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sexta-feira, 31 de julho de 2020

O carvão e a economia circular

Por Filipe Duarte Santos
A motivação para a economia circular é de natureza ecológica mas também económica, dado que, sendo a procura de recursos naturais renováveis e não renováveis cada vez maior, o aumento do seu custo tende a dificultar o crescimento económico.

Os primeiros registos do uso do carvão encontram-se na China e datam de 4000 anos a.C. O filósofo grego Teofrasto, sucessor de Aristóteles, refere no seu livro Sobre as Pedras o carvão mineral como pedra que arde tal como o carvão vegetal. Mais tarde, o carvão acabou por desempenhar um papel central na civilização emergente da Revolução Industrial. A Grã-Bretanha, sendo muito rica em carvão, usava-o desde a Idade do Bronze, e especialmente durante a colonização romana, como combustível e para a fundição de metais. A partir do século XIII, os depósitos superficiais esgotaram-se e foi necessário explorá-lo em minas. Porém, as minas de carvão e estanho tinham o problema de acumularem água, impossibilitando a extracção dos minérios. Em 1712, Thomas Newcomen, um ferreiro inglês, inspirado na máquina a vapor rudimentar de Thomas Savery e na máquina a vapor com pistão muito mais evoluída do físico francês Denis Papin, construiu uma para ser utilizada nas minas. Finalmente, em 1776, James Watt, um técnico de laboratório da Universidade de Glasgow, em colaboração com Matthew Boulton, conseguiu melhorar muito o modelo de Newcomen e comercializar a nova máquina, contribuindo de forma decisiva para o avanço da Revolução Industrial.

A partir dessa época, o carvão teve uma história de grande sucesso. Em 1800, as duas únicas fontes primárias de energia à escala global (para além da muito pequena contribuição da força motriz da água nos moinhos de água e dos moinhos de vento e barcos à vela) eram o carvão, com 1,7% do total, e a biomassa, com 98,3%, principalmente sob a forma de lenha. Em 1900, o carvão representava 47% do total das fontes primárias globais de energia, e surgia o petróleo com 1,5%, o gás natural com 0,53%, a hidroelectricidade com 0,14%, sendo o restante a biomassa tradicional (Smil, 2017). No princípio da década de 1960, o petróleo ultrapassou o carvão, e de 1971 a 2015 os combustíveis fósseis asseguraram entre 78,7% e 84,8% do consumo global de energia (World Bank, 2020). Para além destes sucessos notáveis, importa recordar que as centrais térmicas a carvão têm externalidades negativas sobre a saúde humana e o ambiente ao emitirem material particulado, dióxido de enxofre, óxidos de azoto, crómio, arsénio e gases com efeito de estufa, especialmente o dióxido de carbono (CO2). Em 2008, a Organização Mundial da Saúde advertiu que as emissões provenientes das centrais a carvão provocam um excesso global de mortalidade estimado em cerca de um milhão de pessoas por ano.

Desde as publicações do químico sueco Svante Arrhenius, nos finais do século XIX, sabe-se de forma quantificada que o CO2 emitido na combustão dos combustíveis fósseis, por ser um gás com efeito de estufa, causa uma alteração do clima global que se traduz por um aumento da temperatura média da atmosfera à superfície, para além de outros efeitos. As emissões de CO2 variam com o tipo de combustível fóssil e as condições em que se faz a sua combustão. O carvão é o que mais emite com um valor médio próximo de 1000 g de CO2 equivalente por cada kWh gerado, podendo atingir valores superiores a 1500 g. Segue-se o petróleo, com um valor médio próximo de 760 g de CO2 equivalente por cada kWh gerado, e, por fim, o gás natural com um valor médio mais baixo próximo de 490 g. Será necessário diminuir drasticamente o uso mundial do carvão para haver alguma esperança de cumprir o Acordo de Paris.

Surge a pandemia de covid-19 e há tendências que se intensificam. Com a gravíssima crise de saúde, social e económica, que está a afectar sobretudo os países mais pobres e frágeis, o consumo de energia eléctrica baixou e nas economias avançadas o uso do carvão deixou de ser competitivo face às energias renováveis e ao gás natural. As importações de carvão para a UE diminuíram nos últimos meses cerca de dois terços. Nos EUA, a percentagem de uso de carvão na geração de energia eléctrica poderá chegar a um mínimo de 10%. Em 2017, o Governo português, com o objectivo de atingir a neutralidade carbónica em 2050, decidiu encerrar as centrais termoeléctricas a carvão, em Sines e no Pego, até 2030. Porém, a quebra no uso do carvão começou a dar-se muito mais cedo quando o consumo passou de 4,5 milhões de toneladas em 2018 para 2,09 milhões em 2019. Devido à queda de rentabilidade, a EDP adiantou a data de fecho de Sines para 2023. Com a crise da covid-19, a EDP surpreendeu o Governo ao anunciar em 14 de Julho o encerramento da central de Sines em Janeiro de 2021 quando espera ter consumido o carvão que tem armazenado. É provável que o pico do consumo global do carvão tenha sido ultrapassado, o que são boas notícias para a saúde humana e para o clima. Será que a tendência de fuga ao carvão se vai manter? É provável, mas longe de estar garantido porque as economias emergentes, especialmente a China e a Índia, registam um enorme aumento da procura de energia e o carvão é ainda abundante e economicamente acessível.

O que tem o carvão que ver com o conceito de economia circular, com origem nas ideias desenvolvidas em 1976 pelo arquitecto suíço Walter Stahel? A ideia fundamental é adoptar uma economia baseada em processos cíclicos “do berço ao berço” em lugar de processos lineares de extracção, produção e descarte, ou seja, “do berço ao túmulo”. A motivação para a economia circular é de natureza ecológica mas também económica, dado que, sendo a procura de recursos naturais renováveis e não renováveis cada vez maior, o aumento do seu custo tende a dificultar o crescimento económico. É pois necessário reduzir, reciclar e reutilizar. Afinal é aquilo que faz a biosfera com grande mestria ao desconhecer os conceitos de descarte e lixo. O seu metabolismo recicla todos os dejectos e todos os organismos que morrem. Ao beneficiar de cerca de 4000 milhões de anos de evolução, os processos de reciclagem da biosfera tornaram-se extremamente eficientes. Mas como em tudo na vida, houve falhas que originaram impasses.

Uma delas deu-se no Carbonífero, que ocorreu no período de há 358,9 a 298,9 milhões de anos, quando as plantas, cuja origem se encontra nas algas marinhas, desenvolveram a capacidade de colonizar e dominar a terra firme. Para tal foi necessário protegerem-se das radiações ultravioletas solares e adquirirem uma rigidez estrutural robusta para contrariar a gravidade e assim conquistar a dimensão vertical. Foi assim que a evolução das plantas sintetizou alguns polímeros, tais como, lignina (do latim lignum para madeira), suberina (associada ao sobreiro através do seu nome científico de Quercus suber) e cutina (componente da cutícula das plantas). As condições climáticas do Carbonífero nos trópicos permitiram a formação de extensas florestas em zonas húmidas, lacustres e lagunares. Muitas das árvores mortas ficaram submersas, dificultando a sua decomposição. Quando a lignina surgiu, não havia organismos capazes de a decompor, pelo que os troncos não sofreram decomposição e acabaram por ser cobertos por sedimentos, transformando-se em turfa, lenhite e carvões minerais mais ricos em carbono. Para sair do impasse, a evolução da biosfera levou dezenas de milhões de anos até produzir fungos lignolíticos capazes de digerir a madeira, processo também designado por podridão branca, castanha ou mole da madeira.

As consequências deste impasse na economia circular da biosfera foram muito significativas. As emissões de CO2 para a atmosfera diminuíram devido à menor decomposição da biomassa das árvores e, consequentemente, no Carbonífero a concentração de CO2 atingiu valores de cerca de 100 ppmv (partes por milhão em volume) (Feulner, 2017), quatro vezes inferior aos valores actuais (417,1 ppmv em Maio de 2020). Este decréscimo da concentração do CO2 provocou uma intensa época glacial no princípio do Pérmico. Outra consequência do impasse foi que as “florestas do carvão” do Carbónico eram de tal modo extensas e exuberantes que aumentaram a concentração do oxigénio molecular na atmosfera para cerca de 30% (50% mais do que o valor actual de 20,946%), gerando um impulso evolutivo, que conduziu ao surgimento de insectos e anfíbios gigantes, e a um provável aumento da biodiversidade global.

O carvão mineral que moldou a nossa civilização e mudou o clima global é afinal a história de uma falha no metabolismo da biosfera. Agora, a era do carvão dá sinais de terminar. A mesma história revela a incomensurável distância que separa o engenhoso e eficiente metabolismo da biosfera da rudimentar economia circular da tecnosfera.


Professor da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa


quinta-feira, 30 de julho de 2020

Conservação da natureza, biodiversidade, desenvolvimento sustentável e saúde

Por José Manuel Calheiros

quarta-feira, 29 de julho de 2020

Medicamento da Idade Média pode ser a chave para travar infeções bacterianas

Fonte: aqui


Uma investigação de uma universidade britânicos a antibióticos ancestrais revelou que um medicamento da era medieval pode ser a solução para tratar infeções modernas.

Em questão está um milenar remédio caseiro, chamado de ‘colírio de Bald’, à base de uma mistura entre cebolas, alho, vinho e sais biliares.

Durante o estudo dos efeitos deste medicamento no organismo, os investigadores da Universidade de Warwick descobriram que tem a capacidade de produzir atividade antibacterial. Ademais, a combinação de ingredientes mostrou causar danos reduzidos às células humanas.

A mescla funciona apenas, explicam os investigadores, porque “há um trabalho de equipa” entre os componentes. O alho, que contém alicina, é responsável por travar grupos bacteriais unicelulares, mas, sem os outros ingredientes, não é capaz de bloquear biofilmes - comunidades de bactérias resistentes a antibióticos.


A maioria dos antibióticos que usamos hoje são derivados de compostos naturais, mas esta descoberta destaca a necessidade de explorar não apenas compostos únicos, mas misturas de produtos naturais para o tratamento de infecções por biofilme”, afirma a Dra. Freya Harrison, da escola de medicina natural da Universidade de Warwick, sublinhando que este medicamento medieval poderá sugerir novos tratamentos para feridas infectadas, como úlceras diabéticas nos pés e pernas. 

O próprio ‘colírio de Bald’ já havia sido estudado pela Dra. Christina Lee em 2015 durante uma extensa investigação ao Medicinale Anglicum, um antigo manuscrito inglês que contém instruções sobre diversos tratamentos médicos.


O colírio de Bald sublinha a importância do tratamento médico ao longo dos tempos. Mostra como as pessoas no início da Inglaterra medieval tinham pelo menos alguns remédios eficazes”, afirma Lee, investigadora da Universidade de Nottingham.

O estudo, publicado esta terça-feira na revista Science, adianta ainda que é necessária mais investigação no âmbito da medicina europeia pré-moderna para determinar se estes resultados vão ser utilizados na criação de um cocktail de produtos naturais “candidatos a serem integrados em pomadas ou outro tipo de curativos”.

terça-feira, 28 de julho de 2020

Infográfico: The World’s Most Powerful Reserve Currencies

Fonte: aqui


The World’s Most Powerful Reserve Currencies

When we think of network effects, we’re usually thinking of them in the context of technology and Metcalfe’s Law.

Metcalfe’s Law states that the more users that a network has, the more valuable it is to those users. It’s a powerful idea that is exploited by companies like LinkedIn, Airbnb, or Uber — all companies that provide a more beneficial service as their networks gain more nodes.

But network effects don’t apply just to technology and related fields.

In the financial sector, for example, stock exchanges grow in utility when they have more buyers, sellers, and volume. Likewise, in international finance, a currency can become increasingly entrenched when it’s accepted, used, and trusted all over the world.

What’s a Reserve Currency?

Today’s visualization comes to us from HowMuch.net, and it breaks down foreign reserves held by countries — but what is a reserve currency, anyways?

In essence, reserve currencies (i.e. U.S. dollar, pound sterling, euro, etc.) are held on to by central banks for the following major reasons:
  • To maintain a stable exchange rate for the domestic currency
  • To ensure liquidity in the case of an economic or political crisis
  • To provide confidence to international buyers and foreign investors
  • To fulfill international obligations, such as paying down debt
  • To diversify central bank portfolios, reducing overall risk
Not surprisingly, central banks benefit the most from stockpiling widely-held reserve currencies such as the U.S. dollar or the euro.

Because these currencies are accepted almost everywhere, they provide third-parties with extra confidence and perceived liquidity. This is a network effect that snowballs from the growing use of a particular reserve currency over others.

Reserve Currencies Over Time

Over this timeframe, there have been small ups and downs in most reserve currencies.

Today, the U.S. dollar is the world’s most powerful reserve currency, making up over 61% of foreign reserves. The dollar gets an extensive network effect from its use abroad, and this translates into several advantages for the multi-trillion dollar U.S. economy.

The euro, yen, and pound sterling are the other mainstay reserve currencies, adding up to roughly 30% of foreign reserves.

Finally, the most peculiar data series above is “Other”, which grew from 2.0% to 8.4% of worldwide foreign reserves over the last 15 years. This bucket includes the Canadian dollar, the Australian dollar, the Swiss franc, and the Chinese renminbi.

Accepted Everywhere?

There have been rumblings in the media for decades now about the rise of the Chinese renminbi as a potential new challenger on the reserve currency front.

While there are still big structural problems that will prevent this from happening as fast as some may expect, the currency is still on the rise internationally.

What will the composition of global foreign reserves look like in another 15 years?

Saber mais:

sexta-feira, 24 de julho de 2020

Música do Bioterra: Bauhaus - Spirit


Tonight I could be with you
Or waiting in the wings
Lift your heart with soaring song
Cut down the puppet strings
Cut down the puppet strings

I wear a coat of drums
And dance upon your eyes
Turn the tables upside down
Change the lows to highs
Change the lows to highs

I fill you up with butterflies
Crown the heads of kings
Be glad of first night nerves
For fear gives courage wings
Fear gives courage wings

If I am on the sidelines
Chances are you'll miss
Wait alone and spotlit
For Doctor Theater's kiss

The stage becomes a ship in flames
I tie you to the mast
Throw your body overboard
The spotlight doesn't last
The spotlight doesn't last

I could be with you
Or waiting in the wings
Lift your heart with soaring song
Cut down the puppet strings
Cut down the puppet strings

I may tap you on the shoulder
And whisper "go" in red
Strip your feet of lead my friend
Strip your feet of lead

Call the curtain
Raise the roof
Spirits on tonight

We love our audience (repeat)


Música do BioTerra: Rui Reininho - Rota da Sede


Aqui se entra para o mundo
Se cumpre a Rota da Sede
Santiago espera lá ao fundo

À Luz de um farol amigo
Até a esse mural pintado
Sino do Balio antigo
Vai o Leça apressado

Sabe a Via Láctea
Sobe a Via Norte
Os mapas são passado
A Fábrica é uma forte
Sabe à Via Láctea

Santo Homem bem cheiroso
É memória do futuro
É um mel delicioso
Nas colmeias lado a lado
Sendo a alma do cruzado

Se puderes, olha e vê
Se puderes ver, repara

Pelas 13 horas do dia 22 de julho de 2020, no Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões, perante uma plateia restrita de 30 convidados, no final de um debate sobre o "Futuro da Indústria" e a revitalização da economia em Portugal, Rui Reininho cantou um tema inédito, intitulado "Rota da Sede", que foi acompanhado por um videoclipe, "todo ele uma referência à indústria, ao território, às empresas e às pessoas", enfatiza o centro empresarial Lionesa, promotora do evento.

Em "Roda da Sede" descobre-se a Via Norte, nome de uma estrada onde estão sediadas grandes referências da indústria portuguesa, como a Sonae, a Efacec ou o SuperBock Group, e também um ponto cardeal magnético que se apresenta como o maior e mais dinâmico centro de negócios dedicado à indústria 4.0 em Portugal.

A extinta Fábrica de Tecidos de Seda Lionesa, inaugurada em 1944 e que representava a indústria 2.0, ressurgiu há mais de uma década como íman económico e social dedicado à 4.0, que manteve o nome Lionesa e que, nos últimos anos, atraiu grande quantidade e qualidade de investimento estrangeiro, nomeadamente nas áreas das tecnologias e serviços partilhados.

Empresas como a Oracle, Farfetch, eDreams, Vestas, Klockner Pentplast e Hilti são algumas das marcas com escritórios na Lionesa, que acolhe um total de 112 empresas e cerca de cinco mil pessoas, de 30 diferentes nacionalidades, num espaço de 48 mil metros quadrados e que gera indiretamente uma faturação estimada em cerca de 1,2 mil milhões de euros.

Entretanto, a Lionesa decidiu editar um livro, chamado "A Fábrica", que parte da narrativa do edifício que acolhe este centro de negócios, em Leça do Balio, Matosinhos, para se estender de todo o Norte para o Mundo.

"Concebida e pensada sem pandemia no horizonte, a edição que junta autores de prestígio tornou-se uma mensagem de força e de esperança em redor de um destino e da sua indústria, reforçando os sinais de confiança, esperança, crença num futuro promissor, depois da crise", enfatiza a Lionesa.

Com fotografias de Luís Ferreira Alves, textos históricos de Joel Cleto e design de João Machado, a edição do luxuoso livro despoletou, assim, algo maior, desaguando numa discussão alargada intitulado "A Fábrica do Futuro", que juntou várias figuras do panorama público e privado nacional e a atuação de Rui Reininho com uma música que é uma espécie de hino à indústria.

Bruno Latour: “Não existe sistema capaz de resistir à viralidade da ação política”



Bruno Latour: “Não existe sistema capaz de resistir à viralidade da ação política”
"Estamos vendo que a ordem mundial, que nos diziam ser impossível de mudar, tem uma plasticidade espantosa", escreve sociólogo e filósofo francês em artigo

A atual crise sanitária só tem uma vantagem, ter uma dimensão equivalente à das seguintes crises, aquelas que englobamos sob o nome de ecologia ou mudança climática. Até agora, as medidas tomadas em nome do meio ambiente sempre parecem mínimas —inclusive irrisórias— em comparação com o que está em jogo: uma ciclovia aqui, um carro elétrico ali. Por mais que os cientistas dissessem que deveríamos mudar de rumo “radicalmente” e “de modo duradouro” e reexaminar “todas as nossas condições de vida”, as pessoas assentiam com a cabeça e pensavam em outra coisa.

No entanto, o grande mérito da crise sanitária provocada pela covid-19 é ter conseguido, a toda velocidade e em todo o mundo, uma transformação radical e, infelizmente, duradoura, de nossas condições de vida em uma escala que, devido à magnitude do desastre, das forças mobilizadas e das vítimas, não tem equivalente a não ser se falarmos sobre as duas últimas guerras mundiais. Em meio à dor mais extrema, estamos vendo que a ordem mundial, que nos diziam ser impossível de mudar, tem uma plasticidade espantosa e que, como coletivo, os seres humanos não estão indefesos. Tudo depende, é claro, da sua capacidade de resistir ao retorno à ordem anterior.

E esta é a segunda e fascinante característica do vírus: está conseguindo tudo isso sem ir além do contágio de pessoa a pessoa, um contágio que cada um de nós pode interromper ou, pelo contrário, facilitar. Isso significa que o velho modelo de ação que tanto nos desesperava (como um indivíduo vai lutar sozinho contra um sistema esmagador?), na realidade, não faz sentido: um vírus vindo da China, por si só, e que viaja boca a boca, pode perfeitamente derrubar a ordem estabelecida. Uma lição maravilhosa: não existe sistema capaz de resistir à viralidade da ação política, basta colocá-la em prática com os instrumentos adequados.

quinta-feira, 23 de julho de 2020

Centenário de Amália Rodrigues


Visionária desde o início, bom gosto, inteligência, argúcia, sabia sempre de antemão o que poderia funcionar ou não… imensamente dotada a todos os níveis… sem as ferramentas que temos hoje, apenas com o seu imenso talento conquistou o Mundo.
Graças a ela, podemos ter um pequeno vislumbre do que é poder cantar pelo Mundo fora. 
Se vivesse nos tempos de hoje e com tudo o que temos à nossa disposição, acredito que ainda faria mais, muito mais do que qualquer um de nós.
Obrigado Amália por tudo e tanto que nos deu e continua a dar. Sem ela, Mulher, sem a sua beleza , arte e obra , nada seria possível. 


quarta-feira, 22 de julho de 2020

Reportagem: Invasor e superpredador do Tejo está a dizimar espécies nativas





O siluro (Silurus glanis) é uma espécie originária da Europa Central e pode atingir mais de 2,5 metros de comprimento e mais de 100 quilos de peso. Foi detectado pela primeira vez na Península Ibérica no Rio Ebro, em Espanha, em 1974. Na parte espanhola do Tejo, a primeira identificação data de 1998 e na parte portuguesa apenas foi observado em 2014, embora se julgue que tenha chegado em 2006. Os investigadores estimam que a espécie tenha sido introduzida no Tejo espanhol por pescadores alemães que os queriam pescar nas águas do rio ibérico, escreve Luciano Alvarez.

Na zona de Santarém, em 2017, foi capturado o maior espécime conhecido no Tejo português. Tinha 58 quilos e quase dois metros. Já o maior predador apanhado na Europa foi encontrado em 2015, no rio Ródano, em França: tinha 2,73 metros e pesava 130 quilos.

Em 2017, os investigadores do Mare – Centro de Ciência do Mar e Ambiente da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, que estudam as espécies não naturais nos rios portugueses, iniciaram uma investigação sobre a presença do siluro no Tejo. Nessa altura, a população era calculada em centenas e as capturas às dezenas. Hoje não têm dúvidas em falar em “dezenas de milhares” de espécimes. Há três anos, os biólogos diziam que podia vir a ser uma ameaça para as espécies nativas. Hoje já não têm dúvidas: “Estão a dar cabo de todas espécies autóctones”, garante Filipe Ribeiro, um dos investigadores do Mare que coordena parte da investigação às espécies não naturais dos rios portugueses.

