A 5 de Novembro de 2021, e depois de um processo de ampla concertação, a Assembleia da República aprovou por larga maioria a Lei de Bases do Clima. Com a sua entrada em vigor, entre outras prioridades em matéria de política do clima, o Estado fica obrigado a promover a mobilidade activa para garantir o direito ao equilíbrio climático legalmente consagrado, respondendo por perdas e danos que as suas acções ou omissões, directas ou indirectas, causem.
É a primeira vez que uma lei em Portugal atribui ao Estado (administração direta, indireta, regional e local) a obrigação de promover os modos activos de deslocação (pedonal e bicicleta). Trata-se de uma conquista da MUBi e de todas as outras organizações e pessoas que têm vindo a apelar a que o Estado aja de forma decisiva para mudar o paradigma da mobilidade urbana em Portugal. Congratulamo-nos por várias das medidas que há muito defendemos, e que temos apresentado aos Grupos Parlamentares na Assembleia da República e também enviámos num contributo na fase de discussão pública, passarem agora a estar consagradas na legislação portuguesa.
No domínio da mobilidade activa, a lei especifica mesmo áreas de particular responsabilidade onde os vários níveis da administração do Estado deverão agir, nomeadamente: a implementação de estratégias de âmbito nacional, regional e local de mobilidade pedonal e em bicicleta; o desenvolvimento da intermodalidade dos transportes públicos com o uso da bicicleta; incentivos à aquisição e utilização da bicicleta; a oferta de sistemas públicos de bicicletas partilhadas e; a criação de redes cicláveis seguras.
A lei determina, ainda, que as autarquias desenvolvam planos de mobilidade urbana sustentável (PMUS) e que aprovem, no prazo de 24 meses, planos municipais de acção climática. Igualmente dentro do espaço de dois anos, o Governo deverá aprovar um plano de mitigação para o sector dos transportes em Portugal, cujas emissões têm vindo a aumentar continuamente há uma década. No âmbito da política energética nacional, a lei indica que os modos activos de transporte sejam uma das formas privilegiadas na descarbonização da mobilidade.
Também a Comissão Europeia, através do novo Quadro Europeu para a Mobilidade Urbana, alinhado com os objectivos do Pacto Ecológico Europeu, quer que a nível nacional e local seja dada uma clara prioridade aos modos activos e transportes públicos, assim como aos sistemas de mobilidade partilhada. Entre outras medidas, propõe que o financiamento da União Europeia na área da mobilidade e transportes seja preferencialmente direccionado para cidades que tenham planos de mobilidade urbana sustentável (PMUS), e insta os Estados Membros a criar programas nacionais para ajudar as cidades e regiões a desenvolver e implementar estes planos. O regulamento da rede transeuropeia de transportes (RTE-T) vai mesmo mais longe, ao exigir que os nós urbanos da RTE-T, que em Portugal incluem as duas áreas metropolitanas e 11 outras cidades, tenham PMUS implementados até 2025.
Estes dois instrumentos – a Lei de Bases do Clima e o Quadro Europeu para a Mobilidade Urbana – serão nos próximos anos necessariamente pilares basilares nas políticas para a mobilidade urbana, ao nível das responsabilidades das administrações central, regionais e locais. É fundamental que sejam já tidos em conta, na sua plenitude, no Acordo de Parceria – Portugal 2030, em negociação com a Comissão Europeia, e nos subsequentes programas operacionais para a aplicação dos fundos comunitários.
O combate às alterações climáticas é um dos grandes desafios da humanidade. Alcançar as metas de redução de emissões nesta década no sector dos transportes requer uma significativa redução do número de carros em circulação e da sua utilização, principalmente nas cidades. Apoiar e estimular o uso dos modos activos, incluindo a bicicleta, é uma das formas mais rápidas e eficientes de contribuir para este objectivo, com numerosos outros benefícios ao nível da saúde pública e qualidade de vida urbana.
Rui Igreja, dirigente da MUBi, realça que “em matéria de mobilidade, a Lei de Bases do Clima, e também as directivas europeias, vêm conferir ao Estado (administração directa, indirecta, regional e local) deveres e obrigações de promover a transição do transporte motorizado individual poluente e propenso a congestionamentos para modos mais ecológicos e sustentáveis, como os modos activos e o transporte público”. Acrescenta que “os cidadãos passarão a poder accionar judicialmente o Estado pelo não cumprimento dos deveres a que está obrigado, nos termos desta e de outra legislação em matéria climática, e por adopção de políticas que causem dano e contribuam para a aceleração das alterações climáticas”.
Fonte: Lisboa Para as Pessoas, 1 de Fevereiro, 2022
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