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terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Engenheiro cria sistema natural para tratar esgoto (Brasil)


Reprodução Projeto faz uso de bananeiras para aumentar a purificação.

Problema crônico e ainda distante de soluções a curto e médio prazo, o tratamento de esgoto não é uma realidade em diversos municípios brasileiros, principalmente aqueles mais carentes de estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste do Brasil. Com isto, muito da dignidade humana é deixada de lado e muitas doenças podem ser provocadas pelo contato com água contaminada. Crianças e idosos são os que mais sofrem com a falta de saneamento básico nos bairros ondem moram.
Para tentar amenizar esta situação, um engenheiro brasileiro chamado Jonas Rodrigo dos Santos criou um sistema natural para tratar esgoto que tem a capacidade de retirar quase todas as impurezas da água e assim evitar a contaminação de mananciais e a proliferação de doenças.

Como funciona o sistema natural para tratar esgoto?

São cinco fases principais de limpeza dentro do sistema natural para tratar esgoto, começando pela fossa séptica e tanque de zona de raízes, este último dividido em quatro fases de filtragem: filtro de pedras grosas, de pedra brita, de pedrisco e filtro com carvão ativado. Para deixar o tratamento de esgoto ainda mais completo, o sistema natural do engenheiro Jonas conta com taiobas e bananeiras para aumentar a purificação.

Para chegar ao modelo final, o engenheiro realizou testes em efluente com 8,3 mil miligramas de material sólido por líquido. Após a passagem da água pelo sistema, o resultado foi de apenas 170 miligramas por litro, ou seja, em um nível que pode ser enviado para córregos ou lagos com total segurança, já que não provoca mais contaminação. Esta central de pequeno porte para tratamento de esgoto foi instalada na propriedade de Denílson José dos Santos (pai do engenheiro) na região rural de Capanema, Paraná.
“Um projeto deste porte não se faz sozinho, eu tive muita ajuda, muito apoio para a realização desse projeto. Uma delas foi do meu pai, pois tudo foi aplicado na propriedade dele, que custeou toda a instalação, ele que arcou com a parte financeira”, afirmou Jonas.

Da faculdade para sociedade

O projeto do sistema natural para tratar esgoto foi desenvolvido por Jonas durante a faculdade de Engenharia Ambiental em Foz do Iguaçu. A ideia, inclusive, foi finalista do Prêmio ANA 2014 de Pesquisa e Inovação Tecnológica. A premiação é realizada pela Agência Nacional das Águas a cada dois anos e tem como objetivo valorizar as melhores soluções que promovam melhorias em projetos para conservação e preservação das reservas hídricas no Brasil.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

Para o sociólogo Boaventura de Sousa Santos, “as universidades só ensinam o conhecimento dos vencedores, e não dos vencidos”

Fonte: O Povo
Ao tentar definir Ecologia de Saberes, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos, um dos mais prestigiados do mundo, afirmou ser um apelo por mais justiça aos conhecimentos. Ele referia-se ao conhecimento que vem das populações rurais, urbanas, ribeirinhas. Ao conhecimento nascido da luta, dos oprimidos, dos discriminados. “As universidades só ensinam o conhecimento dos vencedores, e não dos vencidos. (...) O conhecimento universitário, científico, é importante, mas não basta”, afirmou.
Na noite de ontem, Boaventura ministrou palestra durante o Encontro Internacional Ecologia de Saberes: Construindo o Dossiê Sobre os Impactos dos Agrotóxicos na América Latina. A aula de abertura do evento ocorreu na Concha Acústica da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Na ocasião, ele defendeu que há uma injustiça cognitiva extraordinária, uma ciência que coloca uma grande parcela da população na condição de bárbaro. “A ciência fez com que muita gente no mundo viva exilada, quando ela tem outro conhecimento, outro saber”, argumentou.

Responsabilidade
Para o sociólogo, aqueles que têm o conhecimento científico têm a grande responsabilidade de trazer outros conhecimentos para a universidade e respeitá-los. Por isso, ele propõe, por exemplo, o diálogo entre agricultores e engenheiros agrônomos. “Precisamos conhecer as lutas uns dos outros. Temos que fazer tradução intercultural”, disse, sobre o caminho para se fazer justiça. Em vez do conceito de desenvolvimento - “face do capitalismo neoliberal no mundo” -, para promover o diálogo, ele propôs os de dignidade, economia familiar, reforma agrária, economia social e solidária, soberania alimentar, reserva de território. “Os termos são esses, que podem ser alternativos ao desenvolvimento”, disse.

Segundo ele, a democracia representativa foi derrotada pelos capitalistas e esse seria o motivo para tantos protestos pelo mundo, inclusive no Brasil. “São revoltas de indignação contra algo que não é claro. Não se sabe o que quer, mas sabe-se o que não quer”, disse. Por isso, ele afirma que Ecologia do Saber é uma tentativa de se criar uma outra conversa para a sociedade. “Se não fizermos isso, a alternativa é o fim do planeta”.

Tribunal Penal Internacional reconhece ecocídio como crime contra a Humanidade



O Tribunal Penal Internacional (TPI) decidiu, no final de 2016, reconhecer o “ecocídio’ (termo que designa a destruição em larga escala do meio ambiente) como ‘crime contra a Humanidade’. O novo delito, de âmbito mundial, vem ganhando adeptos na seara do Direito Penal Internacional e entre advogados e especialistas interessados em criminalizar as agressões contra o meio ambiente.

Com o novo dispositivo, em caso de ecocídio comprovado, as vítimas terão a possibilidade de entrar com um recurso internacional para obrigar os autores do crime – sejam empresas ou chefes de Estado e autoridades – a pagar por danos morais ou econômicos. A responsabilidade direta e penas de prisão podem ser emitidas, no caso de países signatários do TPI, mas a sentença que caracteriza o ecocídio deve ser votada por, no mínimo, um terço dos seus membros.

O advogado brasileiro Édis Milaré, especialista em Direito Ambiental, saúda a medida, dizendo que “ninguém quer se envolver num processo-crime, porque o processo-crime estigmatiza. Nenhuma empresa quer responder por um crime ambiental, porque sabe que está em jogo a sua imagem, a sua reputação, a sua credibilidade, e isso diz respeito à sua sobrevivência. A questão penal é importante, mas em termos de gestão ambiental o assunto do dia no Brasil é dotar o país de um marco regulatório à altura da grandeza do nosso meio ambiente, que devemos proteger”, afirmou.

Em setembro de 2016, a Procuradoria do TPI publicou um documento de trabalho onde explica que, a partir de agora, o tribunal interpretará os crimes contra a humanidade de maneira mais ampla, para incluir também crimes contra o meio ambiente que destruam as condições de existência de uma população porque o ecossistema foi destruído, como no caso de desmatamento, mineração irresponsável, grilagem de terras e exploração ilícita de recursos naturais, entre outros.