“Calculamos que, entre margens, exista um siluro por metro de rio. Se se tiver em conta que o Tejo português tem cerca de 120 quilómetros e, em alguns casos, distâncias entre margens com centenas de metros em alguns casos, têm-se uma ideia do número de espécimes no rio. São dezenas de milhares e estão a devorar tudo”, acrescenta este biólogo de 45 anos, especialista em peixes de água doce e espécies invasoras e que continua a acompanhar a evolução dos siluros no Tejo.
Milhares de novas crias todos os anos

Filipe Ribeiro acentua que “o mais preocupante são espécies nativas do Tejo que estão a ser dizimadas”. “Daqui a muito pouco tempo corremos o risco de ter o Tejo sem nenhuma das suas espécies autóctones e que, hoje, já têm uma fraca expressão no rio”, alerta.

Para demonstrar os estragos que este superpredador está a causar no Tejo Filipe Ribeiro explica que, de acordo com estudos científicos europeus, para sobreviver cada siluro necessita de comer 2% do seu peso. Se calcular este peso médio em dez quilos, cada peixe necessita de comer 200 gramas por dia. Se se multiplicar estas 200 gramas por 10 mil espécimes chagamos ao impressionante número de duas toneladas por dia.

Igualmente impressionante é a sua capacidade de reprodução. Uma fêmea jovem de um metro faz uma desova de cerca de 80 mil ovos uma vez por ano. Calcula-se que apenas 1% das crias, cerca de 800, chega à idade adulta. Se se multiplicar por 10 mil são cerca de 8 mil novos espécimes por desova a invadir o rio.

“Estamos a falar de ter uma espécie de leão dentro de água, que tudo come e que a ele ninguém o come em Portugal [em alguns países do centro da Europa o siluro é consumido], porque não há tradição e é um peixe muito feio. Estamos a falar de uma praga, de um predador de topo”, afirma o biólogo do Mare.

O pesadelo dos pescadores

Carlos Serras, 57 anos, deixou o Tejo na madrugada de quinta-feira, já passava da 1h. A norte do cais de Vila Velha de Rodão, no distrito de Castelo Branco, largou no rio 14 redes de pesca.

Não esperam uma grande pescaria. Durante a noite, a barragem espanhola de Cedilho, a norte de Vila Velha de Rodão, libertou uma grande massa de água para o Tejo português. Com ela vieram, lamas, algas, troncos de árvores e outro lixo, que sujaram as redes e fiz com que os peixes delas não se aproximem.

Ao fim de cerca de duas horas apanhou apenas dois lúcios percas, outra espécie invasora do Tejo, mas com valor comercial, já que é consumida na região.

Da água não tiraram nenhuma espécie nativa, nem nenhum siluro, que se transformou num pesadelo para os pescadores.

O mestre Serras pesca no Tejo há mais de 30 anos e, de forma profissional, há cerca de 20. O siluro é um pesadelo para ele. Apanhou o primeiro há dez anos, junto à barragem de Cedilho.

“Os primeiros eram peixes pequenos, para aí com cinco quilos. Algum tempo depois, os que ia apanhando já pesavam dez quilos e não paravam de crescer. O maior que apanhei tinha 44 quilos e 1 metro e 80 de comprimento”, conta.

Aumentou o tamanho e a quantidade. Há duas semanas, em apenas dois dias, apanhou 75 destes superpredadores. “Tenho dias, muitos dias, que tiro mais de 200 quilos desta praga do rio. Já tive dias em que tinha o fundo de um barco de oito metros cheio de siluros”, revela, mostrado que fotografias que ilustram estas situações, não fosse alguém pensar que era mais uma conversa de pescador um bocadinho exagerada.

“A praga” usa-a para colocar como isco nas gaiolas de pesca ao lagostim do rio. Ainda assim, é “um isco ruim”, já que, por deixar pouco sabor na água, não atrai o lagostim.

Em relação aos estragos que os siluros estão a fazer no Tejo e em especial às espécies nativas é ainda mais pessimista que os investigadores:

Diminuir a população “já”

“Há uns anos apanhavam-se barbos e bogas aos milhões. Hoje não se apanha um. E agora está também a dar cabo dos lagostins que, hoje, representam cerca de 70% da facturação de um pescador profissional. É uma coisa monstruosa.”

Carlos Serras que está a ver “a praga a crescer de dia para dia” e diz mesmo que, “se não fizer nada, qualquer dia só há siluros no Tejo”.

E aqui, investigadores e pescadores concordam – é “preciso agir já” e começar a reduzir as populações de siluros no Tejo. Ambos dizem que uma primeira solução poderia passar pelo Governo pagar aos pescadores uma verba por cada quilo de siluro capturado. Carlos Serras diz mesmo que o pagamento de um euro por quilo de siluros capturado “já seria um incentivo motivador”.

Os biólogos que estudam a espécie já aprenderam algumas coisas sobre o seu comportamento, que podem que podem contribuir para reduzir as populações.

Graças a telemetria que fazem há três anos – neste momento há 25 espécimes que têm transmissores acústicos colocados no corpo – já perceberam que, no final da Primavera, reúnem-se grupos em determinados locais das albufeiras das barragens.

“Ainda não percebemos porquê, mas o conhecimento deste facto seria uma possibilidade para, com pouco esforço, fazer grandes capturas e reduzir a população”, explicou ao PÚBLICO Bernardo Quintela, também biólogo do Mare e especialista emigrações e movimentações de peixes.

Todos concordam que estes superpredadores são hoje um problema muito grave no Tejo e que precisa de ser combatido já, até porque o problema pode expandir-se a outros rios. Os siluros já foram confirmados no Douro espanhol e já chegaram aos investigadores portugueses relatos de avistamentos no lado do rio português, embora ainda sem confirmação cientifica.

Créditos da Reportagem: jornal “Público”

Repórteres: Luciano Alvarez ( texto) e Daniel Rocha (fotos)

Nota: as fotografias que ilustram a Reportagem não são do repórter fotográfico Daniel Rocha.

Bernie Sanders: My generation has left you a planet that is becoming increasingly unhealthy



Let me thank the Sunrise Movement for the extraordinary work that you guys are doing. Thank you. The truth is that my generation have left you a planet that is becoming increasingly unhealthy and uninhabitable, and it is your generation that is going to save us all. So I just want to thank you for the great work that you are doing.

We are living, as I think all of you know, in an unprecedented moment in American history. There's never been a moment like this, ever. We're looking at a pandemic which has claimed 140,000 lives already, and it is getting worse. We're looking at an economic meltdown, which has cost us tens of millions of jobs. Unless we change things, and together we will change things, it's going to be harder for you guys to get decent jobs when you get out of school. And that's wrong. We are living in a moment where millions of people are standing up to fight systemic racism in all of its forms and police brutality and police murders.

Then on top of all of that, you got a President who is clearly unfit for the job. And then why don't we throw in the issue that brings us all together, is that the scientists are telling us that if we don't get our act together with regard to climate change, we don't know what kind of planet your kids and grandchildren are going to be living in. But we do know that within the next few years, there will be irreparable, underline irreparable, damage to this planet. Last five years, five warmest years on record. A few weeks ago in Siberia, the coldest region on Earth, temperature reached 100 degrees Fahrenheit. Report that just came out today that says everything being equal, if we don't transform our energy system, we're going to be looking at significant increases in temperature in years to come.

So what does that mean? What it means, bottom line, is that we need a political revolution in every sense of the word. We need to fight for an economy that works for working people, not just the very wealthy, and we must end the disgrace of an unprecedented level of income and wealth inequality. Does anybody think it makes sense three people own more wealth than the bottom half of America? Anybody think it makes sense that during this pandemic when millions of people are struggling to put food on the table, worried about getting evicted from their homes, richest people in this country are becoming phenomenally richer? People like Jeff Bezos, owner of Amazon. The Walton family making billions and billions of dollars during the pandemic. That's got to end. Does anybody think it makes sense that we are the only major country on Earth not to guarantee healthcare to all people as a human right while we're spending twice as much per person on healthcare as the people of any other country?

You guys, the younger generation, are the future of America. You should not have to go deeply into debt in order to get a higher education. That is why we're going to continue the fight to make public colleges and universities tuition-free and cancel all student debt.

Does anybody think it makes sense that we have more people in jail than any other country on Earth because we have a racist and broken criminal justice system? Or we have an incredibly unjust immigration system, in which so many people are living in fear of deportation today, which is why we're going to move toward comprehensive immigration reform and a path towards citizenship.

So what all of this is about is growing a progressive movement that understands that we need an economy that works for all, not the few; that we need an educational system which encourages and makes it possible to all people to get the quality education that they need; that we have a healthcare system in which healthcare is a human right, not a privilege; and that we move forward with a Green New Deal to create millions and millions of good paying jobs, including jobs that I want your generation to have to transform our energy system away from fossil fuel to energy efficiency and sustainable energy.

Now, to make any of these things happen, what we have got to do is take on very powerful special interests. That is the fossil fuel industry. That is the healthcare industry. That is the military-industrial complex. That's the prison-industrial complex. That is Wall Street and these big financial institutions. What we need to understand is that real change never takes place from the top on down, it is only when millions of people stand up for justice. And that is what the Sunrise Movement is all about. That is what you are fighting for right now. You're fighting to make sure, that among many other things, the planet that we live in, and our kids and grandchildren will live in, is a healthy and habitable planet.

But to do that, we're going to have to take on the greed and the lies and the irresponsibility of the fossil fuel industry. That's what we're going to have to do. We can't address the crisis of climate change unless we take on the fossil fuel industry in this country and around the world because this, obviously, is not an American issue, it is a global issue. As I think all of you know, we are making progress as a result of your efforts in college and university. At the college and university, boards of directors of those schools are divesting from the fossil fuel industry. We are working with Vice President Biden on a program to see a very significant increase in energy efficiency and sustainable energy. And we're blunt. We want to see the United States lead the world in this effort because we have to bring people together.

So, let me just conclude by saying this. We need right now to transform this country in so many respects, and we will not do it unless there is a political revolution. There will not be a political revolution unless millions of young people participate in the political process and stand up and fight for justice. The very good news is that the younger generation in America today is, in my view, the most progressive generation in the history of this country. Your generation is anti-racist, anti-sexist, anti-homophobia, anti-xenophobia, anti-religious bigotry, and your generation understands that we have to transform our energy system away from fossil fuel. That is the very good news. It's something that all of us, you and your parents and everybody else, should be very proud of.

But here is the bad news. Your generation does not vote in as high in numbers as it should. So in the next three, three and a half months, as we move toward the presidential election, it is absolutely imperative that we defeat Donald Trump and that we elect progressive candidates from the local, state, and federal level. We need your help to do that. If young people come out in large numbers, I am absolutely confident that Donald Trump will be history and that we're going to elect progressives all across this country. But talk is cheap. Action is what matters. So I urge you to reach out to your friends, reach out to your neighbors, your fellow students. Let's get involved. Let's stand up for justice. Let's transform this country and have a government and an economy that works for all of us, not just the few.

So, Sunrise, thank you so much for what you're doing. I look forward to working with you in the months and years to come. Thank you all very much.

terça-feira, 21 de julho de 2020

5 notas sobre o dinheiro que (não) vem

Fonte: aqui


Após uma maratona negocial que não deixará marcas nas relações entre Estados-membros, o Conselho Europeu chegou a um acordo que representa uma vitória em toda a linha dos países que se auto-intitulam, incorretamente, como frugais. A agenda desses países, escondida através de expressões grandiloquentes como “competitividade” ou “reformas” e referências às “regras europeias” tornou-se absolutamente transparente no acordo final. Vejamos então algumas das primeiras conclusões que podemos tirar:

1. Portugal irá sofrer cortes de 7,5% na Coesão e de 9% na Agricultura. É pura e simplesmente falso que esses cortes sejam compensados pelo Fundo de Recuperação por duas razões: 1) o Fundo de Recuperação é, até ver, dívida (na ausência de novas receitas, limita-se a ser um adiantamento de orçamentos futuros), enquanto o orçamento é financiamento a fundo perdido, e 2) o Fundo de Recuperação é um instrumento extraordinário, enquanto o Orçamento é um instrumento permanente. O Governo aceita os cortes na coesão e agricultura em nome da “compensação” do fundo de recuperação, ou seja, condena o futuro da coesão para salvar o seu presente. É uma boa estratégia para o Governo, mas má para o país.

2. A condicionalidade macroeconómica entra em força e sem ambiguidades nas regras do Fundo de Recuperação e é introduzido um mecanismo de controlo no acesso ao financiamento. Esse mecanismo, com o nome exótico de travão de segurança, significa que a distribuição dos montantes aos Estados-membros pode ser bloqueado pela Comissão ou até por grupos de outros Estados-membros. A forma como isto irá funcionar ficou camuflada por um parágrafo do mais ininteligível europês mas, em conjunto com a regra da condicionalidade macroeconómica, significa que estamos oficialmente em modo resgate. Por enquanto, ninguém fala de austeridade ou dos seus eufemismos, para não afugentar a caça, mas os mecanismos já estão todos montados.

3. Depois de tanta conversa sobre o pacto verde e a Europa digital, o montante do Fundo para a Transição Justa é reduzido a um terço e o reforço do programa Horizon (investigação científica e inovação) é reduzido a pouco mais de um terço. Os 4 forretas, depois de meses a falar de competitividade e reformas, nem pestanejaram, e é fácil perceber porquê.

4. A última proposta da Presidência do Conselho não só mantém, como aumenta significativamente os rebates, um privilégio orçamental dos 4 forretas e da Alemanha. O que é um rebate? Um rebate é um desconto (não previsto nos tratados) à contribuição de um Estado-membro que decorreria da aplicação da fórmula que determina as contribuições. Os rebates a estas 4 economias aumentam de 2908 para 3877 milhões: uma prenda orçamental que corresponde a uma violação arbitrária das regras de financiamento do orçamento comunitário feita à medida destas economias e da Alemanha, que também mantém o seu rebate de 3670 milhões. Portanto, para os 4 forretas, as regras são para cumprir... mas só pelos outros.

5. Finalmente, os recursos próprios. O que tem permitido às instituições europeias vender a ideia de que uma parte do fundo de recuperação é “financiamento a fundo perdido” é a promessa de que a dívida agora emitida será amortizada através do recurso a impostos europeus. O problema é que essa promessa tem barbas. Alguns dos impostos europeus que estão em cima da mesa já foram rejeitados pelo Conselho no passado. Outros, como o Imposto sobre Transações Financeiras, estão em discussão há anos e têm sido desvirtuados pela pressão dos lobbys. Se não for possível aprová-los, o Fundo de Recuperação manter-se-á um instrumento de dívida nacional, embora mutualizada. Podemos receber mais agora, mas também vamos perder mais no futuro.

O Governo aceitou um acordo que vai trazer muito dinheiro de empréstimo, num momento em que esse dinheiro é muito necessário. Mas foi exatamente isso que aconteceu com a Troika, com as consequências que conhecemos. E as concessões que foram necessárias para conseguir este acordo projetam ainda mais sombras sobre o nosso futuro próximo na Europa. Mesmo que o Governo não as queira ver.

Sobre o autor
Eurodeputado e economista.

The Cosmic Miracle of Trees: Astronaut Leland Melvin Reads Pablo Neruda’s Love Letter to Earth’s Forests

“Today, for some, a universe will vanish,” Jane Hirshfield writes in her stunning poem about the death of a tree a quarter millennium after William Blake observed in his most passionate letter that how we see a tree is how we see the world, and in the act of seeing we reveal what we are: “The tree which moves some to tears of joy is in the eyes of others only a green thing which stands in the way,” he wrote. “As a man is, so he sees.”

If a single tree is home to a miniature universe of life, and if we are learning with wide-eyed wonder that a tree is not a self-contained world but a synaptic node in a complex cosmos of relationships in constant and astonishing communication with other nodes, relationships that weave the fabric of earthly life, what does it make us — what does it reveal about our character, as a planetary people and a civilization — to watch the world’s forests vanish in flames before our eyes, in wildfires so ferocious as to be visible from space?


A century after Walt Whitman turned to trees as our wisest moral teachers and a generation before Wangari Maathai defended them with her life in a movement of moral courage that won her the Nobel Peace Prize, the Nobel-winning Chilean poet Pablo Neruda (July 12, 1904–September 23, 1973) — one of humanity’s furthest-seeing and lushest-minded artists — shone a gorgeous sidewise gleam at an answer by way of celebration rather than lamentation in a passage from his Memoirs ("Confesso que Vivi"), posthumously published in English the year the Voyager spacecraft captured that poetry-fomenting first glimpse of our Pale Blue Dot seen from far away. 

At the 2020 Universe in Verse, celebrating fifty years of Earth Day, astronaut and poetry-lover Leland Melvin — one of a fraction of a fraction of a percentage of humans in the history of our species to have left this rare planet, to have seen its forests and its intricate living web of relationships from the cosmic perspective, and to have returned loving it all the more passionately — breathed new life into Neruda’s forgotten words with a soulful reading of that passage:

Astronaut Leland Melvin reads “The Chilean Forest” by Pablo Neruda

“Under the volcanoes, beside the snow-capped mountains, among the huge lakes, the fragrant, the silent, the tangled Chilean forest… My feet sink down into the dead leaves, a fragile twig crackles, the giant rauli trees rise in all their bristling height, a bird from the cold jungle passes over, flaps its wings, and stops in the sunless branches. And then, from its hideaway, it sings like an oboe… The wild scent of the laurel, the dark scent of the boldo herb, enter my nostrils and flood my whole being… The cypress of the Guaitecas blocks my way… This is a vertical world: a nation of birds, a plenitude of leaves…

I stumble over a rock, dig up the uncovered hollow, an enormous spider covered with red hair stares up at me, motionless, as huge as a crab… A golden carabus beetle blows its mephitic breath at me, as its brilliant rainbow disappears like lightning… Going on, I pass through a forest of ferns much taller than I am: from their cold green eyes sixty tears splash down on my face and, behind me, their fans go on quivering for a long time… A decaying tree trunk: what a treasure!… Black and blue mushrooms have given it ears, red parasite plants have covered it with rubies, other lazy plants have let it borrow their beards, and a snake springs out of the rotted body like a sudden breath, as if the spirit of the dead trunk were slipping away from it…

Farther along, each tree stands away from its fellows… They soar up over the carpet of the secretive forest, and the foliage of each has its own style, linear, bristling, ramulose, lanceolate, as if cut by shears moving in infinite ways… A gorge; below, the crystal water slides over granite and jasper… A butterfly goes past, bright as a lemon, dancing between the water and the sunlight… Close by, innumerable calceolarias nod their little yellow heads in greeting… High up, red copihues (Lapageria rosea) dangle like drops from the magic forest’s arteries… A fox cuts through the silence like a flash, sending a shiver through the leaves, but silence is the law of the plant kingdom… The barely audible cry of some bewildered animal far off… The piercing interruption of a hidden bird… The vegetable world keeps up its low rustle until a storm chums up all the music of the earth.

Anyone who hasn’t been in the Chilean forest doesn’t know this planet. I have come out of that landscape, that mud, that silence, to roam, to go singing through the world."

segunda-feira, 20 de julho de 2020

Carta aos amigos e amigas do exterior, por Frei Betto


No Brasil ocorre um genocídio! No momento em que escrevo, 16/7, a Covid-19, surgida aqui em fevereiro deste ano, já matou 76 mil pessoas. Já são quase 2 milhões de infectados. Até domingo, 19/7, chegaremos a 80 mil vítimas fatais. É possível que agora, ao você ler este apelo dramático, já cheguem a 100 mil.

Quando lembro que na guerra do Vietnã, ao longo de 20 anos, 58 mil vidas de militares usamericanos foram sacrificadas, tenho o alcance da gravidade do que ocorre em meu país. Esse horror causa indignação e revolta. E todos sabemos que medidas de precaução e restrição, adotadas em tantos outros países, poderiam ter evitado tamanha mortandade.

Esse genocídio não resulta da indiferença do governo Bolsonaro. É intencional. Bolsonaro se compraz da morte alheia. Quando deputado federal, em entrevista à TV, em 1999, ele declarou: “Através do voto você não vai mudar nada nesse país, nada, absolutamente nada! Só vai mudar, infelizmente, se um dia partirmos para uma guerra civil aqui dentro, e fazendo o trabalho que o regime militar não fez: matando uns 30 mil”.

Ao votar a favor do impeachment da presidente Dilma, ofertou seu voto à memória do mais notório torturador do Exército, o coronel Brilhante Ustra.

Por ser tão obcecado pela morte, uma de suas principais políticas de governo é a libertação do comércio de armas e munições. Questionado à porta do palácio presidencial se não se importava com as vítimas da pandemia, respondeu: "Não estou acreditando nesses números" (27/3, 92 mortes); "Todos nós iremos morrer um dia" (29/3, 136 mortes); "E daí? Quer que eu faça o quê?" (28/4, 5.017 mortes).

Por que essa política necrófila? Desde o início ele declarou que o importante não era salvar vidas, e sim a economia. Daí sua recusa em decretar lockdown, acatar as orientações da OMS e importar respiradores e equipamentos de proteção individual. Foi preciso a Suprema Corte delegar essa responsabilidade a governadores e prefeitos.

Bolsonaro sequer respeitou a autoridade de seus próprios ministros da Saúde. Desde fevereiro o Brasil teve dois, ambos demitidos por se recusarem a adotar a mesma atitude do presidente. Agora, à frente do ministério, está o general Pazuello, que nada entende de questão sanitária; tentou ocultar os dados sobre a evolução dos números de vítimas do coronavírus; empregou 38 militares em funções importantes do ministério, sem a requerida qualificação; e cancelou as entrevistas diárias pelas quais a população recebia orientação.

