sábado, 20 de dezembro de 2025

Type O Negative - Red Water (Christmas Mourning)


Enquanto o imaginário Português associa o Natal a um bom velhinho de barba branca que distribui presentes, na região dos Alpes, na Europa Central, existe um personagem bem menos simpático circulando na mesma época do ano. É o Krampus, criatura meio bode, meio demónio, que ficou conhecida como uma espécie de “Pai natal do mal”: em vez de recompensar crianças comportadas, ele pune as que desobedecem.
A palavra Krampus vem de Krampen, palavra para "garra" do alto alemão antigo.

Quem é o Krampus
Na tradição de países como Áustria, Alemanha e partes da Itália e da Eslovênia, o Krampus é o contraponto sombrio de São Nicolau, figura que deu origem ao Pai Natal moderno. Enquanto o santo visita as casas para premiar as crianças que se comportaram bem, o Krampus  acompanha-o,  ou aparece sozinho — para lidar com quem não seguiu as regras.

A aparência é pensada para assustar: chifres curvados, corpo peludo, patas de bode, garras afiadas, língua longa e olhos vermelhos. Em muitas representações, ele carrega correntes que arrasta pelo chão, chocalhos barulhentos e um feixe de varas de bétula, usadas para “corrigir” os pequenos desobedientes. Em versões mais extremas da lenda, o monstro leva as crianças más dentro de um cesto ou saco nas costas, para devorá-las ou arrastá-las para o inferno.

Origem de uma figura sombria
A origem exata do Krampus é motivo de debate entre historiadores e antropólogos. Alguns estudiosos apontam possíveis raízes em rituais pagãos de inverno, ligados a divindades da natureza e a espíritos selvagens que eram “domados” com a chegada do cristianismo. Outros lembram que as primeiras menções claras à criatura surgem apenas a partir do século 16, já em contexto cristão, como um ajudante demoníaco de São Nicolau.

O certo é que, ao longo dos séculos, a Igreja tentou controlar ou até proibir a tradição em alguns momentos, considerando o personagem excessivamente violento ou ligado demais ao paganismo. Mesmo assim, o Krampus resistiu em vilarejos alpinos e, com o tempo, foi-se transformando — de demónio amedrontador em figura folclórica, ainda assustadora, mas encarada hoje com um misto de medo e humor.

Krampusnacht: a noite em que o “anti-Natal” sai às ruas
O ponto alto do calendário do Krampus é a Krampusnacht, a “Noite do Krampus”, celebrada em 5 de dezembro, véspera do dia de São Nicolau. Nessa data, cidades e vilarejos dos Alpes organizam desfiles em que homens — e, cada vez mais, mulheres — se fantasiam de Krampus, com máscaras de madeira esculpidas à mão, peles de animais, chifres, sinos e correntes.

As chamadas Krampusläufe (“corridas do Krampus”) misturam tradição religiosa, carnaval de rua e espetáculo turístico. Os participantes correm, pulam, batem as correntes no chão e fingem perseguir crianças e adultos distraídos, arrancando gritos, risos nervosos e muitas fotos. Em algumas regiões, é costume oferecer um gole de schnapps, aguardente de fruta, às criaturas mascaradas — e a combinação de álcool, fantasia pesada e multidão nem sempre termina bem, com casos registrados de feridos durante desfiles mais tumultuados.

Educação pelo medo
Por trás das chamas, máscaras e correria, a função original do Krampus era bem clara: servir de instrumento de disciplina. Se o Pai Natal recompensa os bons com presentes, o “Pai Natal do mal” deixaria varas, carvão ou, no limite, levaria embora quem se comportou muito mal.

Antigamente, postais de Natal traziam ilustrações de crianças aterrorizadas sendo perseguidas ou arrastadas pelo monstro, em cenas que hoje seriam consideradas pesadas para o público infantil. As imagens, porém, faziam parte da pedagogia da época: mostrar que o mau comportamento teria consequências. Aos poucos, esse tom foi ficando mais leve, e as representações modernas do Krampus tendem a ser mais caricatas — ainda ameaçadoras, mas com pitadas de humor.

Do folclore alpino para o cinema e a cultura pop
Nas últimas décadas, o Krampus saiu dos vilarejos alpinos e invadiu a cultura pop global. Filmes de terror natalino, episódios de séries, banda-desenhada, bonecos colecionáveis e fantasias de Halloween ajudaram a transformar a criatura em um ícone pop do “lado B” do Natal.

A figura também ganhou espaço em festas temáticas e eventos inspirados na Krampusnacht em cidades de fora da Europa, incluindo cidades norte-americanas. 

O que o Krampus diz sobre o Natal
O contraste entre Papai Noel e Krampus ajuda a entender como diferentes sociedades lidam com a mesma data. Em vez de apenas celebrar generosidade e consumismo, a tradição alpina coloca lado a lado recompensa e punição, luz e trevas, lembrando que o Natal também é um tempo de balanço moral.

Para especialistas em folclore, o sucesso recente do Krampus mostra como o público se interessa por narrativas que subvertem ícones consagrados. O “Pai Natal do mal” assusta, mas também diverte — e, no fim das contas, mantém viva uma das funções mais antigas das histórias de Natal: usar fantasia e símbolos fortes para falar sobre medo, culpa, responsabilidade e, quem sabe, a hipótese de ser e se comportar melhor no ano seguinte.

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