Evolução

Desde a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP21), realizada em Paris, em 2015, os tribunais internacionais de Direitos da Natureza tentam qualificar o ecocídio, dentro do pressuposto jurídico, como o quinto crime internacional. Os outros quatro crimes internacionais, reconhecidos e punidos pelo Tribunal Penal Internacional, são o genocídio, os crimes de guerra, os crimes de agressão e os crimes contra a humanidade.

A jurista em Direito Internacional Valérie Cabanes, porta-voz do movimento End Ecocide On Earth (Pelo fim do ecocídio na Terra), explica a origem do termo. “A ideia de ecocídio existe há 50 anos e foi evocada pela primeira vez quando os americanos usaram dioxina nas florestas durante a Guerra do Vietnã. Agora queremos reviver essa ideia que considera que atentar gravemente contra ciclos vitais para a vida na Terra e ecossistemas deve ser considerado um crime internacional“, disse.

“Trabalhamos em 2014 e 2015 num projeto de alteração do estatuto do TPI, onde definimos o crime do ecocídio, explicando que como hoje vivemos uma grave crise ambiental – com extinção de espécies, acidificação dos oceanos, desmatamento massivo e mudanças climáticas – atingimos vários limites planetários. Daí ser necessário regular o direito internacional em torno de um novo valor, o ecossistema da terra, e nós defendemos esta causa junto aos 124 países signatários do Tribunal Penal Internacional”, explicou a especialista.

“Será um longo trabalho, porque reconhecer os direitos da natureza e do ecossistema implica em reconhecer que o homem não é o ‘dono’ da vida sobre a Terra, o que pressupõe uma nova concepção do Direito, baseada numa realidade onde o homem é interdependente de outras espécies e do ecossistema. E isso implica também em reconhecer nossos deveres em relação às gerações futuras”, enfatizou Valérie. 

Poesia da Semana: Leo Tolstoi- parábola do Carvalho

  1. Toscania, Fevereiro de 2017- Foto de Gigliola Spaziano

"Príncipe André chegou a casa ... no caminho de volta, ele atravessou a floresta de vidoeiros, onde as folhas de um carvalho o tinham atingido há anos de emoção, de modo tão estranho e memorável. Todas as plantas estavam a florescer.
"Sim, aqui nesta floresta era com o carvalho que eu me sentia mais de acordo ", pensou o príncipe André." Mas onde está? ",... perguntou-se, olhando para o lado esquerdo da estrada e, sem saber, sem reconhecê-lo, foi apenas admirando o carvalho que procurava. E de repente, tudo mudou, como uma cortina de abrir a espessura cabelo escuro, lavada pela chuva recente, pairando apenas, para o pôr-do-Sol, com imensos dedos torcidos e cicatrizes, não é mais o desespero tímido e doloroso, nada mais de tudo. Através da dura casca de um século de idade, tornou-se estrada, sem ramos, folhas jovens de um verde brilhante e inchado.
"Sim, é aquele carvalho!", disse o príncipe André. E, de repente, sem nenhum motivo, foi invadido por um sentimento de alegria igual ao reavivamento da Primavera. Depois vertido para a mente os momentos mais intensos de sua vida ... tudo voltou.
De repente, a memória.
"Não é suficiente o que eu sei sobre o que passa no meu interior.
Eles também devem conhecer os outros. Eu sou menina que queria voar no Céu. Sabes que a minha vida não tem lugar apenas para mim. E tu não vives de forma independente da minha vida ... deve estar refletido em todos, e todos devem viver em perfeita união comigo! "
Lev Tolstoi - Guerra e Paz (adaptado)

Para saber mais

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Ai, Nuclear, Nuclear


Um caso grave de surdez política
Por Susana Fonseca, 17 de Fevereiro

Sem praticamente se dar por isso em Portugal, o Parlamento Europeu (PE) deu esta semana o seu consentimento a que o acordo de comércio e investimento entre a União Europeia e o Canadá (o CETA) siga em frente, o que terá, desde já, duas implicações muito relevantes.
Uma primeira é a aplicação provisional do acordo. Do âmbito desta aplicação pouco ficará de fora, pelo que as ameaças identificadas por mais de três milhões e quinhentos mil europeus e milhares de organizações dos mais diversos quadrantes da sociedade (ONG de ambiente, de defesa dos consumidores, sindicatos, organizações de produtores agrícolas, PME, municípios e regiões, organizações profissionais da área da saúde ou do direito e da justiça)  irão agora tornar-se realidade, com a conivência da maioria dos nossos representantes no PE.

Em relação aos representantes portugueses, a direita fez o que faz habitualmente, defender os interesses das grandes empresas e do comércio livre, mesmo que num modelo contrário aos objetivos do desenvolvimento sustentável. A posição mais surpreendente  deste grupo acaba por ser a de José Inácio Faria, eleito pelo Partido da Terra, mas que aparentemente se terá perdido do caminho que por cá defendeu.
Os deputados socialistas portugueses, com a honrosa exceção da deputada Ana Gomes, alinharam com a direita, ao contrário do que fizeram vários outros colegas de outros países. No discurso estão muito preocupados, mas na prática são incapazes de romper com o status quo. Os nossos representantes mais à esquerda votaram contra o acordo, como esperado.

A segunda implicação é que o CETA só poderá entrar em vigor na sua plenitude, nomeadamente nas provisões que atribuem às multinacionais o direito de processar os Estados quando estes regulam contra os seus interesses, mesmo que essa regulação seja em prol da saúde humana e do ambiente, após a aprovação pelos Parlamentos de cada país (nacionais e regionais – 38 no total).

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Anselm Kiefer- Os Sete Palácios Celestiais, 2002- derivação poética por João Paulo Soares


Parei nesta foto formidável de Anselm Kiefer e à distância do que vivemos nesta época, digo-vos: Como os rios e as árvores, assim são os livros. Fascinantes e livres e preciosos. Velhos, novos ou inacabados. São monumentos como a Natureza e da natureza feitos. Estão interligados com os autores e os leitores e as cidades e os minerais e a seiva. Proibidos, irreverentes, ocultos, explodem em regimes se mal geridos e interpretados. Outros são ramos. Outros são cânticos e como pequenos ramos, alguns gostaríamos de conhecer o todo...ficaram no pó ou sedimentaram-se com as rochas. E finalmente o próprio Homem em algumas épocas atiraram jóias inteiras nas fogueiras....

