quinta-feira, 24 de abril de 2025

Smartphones na escola: entre o vício e a inteligência



Por José Afonso Baptista
Durante décadas, a escola foi vista como um espaço protegido — lugar de concentração, convivência e construção de conhecimento. Hoje, esse refúgio está ameaçado por um pequeno objeto que habita discretamente os bolsos dos alunos: o smartphone.
O documentário britânico Swiped: The School That Banned Smartphones retrata uma realidade inquietante: jovens que recebem milhares de notificações diárias, dormem mal, sentem ansiedade, isolam-se e perdem o foco. Quando afastados dos aparelhos por três semanas, melhoram o sono, comunicam mais e sentem-se emocionalmente mais estáveis. A escola transforma-se. E os alunos também.
Esta transformação evoca as grandes epidemias da história, da peste negra à toxicodependência. A dependência digital é a nova peste: invisível, socialmente aceite, mas profundamente desequilibrante. Como em La Peste, de Camus, há quem negue, relativize ou se conforme. Mas há também quem enfrente, não com o interdito, mas com inteligência.
A interdição total, agora proposta em vários países, é tentadora. Mas proibir não é educar. Impedir o uso de uma ferramenta não ensina a usá-la bem. A escola deve, sim, estabelecer regras, mas por via do diálogo, da negociação e da criação de contextos de uso responsável. Proibir é mais fácil do que educar — mas também é mais pobre.
Primeiro argumento: se proíbo, não ensino. A escola deve formar para o uso crítico e consciente da tecnologia, ensinar a resistir à dispersão e a valorizar o silêncio e a atenção.
Segundo: eliminar os telemóveis é afastar um recurso poderoso. São biblioteca, caderno, lupa, gravador e muito mais. Integrados de forma criativa e pedagógica, enriquecem a aprendizagem.
Terceiro: a proibição nega autonomia ao aluno. Educar é ajudar a escolher, não a fugir das escolhas. Literacia digital inclui saber usar, regular e avaliar criticamente os meios tecnológicos.
Quarto: proibir alimenta a desconfiança. Uma escola que regula tudo por decreto diz, sem dizer: “não confiamos em vós”. A boa educação exige confiança - nos alunos, nos professores e nas famílias.
A solução não está na fuga, mas na formação. Ambientes regulados, com momentos definidos para o uso e para a pausa, são essenciais. Projetos colaborativos, trabalho por problemas, uso de plataformas digitais para monitorizar a participação e promover a autonomia, tudo isto é mais eficaz do que o interdito.
O smartphone não é apenas um aparelho: é a porta de entrada para o mundo digital e o corpo que acolhe a alma da inteligência artificial. Retirá-lo sem mais é como ter uma fonte de água pura e não poder matar a sede. A escola do futuro não se faz contra a tecnologia, mas com ela, de forma crítica, ética e criativa. É esse o desafio. E é esse o nosso dever.

Sem comentários: