O grupo onde nos inserimos, os mamíferos, está também ele repleto de histórias de renascimentos. Hoje procurei agrupar casos grandes e pequenos, aqueles onde a vulnerabilidade não surpreende aos que nunca imaginamos poder desaparecer.
Voamos para longe da Europa, mas com uma intervenção fundamental dos europeus, para conhecer o percurso atribulado de um wallaby, um pequeno canguru, na sua longa viagem da abundância à extinção e, por fim, ao renascimento.
Em 1841, o ornitólogo inglês John Gould descrevia na sua monografia sobre a família Macropodidae (família dos cangurus) uma espécie de wallaby, o Onychogalea fraenata. Apesar de ser especialista em aves, aquando da sua estadia na Austrália para estudar a avifauna (onde entre centenas de aves descritas, mais de 300 eram novas para a ciência), Gould aproveitou para descrever outros animais, particularmente mamíferos.
Este pequeno macrópode – com cerca de 1 metro de comprimento, do qual metade é cauda, e entre 4 e 8 kg – faz parte de três espécies conhecidas que apresentam uma estrutura córnea, similar a uma unha, na ponta da cauda. Essa característica, juntamente com a linha branca em forma de freio no dorso, deram-lhe o nome comum de Bridle Nail-Tail Wallaby.
Desde a sua redescoberta que os estudos revelaram uma característica extremamente importante nesta espécie. O seu sistema imunitário aparenta ser bem mais resistente que o dos restantes marsupiais. De acordo com Lauren Young, imunologista de marsupiais da Central Queensland University, “estes wallabies parecem ser capazes de sobreviver a infecções parasíticas, vírus e diversas doenças mais rapidamente que outros marsupiais”.
Existem animais que criam no nosso imaginário a ideia de que são quase impossíveis de eliminar, associando normalmente a sua imagem à ideia de praga. Os ratos são sem dúvida um exemplo. Mas a verdade é que nem todos os pequenos roedores são tão resilientes assim.
Continuando na Austrália encontramos o Pseudomys novaehollandiae, um pequeno rato da família Muridae, a mesma onde se inserem a ratazana e o rato comuns nas nossas cidades.
A sua descrição foi feita por George Robert Waterhouse, um entomologista inglês que publicou em 1846-48 dois volumes sobre a história natural dos mamíferos, incidindo sobre os marsupiais e os roedores. O nome que lhe atribuiu deriva da designação de Nova Holanda que era dada pelos europeus à Austrália, nome que permaneceu corrente até meados de 1850.
Com apenas 6,5 a 9 cm de comprimento corporal e 8 a 10,5 cm de comprimento da cauda (sempre entre 10 e 15% maior que o corpo), este pequeno rato não mais foi visto. Até que em 1967, Geoff Spencer, funcionário do Serviço de Parques e Vida Selvagem de Nova Gales do Sul capturou um indivíduo no Parque Nacional de Ku-ring-Gai Chase, a Norte de Sidney.
O seu pequeno porte e o facto de ser nocturno não justificam totalmente a sua ausência por mais de 100 anos. De facto, este ratinho apresenta problemas a nível populacional, e estima-se que a sua população possa continuar a decair ao longo da próxima década.
Alimentando-se de sementes, folhas, fungos e alguns invertebrados, a sua alimentação depende muito dos padrões de pluviosidade anuais. Além disso a sua reprodução depende da disponibilidade de alimento. Na primeira reprodução as fêmeas só dão à luz uma cria, aumentando depois até um máximo de seis. Actualmente nenhuma população excede os 1.000 indivíduos.
A Austrália é rica em histórias de renascimento de mamíferos. A estes dois poderiam juntar-se mais algumas espécies. Gymnobelideus leadbeateri, que esteve mais de meio século desaparecido; Zyzomys pedunculatus, que foi considerado extinto por duas vezes (1990 e 1994) e reencontrado em 2001, com confirmação em 2013; Petaurus gracilis, perdido para a ciência desde 1883 a 1989; ou ainda o pequeno Potorous gilbertii – marsupial que se alimenta exclusivamente de fungos, o que não é coisa comum – que, depois de mais de um século desaparecido, acabou por ser reencontrado em 1994. Mas há histórias um pouco por todo o lado…
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