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

A biografia fascinante de Janusz Korczak


Janusz Korczak, pseudónimo de Henryk Goldszmit, também conhecido como o Velho Doutor ou o Senhor Doutor, nasceu em Varsóvia, no dia 22 de julho de 1878 ou 1879, e foi assassinado em Treblinka, no dia 5 ou 6 de agosto de 1942 foi médico, pediatra, pedagogo, escritor, autor infantil, publicista, activista social, oficial do Exército Polaco.

Foi um pedagogo inovador e autor de obras no campo da teoria e prática educacional. Foi precursor nas iniciativas em prol dos direitos da criança e do reconhecimento da total igualdade das crianças que hoje encontramos nas Escolas Democráticas.

Na qualidade de diretor de um orfanato instituiu, entre outros, um tribunal de arbitragem de crianças, no âmbito do qual as próprias crianças avaliavam as causas apresentadas por elas mesmas, podendo também levar a tribunal os seus educadores.

O famoso psicólogo suíço, Jean Piaget, que visitou o orfanato Dom Sierot (A Casa dos Órfãos), fundado e dirigido por Korczak, disse dele o seguinte: «Este homem maravilhoso teve a coragem de confiar nas crianças e nos jovens, com os quais trabalhava, ao ponto de transferir para as suas mãos as ocorrências disciplinares e de confiar a certos indivíduos as tarefas mais difíceis e de grande responsabilidade».

Korczak criou a primeira revista redigida a partir de textos enviados por crianças, que se destinava sobretudo a jovens leitores, A Pequena Revista. Foi igualmente um dos pioneiros dos estudos sobre o desenvolvimento e a psicologia da criança, bem como do diagnóstico da educação.

Era judeu-polaco que toda a vida afirmou pertencer às duas nações, a hebraica e a polaca.

Mais informação aqui

A comovente história da recuperação do Diário de Janusz Korczak, por um expatriado polaco, sem o qual dificilmente saberíamos com mais rigor todo o pensamento do Velho Doutor.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Ciência e tecnologia - Artigo científico

Ciência e tecnologia


Em historiografia e em filosofia da história, o progresso (do latim Progressus, "um avanço") é a ideia de que o mundo pode se tornar gradativamente melhor no que diz respeito à ciência, tecnologia, modernização, liberdade, democracia, qualidade de vida, etc. Embora o progresso esteja frequentemente associado à noção ocidental da mudança monótona de uma tendência, em linha reta, no entanto concepções alternativas existem, como a teoria cíclica do eterno retorno formulada por Friedrich Nietzsche, ou "em forma de espiral" o progresso da dialéctica de Hegel, Marx, entre outros. 
Por outras palavras, o progresso é entendido como um conceito que indica a existência de um sentido de melhorar a condição humana. A consideração de possibilidade foi fundamental para a separação da ideologia feudal medieval, baseada no teocentrismo cristão (ou muçulmano) e expresso na escolástica. A partir desse ponto de vista - o qual não é o único possível em teologia - o progresso é sentido quando a história humana provem da queda do homem (o pecado original) e o futuro tende a Cristo. 

A história em si, interpretada como providencial, é um parêntesis na eternidade, e o homem não deve ter esperança de participar em mais do que a divindade concedida pelo Apocalipse. A crise medieval e renascentista, com o antropocentrismo, resolveram o debate dos antigos e modernos, superando o Argumentum ad verecundiam (argumento de autoridade) e Revelação como fonte do conhecimento. Desde a crise da consciência europeia do final do século XVII e da era do Iluminismo do século XVIII tornou-se banal expressar a ideologia dominante do capitalismo e da ciência moderna. 
A segunda metade do século XIX foi o momento otimista do seu triunfo, com os avanços técnicos da Revolução industrial, no qual o imperialismo europeu estendeu o seu conceito de civilização para todo o mundo. A sua expressão máxima foi o positivismo de Auguste Comte. Embora os percursores pudessem ser evidentes, até depois da Primeira Guerra Mundial, não houve um verdadeiro questionamento sobre a ideia de progresso, incluindo a mudança do paradigma científico, as vanguardas na arte, e o reexaminar da ordem econômico-social e política que envolveram a Revolução Soviética, a crise de 1929 e o fascismo.
Texto completo: aqui

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

O fenantreno e alquilbenzenos provocam efeitos lineares no desenvolvimento larval e genes de muitos peixes


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O fenantreno, um dos muitos produtos químicos conhecidos como hidrocarbonetos aromáticos policíclicos foi identificada como a substância responsável por danos causados aos corações dos peixes expostos a derramamentos de petróleo, nomeadamente no desastre do Deepwater Horizon, da BP. A descoberta desencadeou alertas para a exposição de seres humanos ao mesmo produto químico no ar e na água. 
Ler mais em NOLA.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

Documentário - O que está errado com o Mundo? por John Perkins



Confesso que há muito tempo um livro não me perturbava tanto. Acho que o último que me deixou desorientado desta forma foi o “Sem Vestígios”, que tratava das confissões de um torturador do aparato de repressão brasileiro. Falo de “Confissões de um Assassino Económico”, de John Perkins.

A história do livro é a seguinte: um economista é recrutado para servir como “Assassino Económico” – ou simplesmente “AE” – durante a década de 70. Depois se torna presidente de uma empresa de energia alternativa até que se arrepende e resolve contar a sua história.

E o que seria um “AE” ? São técnicos – basicamente economistas – que têm a missão de gerar números fictícios a fim de respaldar enormes empréstimos de órgãos como Banco Mundial e o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), empréstimos impagáveis, e assim estabelecer uma relação praticamente colonial entre o país e os EUA.

Tais empréstimos eram utilizados em grandes obras de infra-estrutura, tocadas por empresas americanas necessariamente, que beneficiavam elites corruptas destes países. O preço a ser pago era a incapacidade de pagamento destes empréstimos e a consequente dependência total, com subserviência e facilidades de exploração de recursos naturais pelas empresas americanas.

O livro também relata que, quando os AEs, ou seja, a dominação económica, falhava, eram enviados os chacais, que removiam do poder via assassinato os presidentes que se opunham aos EUA . Cita explicitamente o caso dos Presidentes Omar Torrijos, do Panamá – que renegociou o Tratado do canal de mesmo nome – e Jaime Roldós, do Equador, que tentou expulsar as petrolíferas americanas de seu país.

Se nada desse certo, invasão pura e simples pelo Exército – i.e., Panamá e Iraque.

O esquema dos AEs é tão engenhoso que estes eram pagos por grandes empresas de consultoria, para que não aparecesse vínculo direto com o governo norte-americano ou suas agências de inteligência.

John Perkins trabalhou como um AE de 1971 a 1980. Esteve na Indonésia, Panamá, Equador, Irão, Arábia Saudita, Colômbia, entre outros. Saiu em 1980, fundou uma empresa de energia alternativa – onde teve o silêncio comprado através de diversas formas, vendeu a empresa, se tornou especialista em cultura indígena; até que o 11 de Setembro o fez finalmente escrever o livro.

Nos capítulos finais, analisa a questão da Venezuela – e a sorte de Chavez – e a do Iraque. Também disseca a sede dos EUA por petróleo e a miséria que no fim, toda esta dominação e o consumismo desenfreado causam.

Cunha o termo “corporatocracia”, para determinar as relações entre o governo e as grandes empresas, com pessoas indo de um lado para outro – no livro que li sobre a Monsanto este fenómeno é chamado de “portas giratórias”. Também determina a forma de imperialismo imposta ao restante do mundo.

O livro me deixou muito perturbado. Primeiro por mostrar quão sórdidas podem ser as pessoas quando buscam as suas realizações pessoais – mesmo que seu trabalho gere fome, destruição ecológica e de populações inteiras. Segundo, e isso já era tocado de leve no excelente livro do economista Joseph Stieglitz sobre globalização, por explicitar os métodos de dominação que representam instituições como Banco Mundial, BID e FMI. Terceiro por mostrar a influência que hábitos nossos do dia a dia exercem sobre populações inteiras. Quarto, pela influência do petróleo na história toda.

Indispensável.
Confesso que irei pensar duas vezes, a partir de agora, antes de por exemplo comprar um tênis Nike ou abrir uma Coca Cola – se bem que quase não bebo refrigerante. Pelo menos estou trocando meu carro por um mais económico.

Quando pensei este blog, a ideia era de lidar com alguns “fantasmas” que estavam em minha mente, bem como formatar opiniões e literatura e refletir um pouco sobre a correria atomata do dia a dia.

Vejo, felizmente, que além disso ele pode – e deve – engajar-se em causas justas. E este livro nos leva a pensar sobre um monte de coisa.

Saber mais:
Entrevista John Perkins

Agricultura - É assim que funciona o mundo ao contrário, por Luís Alves


O testemunho do Luis Alves do Cantinho das Aromáticas :
"Estou neste momento no processo de obter certificação bio para a quinta, que muitos colegas chamam a "multa por fazer tudo direito".

O motivo por que o fazem é porque o agricultor biológico não contamina ar, solo e água e é exponencialmente mais fiscalizado do que os produtores convencionais que contaminam todos estes elementos, cabendo depois sobretudo ao contribuinte a sua limpeza.

Este é um dos principais motivos pelo qual muitas vezes nos espantamos com diferenças de preço entre convencional e bio: um é indirectamente muito mais subsidiado do que o outro.
E ainda por cima para nos fazer mal!

O nosso certificado serve os clientes que não nos conhecem sobretudo, porque fraude também existe mas junto-me a muitos outros que já afirmaram que o ideal era mesmo a agricultura biológica deixar de existir por que toda seria biológica.

Ou então haveria somente "agricultura" e "agricultura poluente"!

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

Livro- Governação Comunitária das Florestas, para Crianças

Este livro destina-se a todos os compartes, profissionais, investigadores, professores e educadores que estejam direta ou indiretamente relacionados com as florestas comunitárias e que queiram abordar com crianças e jovens a governação comunitária de recursos naturais e a educação das crianças para a cidadania.


quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

Alejandro Alvarado - Para resolver problemas velhos, estude espécies novas


A Natureza é maravilhosamente abundante, diversa e misteriosa — mas a pesquisa biológica atualmente tende a focar-se apenas em sete espécies, incluído ratos, galinhas, moscas da fruta e nós. Estamos a estudar uma franja incrivelmente estreita da vida, diz o biólogo Alejandro Sánchez Alvarado, e esperamos que seja suficiente para resolver os problemas científicos mais velhos e mais complicados, como o cancro.


Nesta palestra visualmente cativante, Alvarado desafia-nos a interrogar o desconhecido e mostra-nos as descobertas incríveis que surgem quando o fazemos.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2017

Área de eucalipto vai ficar congelada até 2030

«O Ministério da Agricultura [de Portugal] encontrou uma nova base de sustentação para o diploma da reforma da floresta que trava o crescimento da área de eucalipto em Portugal: uma resolução do Conselho de Ministros do anterior Governo, com data de Março de 2015, que ao aprovar a Estratégia Nacional para as Florestas determinava o congelamento até 2030 dos 812 mil hectares dos povoamentos com eucalipto.»
Toda a matéria no Público

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

A União Europeia não cumpre a legislação ambiental


A União Europeia não cumpre a legislação ambiental, nomeadamente em relação À poluição atmosférica e aos resíduos. 23 dos 28 estados membros violam os padrões de qualidade do ar, o que é grave se soubermos que a poluição do ar foi responsável pela morte prematura de 520 mil pessoas em 2013. A plena aplicação das leis ambientais da UE «poderia poupar 50 biliões de euros por ano em custos de saúde e custos diretos para o ambiente», sugere o relatório da Comissão. Para além da poluição atmosférica, a Comissão diz que há grandes lacunas na gestão dos resíduos, na natureza e na biodiversidade, no ruído e na qualidade e gestão da água. A Alemanha e a Eslovénia foram os melhores na UE, por exemplo, na reciclagem de cerca de 60% dos seus resíduos urbanos em 2014, enquanto a Eslováquia e Malta foram os piores com taxas de apenas 12%.
Toda a informação detalhada na Reuters

domingo, 12 de fevereiro de 2017

Música do BioTerra: Sisters of Mercy- Suzanne


Counting the days in the haze around you
Susanne on the wall

No pain, summer rain
I'm lost for stupid again
we are the same
give it a name Susanne

counting the days in the haze around you
Susanne let the ether fall
out of phase, I am all around you
Susanne on the wall


sábado, 11 de fevereiro de 2017

Dia Internacional das Mulheres e Raparigas na Ciência

Em reconhecimento dos esforços da UNESCO, ONU Mulheres, UIT e outras organizações relevantes que apoiam e promovem o acesso das mulheres e raparigas à educação, formação e actividade de investigação científica, tecnológica, de engenharia e matemática,  a Assembleia-Geral das Nações Unidas adoptou a resolução A/70/474/Add.2, declarando o dia 11 de Fevereiro como o Dia Internacional das Mulheres e Raparigas na Ciência.
A ciência e a igualdade de género são dois fatores vitais para levar a cabo com sucesso a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável. Ao longo dos últimos 15 anos, a comunidade global fez muitos esforços para inspirar e envolver as mulheres e raparigas na ciência, mas, infelizmente, muitas continuam a ser excluídas desta área.
De acordo com um estudo levado a cabo em 14 países, a probabilidade de mulheres obterem o grau de licenciatura, mestrado e doutoramento em campos relacionados com a ciência é de 18%, 8% e 2%, respectivamente; enquanto que as percentagens masculinas são de 37%, 18% e 6%.
Saiba mais sobre o papel das mulheres nas investigações científicas: Women In Science And Research

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Um milhão de assinaturas para banir glifosato da União Europeia

Começou ontem, dia 8 de Fevereiro a recolha de assinaturas para proibir o uso de um dos principais componentes dos pesticidas ao nível mundial. O objectivo é recolher um milhão de assinaturas para levar problemática à Comissão Europeia.

Assinar e obter impressos aqui

O glifosato é o principal componente dos pesticidas ao nível mundial, sendo amplamente usado em agricultura e nas áreas urbanas. Nos últimos anos, tem gerado crescente discussão acerca da sua utilização. A partir desta quarta-feira, dezenas de organizações não governamentais (ONG) de toda a União Europeia (UE) iniciaram a mobilização de cidadãos para banir o glifosato. Em Portugal, as ONG envolvidas agregaram-se na Plataforma Transgénicos Fora.

A recolha de assinaturas foi criada enquanto iniciativa de cidadania europeia (ICE). A ICE é um instrumento de participação cívica introduzido pelo Tratado de Lisboa, que define a apresentação de propostas legislativas à Comissão Europeia mediante a recolha de um milhão de assinaturas. O objetivo desta iniciativa é travar a renovação da autorização de uso do glifosato.

“Existe alguma falta de dados concretos em relação ao seu impacto epidemiológico, ou seja, em relação ao impacto em pessoas expostas. No entanto, sabe-se que em animais de laboratório causa cancro. Sabe-se também que é o herbicida mais usado em Portugal e no mundo e que os portugueses estão particularmente contaminados”, afirma Mariana Silva, uma das coordenadoras da Plataforma Transgénicos Fora.

Com efeito, a substância foi classificada em março de 2015 pela Agência Internacional para a Investigação do Cancro da Organização Mundial da Saúde como “carcinogénica para animais de laboratório” e “provavelmente carcinogénica para o ser humano” .
O papel da Comissão Europeia

Todas as substâncias ativas utilizadas em pesticidas têm de ser aprovadas pela UE. O glifosato, em utilização desde os anos 70, está em processo de renovação da autorização. A Comissão Europeia estendeu o prazo da decisão de forma a aguardar a publicação de um parecer por parte da Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA), que estará pronto, no máximo, até ao final deste ano.

Entretanto, a Comissão Europeia fez recomendações aos Estados-membros, entre elas a minimização do uso da substância em parques e jardins de infância públicos. A Plataforma Transgénicos Fora considera-as “medidas positivas, mas que ficam ainda muito aquém do necessário para garantir a segurança dos portugueses”.

Mariana Silva considera que a ação da Comissão Europeia relativamente à problemática tem sido insuficiente. “A renovação da autorização do glifosato tem tido tantas falhas, tantas quebras de credibilidade, têm havido tantas notícias a expor a falta de transparência e de independência das sucessivas decisões, que as pessoas estão particularmente irritadas no que toca ao comportamento da Comissão Europeia e de outras estruturas europeias”, afirma a bióloga.

Por sua vez, a Comissão Europeia, em comunicação em junho de 2016, responsabilizava os Estados-membros pela inação face ao assunto. A instituição europeia chamou a atenção para o facto de não ter havido maioria qualificada nem no Comité Permanente nem no Comité de Recurso aquando da discussão do assunto.

Mariana Silva concorda que a responsabilidade também passa pelos Estados-membros, mas indica que “a Comissão Europeia tem, do ponto de vista político, a indicação clara de que a população europeia não quer a renovação do glifosato.” A bióloga remata: “O problema é que a Comissão Europeia não quer seguir essa indicação política e tem estado a fechar os olhos às indicações científicas”.
Portugal é o mais contaminado mas não faz análises

Análises a 26 voluntários portugueses demonstraram os níveis de contaminação mais altos de que há registo. A única exceção diz respeito a análises feitas nos Estados Unidos a agricultores que tinham acabado de aplicar glifosato nas colheitas. “Os voluntários [do estudo] não estavam a aplicar glifosato, portanto, para pessoas que não são agricultores nem têm exposição profissional, estes são os valores mais elevados alguma vez detetados no mundo”, explica Mariana Silva.

O estudo foi conduzido no ano passado pela Plataforma Transgénicos Fora em colaboração com o Detox Project. Esta foi a primeira análise feita no país em mais de uma década. As análises aos pesticidas estão regulamentadas em legislação europeia e incluem o glifosato. No entanto, em Portugal as análises a esta substância não têm sido realizadas, situação que Mariana Silva considera “completamente anómala”. A bióloga aponta o dedo aos “sucessivos governos que andaram a fechar os olhos”.
Falta de transparência e prazos a cumprir

Para além de querer banir o uso do herbicida, esta iniciativa tem como objetivos adicionais garantir a transparência e independência nos processos de autorização de pesticidas, bem como impor prazos obrigatórios para a redução progressiva do uso de todos os pesticidas.

“Neste momento, não há transparência. Os pesticidas e outros químicos são avaliados com base em estudos que não são publicados, secretos, que o público e cientistas independentes não podem avaliar, não podem criticar e não podem validar”, o que abre a porta “à corrupção e ao conflito de interesses”, afirma Mariana Silva.

Relativamente à redução progressiva do uso dos pesticidas, a bióloga explica que já existe legislação para conseguir essa redução, mas que a “Comissão ainda não avaliou se essa Diretiva está ou não está a cumprir essa função”.
Atingir um milhão em meio ano

A Comissão Europeia irá emitir uma decisão quando receber o parecer da Agência Europeia dos Produtos Químicos (ECHA), esperado até ao final de 2017. Isto significa que a iniciativa terá de recolher um milhão de assinaturas “até ao verão”, indica Mariana Silva.

“Esta iniciativa só faz sentido antes da Comissão Europeia comunicar a sua decisão. A partir do momento em que renove o glifosato por 10 ou 15 anos, a iniciativa perde o seu peso porque será muito mais difícil reverter. O Tratado de Lisboa prevê um ano para estas iniciativas, mas na verdade temos poucos meses”, explica a coordenadora da Plataforma Transgénicos Fora.

A bióloga acredita que já há muitas pessoas em alerta para o assunto, o que irá possibilitar a recolha do total de assinaturas. “Já há uma preocupação latente que agora esta iniciativa vai permitir trazer ao de cima”, explica.

“O sucesso desta iniciativa em Portugal vai depender exclusivamente da importância que as pessoas lhe derem”, afirma. Mariana Silva acredita, no entanto, que o facto da própria iniciativa existir já é sinal de mobilização e de preocupação pública.

Para que a iniciativa seja levada à Comissão Europeia, é preciso que sejam recolhidas, até dia 25 de janeiro de 2018, um milhão de assinaturas e que, pelo menos, sete Estados-membros atinjam um número mínimo de subscritores, que varia consoante o país.

Artigo editado por Filipa Silva

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

Roman Mars- Porque é que as bandeiras municipais conseguem ser as coisas mais mal concebidas e vocês nunca repararam


Roman Mars is obsessed with flags — and after you watch this talk, you might be, too. These ubiquitous symbols of civic pride are often designed, well, pretty terribly. But they don't have to be. In this surprising and hilarious talk about vexillology — the study of flags — Mars reveals the five basic principles of flag design and shows why he believes they can be applied to just about anything.

Biografia
Roman Mars é um produtor de rádio americano. Ele é o apresentador e produtor de 99% Invisible, um programa de rádio e podcast KALW, e fundador do coletivo de podcast Radiotopia, que ele descreve como ... Wikipedia (inglês)

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Conferência da ONU Sobre Biodiversidade Busca Ampliar o Diálogo com Setores Produtivos


Integração com setores produtivos, biologia sintética, questões indígenas, balanço das metas de Aichi são destaque na COP 13, em Cancún.

Preservar a vida no planeta deve ser responsabilidade de todos, não apenas de ambientalistas. Esta foi a principal mensagem que a reunião da Organização das Nações Unidas sobre conservação da biodiversidade buscou transmitir durante a Conferência das Partes da Convenção da Diversidade Biológica (COP 13, México). Sob o tema “Integração da biodiversidade para o bem-estar”, a Conferência reuniu pela primeira vez não apenas as lideranças ambientais dos países, mas também dos setores agrícola, florestal, pesqueiro e turístico. Setores que têm impactos positivos e negativos na biodiversidade.

Um exemplo da íntima relação entre a conservação da biodiversidade e o setor produtivo foi ilustrado por meio do Global Assessment on Pollinators elaborado pelo IPBES (Intergovernmental Science-Policy Platform on Biodiversity and Ecosystem Services) e já publicada aqui no Boletim. O relatório demonstra detalhadamente as relações entre declínio dos polinizadores e a produtividade agrícola e oferece subsídios para se elaborar ações de controle de invasoras, de apoio a comunidade locais e povos indígenas. As discussões intersetoriais foram de maneira geral consideradas construtivas, demonstraram comprometimento e foram além de temas previsíveis como certificações e relações de comércio. Ao final foi produzido um guia geral para questões que envolvem o uso da biodiversidade nos setores produtivos. O documento consolida, por exemplo, questões como compartilhamento de instrumentos da FAO (Food and Agriculture Organization das Nações Unidas) relacionados com governança dos recursos naturais, incluindo posse da terra e pesca em pequena escala. Críticas acerca do guia consideraram as ações pouco ambiciosas e que de certa forma já haviam sido contempladas anteriormente pela CDB (Convenção da Diversidade Biológica).

A Chamada Declaração de Cancún, acordada pela alta cúpula da Conferência, buscou apontar esforços adicionais dos líderes para que se cumpram as metas de biodiversidade com prazo para 2020 (Metas de Aichi) e acertaram medidas para acelerar seu cumprimento, entre elas mobilizar recursos financeiros.

O valor do conhecimento indígena e tradicional para a conservação da biodiversidade foi apresentado no estudo “Perspectivas sobre a biodiversidade local”. Reforçou-se a necessidade de se reduzir a distância entre a intenção, e o gesto quando se trata de respeitar o território indígena, principalmente no Novo Continente. Segundo relatórios apresentados pelo terceiro setor, ainda há muitos compromissos assumidos com os povos indígenas que não são respeitados.

Os territórios indígenas e de comunidades locais constituem grandes áreas de interesse para a conservação  da biodiversidade e a importância destas áreas está cada dia mais evidente. Segundo Bráulio Dias, o Secretário-executivo da CDB, “A área física ocupada por esses territórios é maior que a região de áreas protegidas no mundo”, por isso, a importância de reconhecer estas superfícies naturais. Repetidamente, buscou-se destacar relevância de se incluir indígenas e comunidade locais em decisões relacionadas à conservação da biodiversidade e não só governos.

Em relação ao balanço das Metas de Aichi – o plano que prevê deter a perda de biodiversidade do planeta, com metas que devem ser alcançadas até 2020 – apontaram-se avanços e desafios ainda por serem suplantados. Das 20 metas, a que reporta avanços importantes é aquela que dispõe sobre a criação de Áreas Naturais Protegidas terrestres e marinhas (Meta 11), que se acredita ser atingida até 2020. A meta que abrange a divisão justa e equitativa dos benefícios oriundos da biodiversidade, abarcadas no Protocolo de Nagoia (Meta 16), também progride com mais de 90 membros e mais 40 países que discutem suas regulamentações. Lamentavelmente o Brasil não faz parte deste grupo porque não ratificou o Protocolo de Nagoia. Já em contraste, a meta que se dedica à mobilização de recursos financeiros (Meta 20) é difícil de ser atingida, mesmo com o aumento das transferências internacionais dos países desenvolvidos para apoiar ações nos países em desenvolvimento. Ainda foram consideradas difíceis de serem atingidas as metas relacionadas aos ecossistemas muito vulneráveis (Meta 10), a que aborda a extinção das espécies (Meta 12) e a que abrange a perda de variedade genética em plantas e animais (Meta 13).

Tecnologias Emergentes
O tema das tecnologias emergentes foi o tópico quente da reunião em Cancún, México. A chamada biologia sintética (ou synbio) traz entusiasmo e temor. Se por um lado esta tecnologia aventa a possibilidade de novos usos industriais (cosmético, biocombustíveis, medicina, químico, etc), agrícolas e ambientais (bioremediação, controle de vetores de doenças e até resgatar diversidade genética de espécies em declínio), por outro, seus efeitos na natureza não podem sequer ser dimensionados, o que inspira precaução.

A biologia sintética é uma derivação do que inicialmente se iniciou com melhoramento genético, seguida pelas técnicas de inserção de fragmentos de DNA em genomas de outras células (os organismos geneticamente modificados, já abrangidos no Protocolo de Cartagena). Estas técnicas de engenharia genética envolvem intervenções mais profundas no genoma, gerando sequências que podem ser criadas, inseridas, deletadas ou transmitidas. Os impulsionadores genéticos (gene drivers), por exemplo, são capazes de transmitir uma dada herança para as próximas gerações. Uma aplicação que se vislumbra é a transmissão de esterilidade em espécies invasoras de culturas com o propósito de extermínio definitivo da espécie daninha. As sequências genéticas digitais são estruturas moleculares criadas por meio de programas de computador. Uma das polêmicas com relação a essa tecnologia reside na repartição de benefícios. Com a crescente disponibilização de sequências genéticas em banco de dados de livre acesso é possível, por meio da synbio, replicar moléculas. Na perspectiva dos países em desenvolvimento não importa se o produto final foi desenvolvido a partir de extratos de planta ou animal ou a partir da informação genética disponível em banco de dados. Logo, se houve benefício financeiro a partir do uso da biodiversidade ele precisa ser considerado  no mecanismo de repartição dos benefícios (Protocolo de Nagoia). Essa questão tornou-se mais proeminente com a redução dos custos de máquinas de sequenciamento genético. Do outro lado, os países ricos, os principais usuários dos recursos genéticos, não se dispõem a pagar por informações que, na visão deles, estão disponíveis gratuitamente.

