Vi ontem a entrevista do Almirante Gouveia e Melo a Sandra Felgueiras.
Coincidiu com o término da leitura de um livro notável do jornalista Licínio Lima : “Senhora da República: Num altar em Fátima erguido pela Maçonaria” (Marcador, 2017).
Numa passagem, lê-se:
“(...) Salazar e Fátima – gerados na responsabilidade da primeira República e amamentados por um povo que desesperadamente gritava por uma mudança de rumo... Povo que fez erguer na Cova de Iria um memorial para que os erros não se repitam (...)” (p. 257)
108 anos depois, repetimos o padrão.
Aclamamos hoje novos ungidos: Ventura, Gouveia e Melo ou qualquer outro que se apresente como salvador. Continuamos a projetar nos líderes a solução mágica para problemas que exigem exercício activo de cidadania, participação cívica informada e conhecedora.
Segundo o Inquérito às Competências dos Adultos (OCDE, 2023):
• 42% dos portugueses têm literacia nível 1 ou abaixo (OCDE: 26%);
• 40% com numeracia fraca;
• 42% sem capacidade para resolver problemas adaptativos;
• Apenas 4% atinge os níveis mais altos de literacia (OCDE: 12%).
Um povo sem literacia, numeracia ou autonomia cognitiva não escolhe: acriticamente adere.
Aderimos ao ruído, ao que promete ordem, ao que mais vocifera, mesmo se isso nos custar o bem mais precioso: a Liberdade.
A tese de Cristiana Filipa Freitas Pinheiro (2023) confirma:
• Aceitamos hierarquias sem crítica (elevada distância ao poder);
• Evitamos o novo (aversão à incerteza);
• Somos pouco autónomos (baixo individualismo).
Um estudo intercultural (Brueck & Kainzbauer) feito a partir da perspetiva espanhola reforça esta imagem:
• Forte formalismo e hierarquização;
• Tradição e lentidão na mudança;
• Soluções de última hora;
• Obsessão pelo “chefe”;
• Medo da autonomia e da crítica.
Temos um país preparado para o aplauso, mas não para o escrutínio.Para a fé, mas não para a dúvida.
Para mártires e heróis, mas não para cidadãos informados.
Em 1917, Domingos Pinto Coelho advertia (op. cit.):
“Simplesmente é necessário, em assunto de tanta monta, não ceder ao quod volumus facile credimus (aquilo que desejamos, acreditamos com facilidade).” (p. 187)
Hoje, como ontem, acomodamo-nos e confundimos promessas populistas e/ou autoritárias com Verdade, com nobres propósitos e promessas em prol do colectivo.
A História não redime quem a ignora.
Estejam atentos, rogo-Vos, a este poderoso alerta contra o messianismo político e a crença cega em soluções fáceis
Os erros, os que se repetem, os nossos, no fim pagam-se sempre muito caro!
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