Seria exaustivo enumerar aqui quantas medidas de liberação de recursos para socorro das vítimas e das famílias de baixa renda (mais de 100 milhões de brasileiros) jamais foram efetivadas.

As razões da intencionalidade criminosa do governo Bolsonaro são evidentes. Deixar morrer os idosos, para economizar recursos da Previdência Social. Deixar morrer os portadores de doenças preexistentes, para economizar recursos do SUS, o sistema nacional de saúde. Deixar morrer os pobres, para economizar recursos do Bolsa Família e de outros programas sociais destinados aos 52,5 milhões de brasileiros que vivem na pobreza e aos 13,5 milhões que se encontram na extrema pobreza. (Dados do governo federal).

Não satisfeito com tais medidas letais, agora o presidente vetou, no projeto de lei sancionado a 3/7, o trecho que obrigava o uso de máscaras em estabelecimentos comerciais, templos religiosos e instituições de ensino. Vetou também a imposição de multas para quem descumprir as regras e a obrigação do governo de distribuir máscaras para os mais pobres, principais vítimas da Covid-19, e aos presos (750 mil). Esses vetos, no entanto, não anulam legislações locais que já estabelecem a obrigatoriedade do uso de máscara.

Em 8/7, Bolsonaro derrubou trechos da lei, aprovada pelo Senado, que obrigavam o governo a fornecer água potável e materiais de higiene e limpeza, instalação de internet e distribuição de cestas básicas, sementes e ferramentas agrícolas, para aldeias indígenas. Vetou também verba emergencial destinada à saúde indígena, bem como facilitar o acesso de indígenas e quilombolas ao auxílio emergencial de 600 reais (100 euros ou 120 dólares) por três meses. Vetou ainda a obrigação de o governo oferecer mais leitos hospitalares, ventiladores e máquinas de oxigenação sanguínea a povos indígenas e quilombolas.

Indígenas e quilombolas têm sido dizimados pela crescente devastação socioambiental, em especial na Amazônia.

Por favor, divulguem ao máximo esse crime de lesa-humanidade. É preciso que as denúncias do que ocorre no Brasil cheguem à mídia de seu país, às redes digitais, ao Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, e ao Tribunal Internacional de Haia, bem como aos bancos e empresas que abrigam investidores tão cobiçados pelo governo Bolsonaro.

Muito antes de o jornal The Economist fazê-lo, nas redes digitais trato o presidente por BolsoNero – enquanto Roma arde em chamas, ele toca lira e faz propaganda da cloroquina, remédio sem nenhuma eficácia científica contra o novo coronavírus. Porém, seus fabricantes são aliados políticos do presidente...

Agradeço seu solidário interesse em divulgar esta carta. Só a pressão vinda do exterior será capaz de deter o genocídio que assola o nosso querido e maravilhoso Brasil.

Fraternalmente,

Frei Betto

Frei Betto é frade dominicano e escritor, assessor da FAO e de movimentos sociais

domingo, 19 de julho de 2020

What the United States can learn from Portuguese politics

Fonte: aqui


Donald Trump’s Independence Day attack on the culture of inclusion and equality highlights a problem long with us. Far from being united by principles enshrined in the country’s origins, America has long suffered deep discord over what lessons to draw from the nation’s history and how to tell the story of our past. Conflict over the treatment of minorities – and the bounds of inclusion in the country’s imagined community – has punctuated American history since independence. Even after the end of the Trump presidency, the pursuit of equality and inclusion – and restoring some sense of national community – will require finding better ways to build on what we do with the country’s political past and the way we talk about it.

A good place to start is by taking seriously the best examples of how other countries have managed to build in useful ways on their past. As the COVID-19 pandemic tragically reminds us, at times the United States has handled shared challenges less successfully than other countries.

Useful, even inspiring, lessons are to be found in a small country at the western end of Europe, Portugal. Like the United States and France, Portugal looks to a revolution that enunciated principles of equality as the origin of its democracy. But more than those larger and more powerful countries, Portugal has dedicated great cultural and political efforts to constructing a shared political culture rooted in its founding moment – the Carnation Revolution of 25 April 1974 – when an uprising led by army captains brought an end to decades of dictatorship. It was the Portuguese who inaugurated democracy’s worldwide third wave of expansion beginning on that day.

After the ravages of the 2008 Great Recession, Portugal became the only country in hard-hit southern Europe where satisfaction in democracy, and trust in political institutions, ranked above the average for Europe as a whole. The Portuguese actually diminished inequality somewhat during that crisis. They have the lowest unemployment and poverty of southern Europe and have largely escaped the growth of far-right populism that bedevils much of the world. These triumphs are directly related to the country’s ability to draw culturally on the revolutionary origins of its democracy and to foster a deeply inclusionary understanding of politics.

Every year the Portuguese celebrate their 1974 Carnation Revolution in many ways – inside parliament and in the streets, schools and many other locations. Crucially, an annual session of parliament devoted to remembering the 1974 events is broadcast live on television and is followed by a large public demonstration. Numerous other commemorative acts, many focused on telling the story of the revolution to children, bolster the creative breadth of the annual event.

In the annual session of parliament, televised live every 25 April, political leaders exchange views on the lasting significance of the country’s liberation by revolution in 1974 and on the current meaning of those origins. Predictably, the parties differ somewhat in the points they emphasize, but perhaps due to the interactive and public character of their reflections, core principles have come to shape their speeches.

This annual interactive event has helped build wide cultural consensus that eluded the Portuguese before 1974. The revolution’s promotion of inclusionary participation, welcoming all voices into the public arena, is celebrated not only on the left but also by those to the right of Portugal’s center. The poetry of the revolution, a term often used by the Portuguese, is repeatedly noted by speakers of left and right who tell the story of their revolution and its enduring meaning. Over time the degree of consensus has grown. Songs and symbols once linked to the left are now applauded also by many on the right. The annual public exchange has helped to produce a political culture that welcomes the voices of the dissatisfied into the democratic arena, treating them as important.

Portugal’s political culture of inclusion shows its marks in many arenas. In the news media – where journalists share in setting policy of media organizations – coverage incorporates voices of the poor and other outsiders. In the school system, students and teachers have helped to shape policies friendly to diversity and creativity. Crucially, the country has incorporated large numbers of immigrants from former colonies in Africa and Asia. Prime Minister António Costa is the son of an Indian-origin immigrant, but his skin color is an undiscussed non-issue. Political life is built on the assumption of inclusion.

During the economic crisis that began in 2008, parties remained at least somewhat attentive to demonstrators and other dissatisfied citizens. In September 2012, the most aggressive austerity measure of that period was rolled back by a right-wing government after a nationwide campaign of protest. Government authorities cited their commitment to listening to voices of popular opposition. Earlier, in responding to the beginnings of economic crisis, a Socialist government combined egalitarian ideals and pragmatic moderation. Although external pressures pushed governments to impose cutbacks, they managed to reduce inequality somewhat – a record remarkably different from that of neighboring Spain in the same years.

Portugal emerged from the Great Recession with a political system that remains more socially responsive and less polarized than in many other countries. Existing political parties limited the populist far-right to just one parliamentary deputy in elections last fall. Their approach to politics, celebrating political inclusion, participation and their democracy’s revolutionary origins has greatly helped the country weather difficult times. Policy-making triumphs including successes of the educational system and the region’s lowest unemployment rate have attracted international attention. The interactive cultural work annually telling the story of their democracy’s origins and celebrating political inclusion has bolstered these successes. In contrast, the United States – and France – have not attempted such a robust annual program of public exchange on the revolutionary origins of their political systems.