Seus benefícios e impactos dividem as opiniões de especialistas. Por esta razão, houve um consenso de que é necessária uma regulamentação internacional deste quadro. Entretanto, considerando que não há ainda uma convergência de opiniões acerca do tema, foi solicitada uma moratória sobre os experimentos de biologia sintética. Os blocos africano e caribenho se posicionaram a favor dessa moratória, todavia, Brasil, Austrália e Canadá encabeçaram a pressão pela inclusão da biologia sintética na Convenção. Por fim, na Declaração de Cancún, não se aplicou o termo “moratória”, mas se faz uma sugestão pelo adiamento deste tipo de pesquisa. No que concerne o tópico sobre sequências genéticas digitais a rejeição foi unânime. Paralelamente, a CDB continuará com o grupo de trabalho focado na avaliação de risco da biologia sintética. O temor, entretanto reside no tempo em que isto pode levar uma vez  que já existem produtos derivados da synbio no mercado e que estes já foram liberados no ambiente.

Sobre a COP
A Conferência das Partes (COP) é a principal instância de decisões da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB) das Nações Unidas que se reúne a cada dois anos. A 13ª edição da COP, em Cancún (México), foi marcada pela presença de mais de 100 ministros de Estado de 196 países, 6.500 representantes dos setores públicos e privados que se reuniram para negociar acordos e compromissos para a conservação dos ecossistemas, o uso sustentável da biodiversidade, a implementação do Plano Estratégico para a Biodiversidade 2011-2020 e as metas de Aichi.

Aconteceram paralelamente a COP 13, a 8ª Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena sobre Segurança Biológica (COP/ MOP 8) e a 2ª Reunião das Partes do Protocolo de Nagoya sobre Acesso e Repartição de Benefícios (COP/ MOP 2).

O Brasil foi representado na COP 13 pelos ministros do Meio Ambiente, Sarney Filho, e Agricultura, Blairo Maggi.

As sedes para as próximas Conferências das Partes são Egito (COP 14), em 2018, seguido por China (COP 15) e Turquia (COP 16).

Por fim, foi anunciada a nova Secretária Executiva da CDB, Cristiana Paşca Palmer, da Roménia. A Sra. Palmer irá substituir o brasileiro Bráulio Dias que permaneceu no cargo por cinco anos.

terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

International Clash Day


O International Clash Day é uma tradição recente, iniciada pela rádio norte-americana KEXP, em fevereiro de 2013. Tudo começou quando o locutor John Richards pôs “no ar” uma música do The Clash no seu programa matinal.

Enquanto a canção tocava, um ouvinte enviou um e-mail para a estação solicitando que passassem mais temas do The Clash, pedido ao qual Richards correspondeu. Assim, ele passou um tema atrás do outro ao longo do seu Morning Show, gerando enorme burburinho e entusiasmo junto da comunidade de fãs e seguidores da FM de Seattle.

Desde esse dia ímpar na história da KEXP, o International Clash Day é comemorado por diversas rádios espalhadas pelo planeta, com programações dedicadas à herança deixada por essa que é uma das mais importantes bandas do século passado.

“Nós somos anti-fascistas, nós somos anti-violência, nós somos anti-racistas, e nós somos pró-criativos. Nós somos contra a ignorância” - Joe Strummer

Saber mais:

Nasceu o primeiro tapete de cortiça feito em tear

 
O mercado vai conhecer, a partir de agora, um novo tipo de tapete. É feito em cortiça, sendo o primeiro obtido por tecelagem. O mérito pertence à marca Sugo Cork Rugs, propriedade da empresa TD Cork – Tapetes Decorativos com Cortiça, a segunda startup lançada pela Amorim Cork Ventures, a única incubadora do mundo exclusivamente dedicada a negócios deste setor de atividade.
 
A inovação deu origem a pedido de patente em Portugal, uma vez que recupera técnicas tradicionais de tecelagem para criar os primeiros tapetes em cortiça produzidos utilizando aquele método antigo. “Na génese da conceção do novo tapete, existiu vontade de inovar na utilização de matérias-primas e de utilizar materiais ecológicos. Houve, no entanto, necessidade de desenvolver um material para ser trabalhado em tear, com vista à sua utilização em tapetes”, explica a designer Susana Godinho, que lidera a startup, juntamente com a gestora Sónia Andrade.
 
“Quando analisámos a proposta de valor da Sugo Cork Rugs, imediatamente nos apercebemos que estávamos perante uma ideia com muito potencial para o mercado global, onde tipicamente nos posicionamos. O tapete em cortiça concebido em tear era algo que não existia”, afirma Nuno Barroca, vice-presidente da Corticeira Amorim.
 
Os tapetes são versáteis e funcionais, com as mais-valias que resultam da incorporação de cortiça, isto é, beneficiam de um melhor isolamento térmico e acústico face aos produtos mais tradicionais, proporcionando mais conforto e propriedades antialergénicas. De entre as mais-valias da nova marca, destacam-se ainda as suas características naturais, uma diversidade de padrões e de cores a que se junta um novo conceito criativo e inúmeros benefícios de desempenho, nomeadamente em termos de durabilidade e anti-humidade.
 
Portugal é considerado uma referência mundial na indústria de tapetes dirigidos ao segmento médio-alto e alto, de que são exemplos os tapetes de Beiriz ou de Arraiolos. É também neste segmento que se posicionam os novos tapetes, que congregam num único produto duas indústrias em que Portugal é amplamente reconhecido: cortiça e a tecelagem de tapetes. “Em termos globais, as exportações deste segmento (tapetes e outros revestimentos têxteis) devem rondar os 100 milhões de euros”, afirma Susana Godinho. O mercado português é maioritariamente virado para as exportações como o atestam os valores apurados pelo Instituto Nacional de Estatística nos últimos anos (ver gráfico interativo). Segundo a APCOR, a indústria da cortiça terá fechado 2016 com um novo recorde histórico de exportações.
 
