."
Neste assunto, não há ainda muitas pessoas que tenham noção do que estão a fazer quando estão a deitar fora uma peça de roupa. "Há um núcleo de consumidores de fast fashion que usam a roupa uma ou duas vezes e não têm a preocupação de a passar para as organizações. Sobretudo nas gerações mais novas, não há tendência para entregar a roupa às organizações de solidariedade social", critica Carmen Lima, destacando que, quando não há contentores nas proximidades, há "uma franja da população" que não os procura quando se quer desfazer da roupa.
Um dos maiores problemas diz respeito às matérias-primas usadas. "A maior parte da roupa é sintética, provém do petróleo. Estamos a vestir-nos de plástico. Cada vez mais deixamos de comprar roupa de algodão", diz Carmen Lima, coordenadora do Centro de Informação de Resíduos da Quercus - Associação Nacional de Conservação da Natureza. Por outro lado, há o impacto associado às tintas, que acabam muitas vezes por contaminar os rios: "Muitas têm compostos orgânicos voláteis associados e nem sequer cumprem certificações." Já as emissões atmosféricas de gases de efeito estufa são uma constante desde o processo de produção, ao transporte, ao próprio uso.
Além da produção, há também a reciclagem - que não é feita tanto como devia. A Associação Portuguesa do Ambeite explica que, em Portugal, "não existindo recolha seletiva de resíduos [têxteis], a sua recolha é feita em conjunto com a fração indiferenciada, pelo que o destino será aterro, valorização energética ou, nalgumas situações, produção de combustível derivado de resíduos". No entanto, adianta, "e em alinhamento com a Diretiva (UE) 2018/851 de 30 de maio de 2018 (recolha seletiva de resíduos têxteis obrigatória a partir de 1 de janeiro de 2025) está prevista a implementação de sistemas de recolha seletiva de resíduos têxteis pelos sistemas de gestão de resíduos urbanos, ou pelos municípios que os integram". A partir dessa altura, os têxteis encaminhados como resíduos serão, sempre que possível, preparados para reutilização e reciclagem.
Nos têxteis, há "uma parte significativa" que é recolhida para reutilização, feita em contentores localizados na via pública, com intenção de "que a mesma seja novamente usada para o mesmo fim". Uma das empresas que se dedicam à recolha de roupa em Portugal é a Ultriplo, com sede em Braga. Em 2018 recolheu 6 333 584 quilos de resíduos têxteis, sendo na sua maioria roupas, e contando também com calçado, brinquedos e livros. Atendendo a este valor, estima "uma redução anual de 19 634,1 toneladas de dióxido de carbono".
Anualmente, a Ultriplo recolhe "mais de 6000 toneladas de resíduos têxteis um pouco por todo o país, impedindo que 90% do que é recolhido acabe em aterros". Após a receção dos artigos, estes são separados consoante as suas características e qualidade, podendo ser encaminhados para os parceiros sociais da empresa, para reutilização (uma parte é exportada), para reciclagem (30%) ou para o aterro.
Falta sensibilização dos mais jovens
Carmen Lima, da Quercus, diz que "o que vai parar aos aterros em Portugal ainda tem alguma expressão". Não há dados centralizados sobre a quantidade recolhida nos contentores para reutilização - "e que devia estar quantificada" -, mas acredita que será "francamente superior ao que vai parar ao aterro". Quando chega lá, geralmente encontra-se em mau estado. "Mas não sabemos se chegou assim ao lixo ou se ficou danificada durante o processo."
Neste assunto, não há ainda muitas pessoas que tenham noção do que estão a fazer quando estão a deitar fora uma peça de roupa. "Há um núcleo de consumidores de fast fashion que usam a roupa uma ou duas vezes e não têm a preocupação de a passar para as organizações. Sobretudo nas gerações mais novas, não há tendência para entregar a roupa às organizações de solidariedade social", critica Carmen Lima, destacando que, quando não há contentores nas proximidades, há "uma franja da população" que não os procura quando se quer desfazer da roupa.
Seria importante fazer recolha seletiva de roupa em Portugal? "Era importante, mas isso não implica mais um contentor." Na opinião de Carmen Lima, era preferível "promover uma rede, talvez com uma entidade gestora, que organizasse o processo de recolha", nomeadamente com mais contentores nas proximidades das pessoas. E, sublinha, que cada loja "pagasse uma ecotaxa por produto, pelo seu impacto ambiental associado".
Carmen Lima acredita que a sociedade "está mais atenta às questões sociais" associadas ao fabrico da roupa, mas nem tanto ao impacto ambiental que este setor tem. "A moda é feita de tendências, o que faz que as pessoas tenham uma necessidade constante de comprar. É feita de roupa barata, com pouca qualidade, fibras sintéticas e pouco controlo sobre as condições ambientais e de trabalho." Por isso, prossegue, é preciso educar a sociedade para a compra e o destino que dá aos produtos usados. "Quando nos tentamos ver livres da roupa em bom estado, devemos encaminhá-la para ser reutilizada ou reciclada."
