terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Investigadores da U.Porto alertam para extinção "silenciosa" do gato-bravo



Existem fortes indícios que as populações de gato-bravo no sul da Península Ibérica estejam em declínio e necessitem de medidas de conservação. Esta preocupação foi o que levou os investigadores do Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos (CIBIO-InBIO/BIOPOLIS), Paulo Célio Alves – também docente da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP) – e Pedro Monterroso – alumnus da FCUP – a convidar investigadores europeus a visitar a região de Mértola, em Portugal, para o 4º Encontro do consórcio Europeu sobre gato-bravo (Eurowildcat Meeting), que decorreu entre os dias 24 e 26 de novembro.

“Temos feito um enorme esforço na reintrodução do lince-ibérico, mas também é importante alertar para a conservação do gato-bravo”, explica Paulo Célio Alves, que desenvolve a investigação sobre esta espécie na Península Ibérica.

E é precisamente o Alentejo, uma das regiões portuguesas em que a situação populacional levanta maior preocupação, a par do Algarve, Beira Interior, Ribatejo e Beira Litoral. Os principais responsáveis pelo declínio da população desta espécie são a falta de habitat para o gato-bravo, a falta de presas — coelhos e pequenos mamíferos — e também a hibridação com o gato doméstico.

“O facto de existirem cada vez menos gatos-bravos aumenta a probabilidade da hibridação com os gatos domésticos, e consequentemente a uma perda das características genéticas das populações endémicas do gato-bravo da Península Ibérica”, salienta o professor do Departamento de Biologia da FCUP. Como o gato doméstico descende do gato-africano e não do gato-bravo, ao haver cruzamento entre estas duas espécies, há uma alteração das suas características genéticas. Em Portugal, concretiza Paulo Célio Alves, “a taxa de hibridação já vai em 21%”.

Na verdade, a extinção do gato-bravo é “silenciosa” porque cada vez mais o gato doméstico se confunde com o gato-bravo. “Temos gatos domésticos (e híbridos) em áreas supostamente de gato-bravo e por estes apresentarem características externas parecidas às de gato-bravo, o que nos «ilude» com um cenário de conservação aparentemente favorável. Por outro lado, a extinção também é silenciosa por ninguém falar dela. Mas isso é transversal a muitas outras espécies da nossa fauna, que não têm visibilidade pública”, explica, por sua vez, Pedro Monterroso, que, desde 2017, integra o grupo de especialistas em felinos (Cat Specialist Group) da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).

Atualmente, as populações mais saudáveis de gato-bravo da Península Ibérica vivem no Norte de Espanha. Nos últimos anos, têm sido conduzidos estudos populacionais através da captura e marcação de exemplares, bem como através de métodos de amostragem não invasivos como a armadilhagem fotográfica, a procura e análise molecular de excrementos ou de pelos (os últimos recolhidos através de “armadilhas” especificamente desenhadas para o efeito).

O “B.I” do gato-bravo

Como distinguimos o gato doméstico do gato-bravo (Felis silvestris)? “Distinguem-se pelo seu tamanho, pelos padrões de pelagem e pela sua cauda mais grossa com três a cinco anéis negros e uma ponta escura e arredondada”, descreve Paulo Célio Alves.

O docente da FCUP, que trabalha há praticamente 20 anos no estudo desta espécie, e que tem vindo a orientar várias teses de doutoramento e mestrado focadas no gato-bravo, alerta para a importância de se tomarem medidas de conservação. O que podemos fazer, no imediato, para ajudar a preservar esta espécie? “Além de se recuperar os habitats e as presas, é importante sensibilizar as populações para esterilizarem os gatos domésticos, sobretudo se andarem no exterior das habitações, para prevenir cruzamentos com o gato bravo”, alerta.

O 4.º Encontro Europeu do consórcio Eurowildcat contou também com a organização integrada no projeto da Estação Biológica de Mértola, que conta com a participação do CIBIO-InBIO e da FCUP.

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