quinta-feira, 24 de março de 2022

Suicídio- a dor dos que ficam


Hoje a crónica é sobre o suicídio e dos suicidas ao longo da minha vida.
O primeiro, estávamos em 1976. A casa Dias era a drogaria de sucesso na aldeia: venenos para os caracóis? Casa Dias. Sulfatar as vinhas? Casa Dias. Veneno para o escaravelho da batata? Casa Dias. Adubos para os campos? Casa Dias. A Casa Dias também vendia utensílios para a agricultura e carpintaria, mas quando lá chegávamos o cheiro a pesticidas e químicos era intenso, apesar da grande porta da drogaria estar sempre aberta. Os Dias tinham dois filhos: o António, de 23 anos, que já estava terminar o curso de Engenharia e o Pedro de 17, que estava estudar no Alexandre Herculano. O Pedro gostava muito de mim. Quando entrávamos no autocarro, queria sempre que eu me sentasse à beira dele. Falava-ma das frequentes e violentas discussões com o seu pai por causa da Política. O Pai era do CDS e ele era do PCP. Também se queixava que o Pai era avarento. Podia pagar o táxi ou levá-lo à noite para festas dos seus amigos e não lhe dava dinheiro. A aldeia era muito isolada sobretudo devido aos horários da carreira para o Porto: não havia mais camionetas a partir das 8 da noite. Havia no Pedro, uma loucura: dizia-me que quando terminasse o curso de Engenharia, partiria para o México e fundar uma comuna. Num sábado a aldeia foi sacudida: O Pedro suicidou-se, com veneno dos ratos. Fiquei muito triste e com saudades dele.
A vida longa da minha mãe foi marcada também por tragédias. Além de sofrer com a morte dos seus dois filhos, que a abalaram imenso, ela tinha onze irmãos. Um perdeu-o ainda muito nova, quando ele tinha 22 anos e morreu afogado num acidente do navio pesqueiro. Mais tarde, conheci o Carlos. Deixou dois filhos órfãos. Não compreendemos porque se matou. Era um tipo muito calmo, seguro. Aparentava.
Mas não contava que o suicídio estourasse nas minhas mãos. A minha esposa suicidou-se vai fazer a 4 de Maio, 6 anos. Apesar de várias terapias, as saudades são imensas. Fomos felizes 20 anos. O último ano é para esquecer e perdoar. A Teresa era muito doente: hipotiroidismo, diabetes, via mal ao perto e ao longe, era bipolar e hipertensa. Sofreu muito sobretudo no último ano de vida. No mês de Abril de 2016, eu e o meu filho revezámo-nos à noite, porque ela só pensava em se matar. Agora tenho que aceitar a sua escolha, o que ainda é muito difícil.

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