| Caçador exibindo sem remorso o abate de coelhos bravos e de codorniz (Crex crex) |
Muitos caçadores têm comportamentos desviantes, exibindo friamente os troféus da caça.
Quando a caça prejudica a natureza
1. Redução de populações e perda de espécies
Quando a caça é intensa ou mal regulada, pode levar a quedas drásticas nas populações animais. Em Portugal, o coelho-bravo é um exemplo clássico. Esta espécie, fundamental para o ecossistema mediterrânico, sofreu fortes declínios devido à caça excessiva e a doenças como a mixomatose. A redução dos coelhos afetou predadores como o lince-ibérico e a águia-imperial-ibérica, mostrando que um desequilíbrio numa espécie pode ter efeitos em toda a cadeia alimentar.
2. Desequilíbrios nos ecossistemas
A caça excessiva de certas espécies altera a dinâmica natural. Por exemplo, a escassez de predadores deixou alguns herbívoros, como javalis e veados, aumentarem muito em número. Este crescimento pode causar danos às florestas, prejudicar a regeneração das árvores e até provocar acidentes rodoviários.
Em resumo: menos predadores → mais herbívoros → vegetação prejudicada → impacto no ecossistema.
3. Seleção artificial
Quando caçam sempre os maiores ou com melhores troféus, estamos a “selecionar” a população de forma artificial. Em veados e corços, por exemplo, isso pode reduzir o tamanho das hastes ao longo do tempo, alterando a diversidade genética e as características naturais da espécie.
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| Dois caçadores furtivos exibindo como troféus o abate de codornizão (Crex egregia) |
Dois parentes discretos dos campos: o cordonizão africano e o codornizão-europeu
Quando pensamos em aves agrícolas, raramente imaginamos espécies quase invisíveis, que vivem escondidas na vegetação e anunciam a sua presença mais pelo som do que pela visão. É o caso do codornizão (Crex egregia) e da codorniz (Crex crex), duas aves aparentadas que desempenham papéis ecológicos importantes em continentes diferentes.
Apesar de pertencerem ao mesmo género, estas espécies revelam como a biodiversidade responde de forma distinta aos usos da terra em África e na Europa.
Vidas paralelas em paisagens herbáceas
O cordonizão, típico da África subsaariana, habita pradarias húmidas, savanas e campos agrícolas tradicionais. A sua presença está intimamente ligada a áreas com vegetação herbácea densa, especialmente durante a estação das chuvas, quando encontra alimento e locais de nidificação.
Já o codornizão-europeu é um visitante de verão na Europa. Reproduz-se em prados de feno, pastagens extensivas e searas tradicionais, migrando para África no inverno. Extremamente discreto, é mais facilmente detetado pelo seu canto noturno repetitivo — o famoso “crex-crex” — do que pela observação direta.
Pequenos insetívoros, grandes reguladores
Ambas as espécies alimentam-se sobretudo de insetos e outros invertebrados, prestando um serviço ecossistémico essencial: o controlo biológico natural. Ao reduzirem populações de insetos herbívoros, contribuem para o equilíbrio dos agroecossistemas e diminuem a dependência de pesticidas.
Além disso, fazem parte das cadeias tróficas, servindo de alimento a aves de rapina e pequenos carnívoros, ajudando a manter a estabilidade ecológica das paisagens agrícolas e naturais.
Indicadores silenciosos da qualidade da paisagem
Tanto o cordonizão como o codornizão-europeu funcionam como espécies indicadoras. A sua presença sugere:
- Baixa intensificação agrícola
- Estrutura vegetal diversificada
- Práticas tradicionais compatíveis com a biodiversidade
No entanto, é na Europa que este papel ganha maior visibilidade. O codornizão-europeu tornou-se um verdadeiro símbolo da conservação dos prados agrícolas, sendo frequentemente usado como espécie-bandeira em programas agroambientais e na Rede Natura 2000.
Destinos diferentes, desafios comuns
Apesar de ambos estarem atualmente classificados como Pouco Preocupantes à escala global, enfrentam ameaças semelhantes:
- Intensificação agrícola
- Uso de pesticidas
- Perda de habitats herbáceos
No caso europeu, a ceifa mecanizada precoce representa uma das principais causas de mortalidade do codornizão, afetando diretamente o sucesso reprodutor. Em África, a conversão de pradarias naturais em agricultura intensiva pode comprometer as populações de cordonizão.
Conservar aves é conservar paisagens
A comparação entre Crex egregia e Crex crex mostra que proteger estas aves não é apenas uma questão de espécies, mas de modelos de uso do território. Onde subsistem práticas agrícolas extensivas e mosaicos de habitats, estas aves continuam a cumprir os seus serviços ecossistémicos de forma silenciosa, mas essencial.
Conservar o cordonizão e o codornizão-europeu é, em última análise, conservar paisagens vivas, produtivas e biodiversas — em África e na Europa.
Predadores ou eco-delinquentes
- Exploração deliberada da fauna sem consideração ecológica
- Indivíduos que causam dano ambiental intencional e recorrente
- O indivíduo justifica o acto ilegal (“é tradição”, “o Estado não protege”, “os animais são meus recursos”)
- Reduz a percepção de culpa
Referências bibliográficas
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- del Hoyo, J. et al. (2014). Handbook of the Birds of the World Alive. Lynx Edicions.
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- Cabral, M. J. et al. (2005). Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal. Instituto da Conservação da Natureza.
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- ICNF (vários anos). Relatórios de gestão cinegética e conservação da fauna.
- Krebs, C. J. (2009). Ecology: The experimental analysis of distribution and abundance. Pearson.
- Primack, R. B. (2014). Essentials of Conservation Biology. Sinauer Associates.

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