Efforts to draw meaning and inspiration from the past cannot eliminate economic conflict or political challenges, but creative public exchanges such as Portugal’s annual commemorations can help to build and sustain a better political playing field than the one that currently bedevils the United States. Portugal’s lively annual celebration of democracy’s revolutionary beginnings offers potentially useful example to a deeply troubled America nearly two and a half centuries after the 1776 proclamation that all men are created equal.

Featured Image Credit: fdecomite via Flickr


Robert M. Fishman is CONEX-Marie Curie Professor of Political Science and Sociology at Madrid's Carlos III University. He works on democracy and democratization, social protest movements and political inclusion, culture and politics, and historical approaches to social science. His previous faculty positions were at the University of Notre Dame and at Harvard University.

segunda-feira, 13 de julho de 2020

BIOENERGIA = BIOFARSA


Por Paulo Pimenta e Castro

Depois de ligarem o candeeiro (eléctrico), vejam este vídeo!

Tenham em conta que, quase metade da energia de fontes "renováveis", produzida na União Europeia, resulta da queima de madeira. Na sua maioria importada de países terceiros: Estados Unidos, Canadá, Rússia, ... Não há milagres sobre o argumento do "balanço de carbono zero". Mas, pior! Não há argumento que justifique a perda de biodiversidade, a extinção em massa, o maior risco de zoonoses, a delapidação dos solos e dos recursos hídricos, que não seja a aposta no suicídio colectivo.

Depois do vídeo, leiam a proposta de António Costa Silva sobre "transição energética", ou a notícia sobre a duplicação da capacidade de produção de energia eléctrica na central termoeléctrica a biomassa florestal primária de Mortágua (para lá do que já por aí queima troncos).

Mas, há ainda piores "novidades", a concretizar dentro das nossas fronteiras.

domingo, 12 de julho de 2020

Perda de habitat pode aumentar doenças que passam de animais para humanos, prevê ONU

Fonte: aqui


Um novo relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) alertou que podem surgir mais doenças que passam de animais para humanos, como a covid-19, à medida que os habitats são devastados pela exploração da vida selvagem, práticas agrícolas insustentáveis ​​e mudanças climáticas.

Esses agentes patogénicos, conhecidos como doenças zoonóticas – como o ébola, o MERS, o VIH e o vírus do Nilo Ocidental -, têm aumentado devido à ação dos humanos sob os habitats naturais, de acordo com o relatório do Programa Ambiental da ONU (PNUMA), divulgado na segunda-feira e citado pela NPR.

“Intensificamos a agricultura, expandimos a infraestrutura e extraímos recursos às custas dos nossos espaços selvagens”, indicou o diretor executivo do PNUMA, Inger Andersen. A ciência mostra “que, se continuarmos a explorar a vida selvagem e a destruir os nossos ecossistemas, podemos esperar um fluxo constante dessas doenças que passam de animais para humanos nos próximos anos”.

Investir na pesquisa de doenças zoonóticas, continuou Inger Andersen, permitiria ao mundo “avançar no jogo, impedindo o tipo de paralisação global que vimos”.

O novo relatório recomenda que os governos adotem uma abordagem coordenada de “Saúde Única”, reunindo especialistas em saúde pública, veterinária e ambiental para combater os surtos de doenças zoonóticas.

“As pessoas olham para a pandemia de gripe de 1918 e pensam que esses surtos de doenças ocorrem apenas uma vez num século”, disse Maarten Kappelle, chefe de avaliações científicas do PNUMA. “Mas não é verdade. Se não restabelecermos o equilíbrio entre o mundo natural e o humano, os surtos se tornarão cada vez mais predominantes”.

A demanda global por carne aumentou 260% no último meio século, exacerbando o problema, referiu Andersen.

Alguns animais, como roedores, morcegos, carnívoros e primatas não humanos, são mais propensos a abrigar doenças zoonóticas, com o gado a agir como uma ponte para a transmissão entre os hospedeiros e os humanos, apontou o relatório.

Enquanto isso, em algumas das regiões mais pobres do mundo, as doenças zoonóticas endémicas associadas ao gado causam mais de dois milhões de mortes por ano. No entanto, África – que respondeu com sucesso a uma série de epidemias zoonóticas, como o ébola -, pode ser um local para encontrar soluções de controle de surtos de doenças homem-animal no futuro, acrescentou o documento.

“Para evitar surtos futuros, os países precisam conservar os habitats selvagens, promover a agricultura sustentável, fortalecer os padrões de segurança alimentar, monitorizar e regular os mercados de alimentos, investir em tecnologia para identificar riscos e conter o comércio ilegal de animais selvagens”, frisou o secretário-geral da ONU, António Guterres.

sábado, 11 de julho de 2020

Descoberta nova espécie de dinossauro carnívoro em Torres Vedras e Lourinhã

Fonte: Greensavers

A descoberta do ‘Lusovenator santosi‘, com 145 milhões de anos, pertencente ao Jurássico Superior de Portugal, mostra que estes animais estavam presentes no hemisfério norte, 20 milhões de anos antes do que indicava o registo conhecido, concluíram Elisabete Malafaia, Pedro Mocho (Universidade de Lisboa), Fernando Escasso e Francisco Ortega, todos investigadores ligados à Sociedade de História Natural de Torres Vedras e à Universidade Nacional de Educação à Distância de Madrid (Espanha).

O dinossauro que pertence ao grupo dos carcharodontossauros, vem reforçar a tese de que a Península Ibérica é uma “região fundamental para compreender o processo de dispersão deste grupo de animais no hemisfério norte durante o final do Jurássico, vários milhões de anos antes destes dinossáurios se tornarem os maiores predadores terrestres no hemisfério sul, no final do Cretácico”, explicou Elisabete Malafaia à agência Lusa.

A nova espécie foi identificada a partir de restos recolhidos nas duas últimas décadas nas jazidas das praias de Valmitão (Lourinhã) e de Cambelas (Torres Vedras).

De início, os fósseis foram atribuídos ao dinossauro carnívoro terópode ‘Allosaurus’, mas uma análise mais detalhada do material permitiu aos paleontólogos identificar um conjunto de características exclusivas que permitiu estabelecer este novo género e espécie.

Os carcharodontossauros, de que havia registos do Cretáceo Inferior (130 milhões de anos) e no final do Cretáceo (100 milhões de anos), são um grupo de dinossauros carnívoros que inclui alguns dos maiores predadores que habitaram o planeta.

Na Península Ibérica o grupo estava representado apenas pela espécie ‘Concavenator corcovatus’, identificada na jazida de Las Hoyas (Cuenca, Espanha) por alguns dos mesmos investigadores.

O carcharodontossauro mais antigo conhecido foi encontrado na Tanzânia, em África, sendo da mesma altura da nova espécie agora identificada em Portugal, o que, segundo os paleontólogos, “constitui a primeira evidência e a mais antiga deste grupo no hemisfério norte”.

A identificação desta nova espécie amplia a diversidade de dinossauros terópodes conhecidos no Jurássico Superior português, um dos melhores registos fósseis deste período. O ‘Lusovenator santosi’ foi apelidado em homenagem a José Joaquim dos Santos, um curioso da paleontologia, que, durante mais de 30 anos, descobriu fosseis de dinossauro, guardando-os em casa. Mais tarde, vendeu à Câmara Municipal de Torres Vedras a coleção, que tem vindo a ser estudada por investigadores da Sociedade de História Natural de Torres Vedras.