sábado, 9 de janeiro de 2021

Aumento da procura de carne intensifica desmatamento na Amazónia

Segundo um relatório elaborado na Alemanha, a carne de bovino é uma das principais causas de desmatamento. Para além das pastagens, tem um impacto ambiental negativo ao aumentar a procura de soja e por essa via o uso de agrotóxicos.



O “Atlas da Carne 2021” foi apresentado esta quarta-feira em Berlim. Trata-se de um relatório co-produzido pela edição alemã do Le Monde Diplomatique, pela associação ambientalista Bund e pela Fundação Heinrich-Böll que tem ligações ao Partido Verde alemão. Entre as suas conclusões, apresentadas pela Deutsche Welle, está a ligação entre o crescimento do consumo de carne e o desmatamento em alguns países da América do Sul, nomeadamente o Brasil.

O documento é taxativo: “A carne bovina é hoje um dos principais impulsionadores de desmatamento. Isso leva à destruição dos meios de subsistência de comunidades indígenas e de pequenos proprietários. Na Amazónia, o gado pasta em 63% de todas as áreas desmatadas. Entre 70% e 80% de todas as importações de carne bovina da UE vêm dos países do Mercosul. E 50% dos produtos agrícolas enviados à União Europeia (UE) vindos do Brasil são produto do desmatamento, especialmente soja, carne bovina e café".

Com o crescimento do consumo, há um aumento das terras utilizadas para a produção de carne. 71% das terras aráveis a nível mundial são já ocupadas com a produção de ração, contrastando com apenas 18% usadas diretamente para produção de alimentos. E a floresta está a ser desmatada para satisfazer esta procura. Cada vez mais é ocupada pela soja, utilizada para fazer ração. Estima-se que 90% da soja produzida seja para alimentação animal. É um mercado no qual se destaca o Brasil, o maior produtor mundial e exportador de soja, os EUA e a Argentina.

Amazónia e Cerrado brasileiros estão assim sob pressão. Entre 2006 e 2017, 220 mil quilómetros quadrados de floresta foram destruídos nestas regiões. E depois de, em 2006, se ter decidido uma moratória ao comércio de soja em áreas desmatadas recentemente na Amazónia, acordo que reduziu em 80% o desmatamento nessa floresta, é o Cerrado que tem vindo a perder: “a produção da soja foi transferida para o Cerrado", diz o relatório.

Nos anos recentes, segundo o mesmo documento, houve retrocessos, pois “a política do presidente Jair Bolsonaro está continuamente a relaxar as regras para proteção ambiental". Culpa também dos incêndios florestais "que foram sobretudo resultado de queimadas – entre outras, para plantações de soja".

Barbara Unmüssig, presidente da Fundação Heinrich Böll, sintetiza os problemas em declarações à DW: “a produção industrial de carne não é apenas responsável pela precariedade das condições de trabalho, mas também afasta as pessoas das suas terras, provoca o desmatamento, o uso de pesticidas e a perda de biodiversidade – e é uma das principais causas da crise climática".

No relatório acusam-se ainda grandes exportadores de químicos, como a Bayer Crop Science, a Basf, a Syngenta, a Corteva e a FMS, de exportação de agrotóxicos perigosos e até proibidos para alimentação animal. Mais uma vez, o Brasil surge no topo da lista de importadores de pesticidas. É o segundo classificado com cerca de 230 mil toneladas por ano, seguido pela Argentina com 161 mil toneladas. Acima, só os EUA, com 250 mil toneladas. O trio contabiliza 70% do consumo de herbicidas.

Para além do mais, identificam-se outras questões de saúde: a aplicação de antibióticos à criação de animais está a aumentar a resistência dos germes e, assim, a ameaçar a sua eficácia nos humanos. E o desmatamento faz com que mais animais selvagens contactem com humanos, levando à transmissão de novos vírus.

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