Sasia recicla 900 toneladas por mês
Em Vila Nova de Famalicão, a Sasia recicla "todo o tipo de resíduos têxteis e de diferentes composições: algodão, poliéster, lã, linho, viscose, acrílico, entre outros". Miguel Silva, administrador, explica que "a grande maioria dos resíduos são provenientes da indústria têxtil (confeção, fiação, tecelagem, etc.)", tanto nacional como internacional. Por mês, a Sasia recicla cerca de 900 toneladas de tecidos.
Em funcionamento há 67 anos, a empresa trabalha "no sentido de criar um sistema circular que permita recuperar resíduos das suas produções, dando-lhes assim um novo destino". Com "processos tecnológicos automatizados", Miguel Silva conta que a empresa transforma os resíduos "em ramas destinadas a segmentos de mercado muito diferentes: indústria automóvel, hidrófila, colchoaria, fiação, geotêxtil e horticultura, entre outras".
Para Paulo Vaz, diretor-geral da Associação Têxtil e Vestuário de Portugal, o futuro da indústria têxtil passa "pela economia circular e pela sustentabilidade", nomeadamente com o desenvolvimento "de tecnologias evoluídas e economicamente sustentáveis, que permitam transformar os resíduos em matéria-prima". Atendendo ao facto de Portugal ter de importar praticamente todas as matérias-primas, um grande passo seria a criação destas através dos resíduos. Hoje, frisa, já há muitas empresas que usam materiais reciclados na confeção do seu vestuário.
Marcas atentas às preocupações dos consumidores
Nos últimos anos, várias empresas deram passos em frente rumo a um futuro mais sustentável. Assistiu-se à criação de vários conceitos amigos do ambiente, nomeadamente dentro da moda ecovegan, mas também a iniciativas com vista à redução da pegada ecológica do setor. A H&M, por exemplo, diz que 57% dos materiais usados pelo grupo são atualmente "reciclados ou de origem sustentável". Desde que lançou a sua iniciativa de reciclagem de têxteis, em 2013, a H&M reciclou 25 mil toneladas de roupa doada pelos seus clientes em todo o mundo, o equivalente a 125 milhões de T-shirts. Nas lojas da marca, os clientes recebem vouchers por cada saco de roupa usada que entregam: "Todos os têxteis são bem-vindos - qualquer marca, qualquer estado -, até meias sem par, T-shirts gastas e lençóis antigos."
Mais tarde, em 2016, foi a vez de a Zara apostar na reciclagem de roupa: "Traga a roupa que não usa e dê-lhe uma nova vida." Atualmente, a marca do grupo Inditex tem pontos de recolha em algumas lojas, mas pretende vir a estender o serviço a toda a sua rede. De acordo com a informação disponível no site, as peças recolhidas serão "doadas, recicladas, transformadas em novos tecidos ou comercializadas de forma a permitir o financiamento" de várias organizações sem fins lucrativos, como a Cáritas ou a Cruz Vermelha.
Atenta à preocupação dos consumidores com a sustentabilidade dos produtos que adquirem, a C&A também tem vindo a desenvolver várias ações e produtos, que procuram diminuir o seu impacto ambiental. Uma estratégia que passa, por exemplo, pela aposta em algodão biológico ou pela utilização de materiais reciclados.
Preocupação vs. marketing
E quando são as marcas a pedir que os consumidores comprem menos? Foi o que fez a Adolfo Dominguez, em março, ao lançar a campanha "Pensa. Depois compra". Ao DN, os responsáveis pela marca espanhola explicam que "o objetivo da campanha é convidar os consumidores a refletir sobre um modelo de consumo mais responsável, sobre a valorização da qualidade e da durabilidade das peças".
Segundo a marca, cada espanhol compra, em média, 34 peças de roupa por ano. "Mas a questão não é só o número de peças. Há pessoas que compram uma camisola para usar e tirar, e isso não é o normal. O normal é ter uma peça que possa durar dez anos no armário", refere a marca, numa resposta escrita enviada ao DN. Numa era em que "o que importa é o último, o novo, o que acabou de sair", a Adolfo Dominguez - marca de autor - quer ter uma visão alternativa, apelando também aos consumidores que "sejam mais velhos". Porque isso é "escolher melhor" e, assim, "ser mais sustentável".
Para Mafalda Ferreira, professora no IPAM - Instituto Português de Administração e Marketing, este tipo de estratégias "pretendem ir ao encontro dos valores emergentesem termos de consumo". Atualmente, a especialista em consumo diz que há dois eixos que os consumidores valorizam: a transparência e a responsabilidade. "As marcas assumem que poluem, que este não é o mundo ideal, mas que têm problemas", afirma.
Ao lançar uma campanha que apela a um consumo mais consciente, Mafalda Ferreira considera que a Adolfo Dominguez quer "posicionar-se, fazer frente à fast fashion, que tem preços mais baratos, menor qualidade, que contribui ainda mais para todos os impactos que a indústria já tem". Este é, segundo a docente, um movimento global, que atinge as várias áreas. "O apelo à sustentabilidade é um caminho para as marcas se diferenciarem das suas concorrentes, valorizando aquilo que vai sendo gradualmente mais importante para os seus consumidores." É "claramente uma estratégia".
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