Análise da lista de participantes concluiu que a indústria dos combustíveis fósseis tem mais delegados presentes na cimeira do clima da ONU do que o Brasil, o país que participa com a maior delegação, e do que o conjunto dos oito países mais afetados pelas alterações climáticas
A indústria dos combustíveis fósseis tem 503 representantes a participar na Cimeira do Clima da ONU. É a maior "delegação" presente na COP26, mas ativistas defendem que a sua presença devia ser banida.
O número foi apurado pela Global Witness que analisou a lista de participantes na conferência que está a decorrer em Glasgow, na Escócia. A ONG internacional avança ainda que estão representadas mais de cem empresas e 30 associações deste setor.
"Se o lobby dos combustíveis fosseis fosse a delegação de um país seria a maior de todas", escreve a organização. A indústria tem mais 24 representantes do que o Brasil, o país com mais delegados (479) entre os cerca de 40 mil presentes.
Por outro lado, "o lobby dos combustíveis fósseis na COP é maior do que o total combinado das oito delegações dos países mais afetados pelas alterações climáticas nas últimas duas décadas - Porto Rico, Myanmar, Haiti, Filipinas, Moçambique, Bahamas, Bangladesh e Paquistão".
A ONG acrescenta que muitos destes países mais afetados "têm criticado o acesso desigual à COP26, referindo barreiras à participação, entre os quais o apartheid na vacinação, as dispendiosas restrições às viagens e a falta de garantias salvaguardadas".
Além destes 503 participantes, 27 delegações oficiais de países incluem participantes com ligações a este lobby. No total estão representadas mais de cem empresas e 30 associações do setor.
"A COP26 tem sido vendida como o lugar para aumentar a ambição [nas metas climáticas], mas está invadida de lobbyistas dos combustíveis fósseis cujo único objectivo é manter-se no negócio", critica Pascoe Sabido. Para o investigador não faz sentido empresas como a BP ou a Shell estarem nestas conferências quando "admitem abertamente que vão aumentar a produção de gás fóssil". "Se estamos a falar a sério sobre aumentar a ambição, estes lobbyistas têm de ser excluídos das conversações."
A posição é corroborada pelo ativista Murray Worthy, também ligado à análise da Global Witness, para quem a "presença de centenas daqueles que estão a ser pagos para promover interesses tóxicos das empresas poluidoras só vai aumentar o cepticismo dos ativistas climáticos que vêem nestas conversações prova de que os líderes globais estão a hesitar e a atrasar." E acrescenta: "A escala do desafio que temos pela frente significa que não temos tempo para ser distraídos por promessas corporativas de greenwashing e sem significado que não correspondem à prática. É tempo dos políticos mostrarem que estão a falar a sério sobre acabar com a influência dos grandes poluidores nos processos políticos de tomada de decisão e assumirem o compromisso com um futuro onde especialistas e ativistas têm o palco principal".
Por este motivo, os ativistas defendem a necessidade de estabelecer regras quanto aos conflitos de interesses dos participantes nas negociações da ONU sobre o clima. Alguns ativistas dão o exemplo do tabaco, cuja proibição só começou a ser levada a sério quando os lobbyistas foram excluídos das conferências da OMS.
Em resposta os lobbyistas defendem a sua presença. À BBC, um porta-voz da International Emissions Trading Association (que tem uma delegação de 103 pessoas ligadas a vários setores, incluindo três das quais com ligação à BP) defende que há um processo de transição em curso e que o seu objetivo é encontrar as formas mais eficientes de reduzir emissões, embora admita que a associação "serve os interesses das empresas de combustíveis fósseis".
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