domingo, 5 de outubro de 2025

Fanatismo: o que acontece no cérebro?


A ciência mostra que o fanatismo — seja religioso, político ou ideológico — não é apenas uma questão de opinião. Ele afeta o funcionamento do cérebro, moldando a forma como pensamos, sentimos e reagimos.
Emoção acima da razão
Pesquisas em neurociência indicam que o fanatismo ativa intensamente o sistema límbico, especialmente a amígdala cerebral (hipófise - ligada ao medo e à raiva) e o núcleo accumbens, no estriado ventral (centro do sistema de recompensa).
Nesses momentos, há forte liberação de dopamina, que sinaliza prazer e reforça a motivação. Isso gera uma sensação de pertencimento e recompensa ao defender a crença, semelhante ao que ocorre em vícios.

Prejuízo no pensamento crítico
Ao mesmo tempo, há redução da atividade no córtex pré-frontal dorsolateral, área responsável por análise racional e flexibilidade cognitiva. O resultado é a dificuldade de revisar ideias ou aceitar informações que contradizem a crença.

Viés de confirmação
O cérebro passa a selecionar apenas informações que confirmam aquilo em que já se acredita. Críticas ou fatos contrários são percebidos como ameaças, acionando reações defensivas e emocionais.

Efeito semelhante a vício
Assim como nas dependências químicas, o fanatismo reforça circuitos de dopamina ligados à recompensa. Cada vez que a crença é reafirmada, o núcleo accumbens regista esse reforço como uma vitória, consolidando ainda mais a convicção.
Esse ciclo cria uma dependência emocional difícil de quebrar.
Inteligência preservada… mas seletiva
É importante destacar que o fanatismo não elimina a capacidade cognitiva geral.

Um fanático pode ser um ótimo profissional, resolver problemas complexos e aprender coisas novas normalmente.
Porém, quando o tema toca o objeto de devoção, o pré-frontal (nosso racional) “se cala” e o sistema emocional domina.
Isso cria uma “zona cega cognitiva”: fora dela, a razão funciona; dentro dela, a emoção prevalece.
Impacto na sociedade
O fanatismo não diminui a inteligência global, mas estreita o campo da razão quando o tema envolve a crença central. Isso pode levar a intolerância, polarização e resistência ao diálogo.

É possível mudar?
O fanatismo não é uma doença, mas um padrão de funcionamento do cérebro e das relações sociais.

A boa notícia é que, graças à neuroplasticidade, ele pode ser reduzido ou até revertido.
Educação crítica, diálogo empático, diversidade de experiências e práticas que equilibram emoção e razão (como mindfulness e terapia cognitiva) ajudam a reativar o pré-frontal e diminuir o domínio das emoções extremas.

Referências científicas
Kaplan, J. T., Gimbel, S. I., & Harris, S. (2016). Neural correlates of maintaining one’s political beliefs in the face of counterevidence. Scientific Reports, 6, 39589.
Asp, E. W., Ramchandran, K., & Tranel, D. (2012). Authoritarianism, religious fundamentalism, and the human prefrontal cortex. Neuropsychology, 26(4), 414–421.
Zmigrod, L., Rentfrow, P. J., & Robbins, T. W. (2018). The partisan brain: An Identity-Based Model of Political Belief. Trends in Cognitive Sciences, 22(2), 152–163.

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