Sendo a cortiça um dos bens mais exportados por Portugal, a nova criação apoiada pela Amorim não fugirá à regra. Quais são os mercados alvo? ” Para este processo de internacionalização, a TD Cork pediu já o apoio do programa Portugal 2020. Uma aposta que envolverá contactos com revendedores dos principais mercados externos, gabinetes de arquitetura e design, bem como a participação nas feiras e eventos mais relevantes. Dadas as valências da coleção Sugo Cork Rugs e o conhecimento que temos dos mercados, antecipa-se uma boa aceitação, em especial nos EUA, países nórdicos, Reino Unido e Ásia, para onde canalizaremos numa primeira fase os nossos esforços, designadamente junto do público que aprecia produtos naturais e sustentáveis”, diz Susana Godinho.
 
O investimento realizado não é revelado, mas a designer sublinha a importância do apoio da Amorim Cork Ventures para a criação da empresa e de uma linha de produção com teares tradicionais de tapeçaria, necessária para a criação de protótipos e conceção da primeira coleção que agora é apresentada ao mercado. “Até ao momento, o investimento foi essencialmente canalizado para: unidade industrial, linha de produção própria, que implicou a aquisição de dois teares tradicionais de tapeçaria”. Susana Godinho revela ainda que a TD Cork candidatou-se ao apoio do programa Portugal 2020, “para continuarmos a apostar no processo de inovação ao nível do desenvolvimento da produção”.

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Ensino e Ser Professor- Já no tempo de Salazar se sabia

 
Citação de José Matias Alves. Fonte: Mais Família Menos Escola
"Ora, a forma como se exerce o ensino (…) transcende a feição burocrática dos serviços públicos.
Não podem ser objecto de ordens,... e reclamam antes uma fiscalização, até porque, em regra, nem são funcionários do Estado aqueles cuja acção é fiscalizada. E mesmo quando – como sucede com os médicos escolares, ou com os professores oficiais – esses indivíduos são funcionários, eles não estão sujeitos a determinações ou ordens relativas aos serviços que executam como os outros funcionários. A um professor nada se pode ordenar concretamente sobre o exercício das funções. Nenhum director geral pode dizer a um professor que ensine desta ou daquela maneira. Pode, porém, haver uma Inspecção que verifique se eles cumprem os seus deveres.
Um professor não pode deixar de ter liberdade."
 
In António Pires Lima (1945). Administração Pública, Porto: Porto Editora

O Aroma do Tempo


Byung-Chul Han aborda neste livro daquilo que considera ser uma crise temporal.

Segundo o filósofo germano-coreano, não estamos perante uma aceleração do tempo, mas sim de uma atomização e dispersão temporal. É isso que faz com que qualquer instante pareça igual a outro e não exista nem um ritmo, nem um rumo, que confira significado às nossas vidas.

Numa constatação que tem que ver com as conceções de Zygmunt Bauman sobre a atual «sociedade líquida», Byung-Chul Han diz que tudo é vivido como efémero, sensação essa em que nós próprios estamos incluídos. É assim que a morte surge como um instante mais, prematuro e quase sempre sem sentido.

Tal como nas suas obras anteriores, de A Sociedade do Cansaço até A Agonia de Eros, aborda as causas dessa evolução e reflete sobre a possibilidade de a inverter. Para o filósofo, o final do tempo como duração narrativa não teria de implicar um vazio temporal. Existe, pelo contrário, agora a possibilidade de uma vida que prescinda da teologia e da teleologia e que apesar disso tenha um aroma próprio. Para isso seria necessário recuperar conceitos de Hannah Arendt, pois a crise temporal só poderá ser ultrapassada quando a vita activa acolher de novo a vita contemplativa.

domingo, 5 de fevereiro de 2017

Música do BioTerra: Moby - These Systems Are Failing

Um novo manifesto ecologista Moby
Um ecovídeo com amostragem de 3 temas incluídos.




sábado, 4 de fevereiro de 2017

Poema da Semana: Gira-se em torno de um pensar azul, por Isabel Rosete


Maurice Sapiro

Gira-se em torno de um pensar azul, por Isabel Rosete
(Sob a inspiração de Teixeira de Pascoaes)

No incêndio dos vivos e dos mortos
Clama-se pela essência da Humanidade...
Em estreitas barreiras encurraladas
Ou alongadas por um Destino
Que permanece sempre o mesmo
Na sua giratória e mudança obrigatória.

Gira-se em torno de um pensar azul,
Onde o Infinito se manifesta
Em todas as suas margens
In-distintas, na proximidade
Do Indefinido dos montes,
Ao longe avistados, na sua intersecção
Com o Horizonte longínquo.

Árvores altivas e espinhosas
Soltam um grito verde-seco,
Que ecoa com os cantos dos corvos negros,
Amarelos de fome agourenta.

O Homem sem leme está aí
No rosa - claro do mistério insondável
De todas as rodas vermelhas sem par.

- Eis essa pequena criatura insatisfeita!
Vive entre a beleza da Esperança
E o desespero tormentoso dos sentidos
Despertos para qualquer modo do Sentir
Imposto por convenção.

Isabel Rosete

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Um livro com sementes que depois de lido planta-se



A incorporação de sementes em objetos do dia-a-dia é cada vez mais comum, com o objetivo de aumentar o seu valor e chamar a atenção para a conservação da natureza e da floresta. Com estes conceitos em mente, a editora de livros infantis Pequeño Editor criou o primeiro livro com sementes que pode ser plantado depois de lido.
Livro com sementes da Pequeno Editor

Na produção de papel e livros são precisas muitas árvores e muitos litros de água são gastos. Com o objetivo de incentivar a sustentabilidade e desenvolver a consciência ambiental, a editora argentina de livros infantis Pequeño Editor publicou um “livro árvore”, em parceira com a agência de publicidade FCB Buenos Aires.

Os exemplares do livro “Mi papá estuvo en la selva“, ou seja, “O meu papá estava na selva” foram feitos a partir de tintas ecológicas e papel reciclado. Os livros possuem sementes de jacarandá, uma árvore em vias extinção, principalmente na Argentina, incorporadas no papel.

Quando a criança termina de ler o livro, ela pode plantá-lo e ver o crescimento de uma nova árvore, devolvendo à natureza o que dela foi retirado.

O livro com sementes conta uma estória cheia de ingenuidade e humor sobre uma viagem na selva equatoriana do ponto de vista de uma criança.

Descobre algumas páginas deste livro clicando aqui.

Este não é o primeiro objeto a incorporar sementes nos seus produtos, outros exemplos são os lápis com sementes da Sprout, a BioUrn, uma urna biodegradável para animais de estimação ou pessoas falecidas, ou o copo de café que se planta.

Fonte: Hypeness e Noctula Channel

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

As neurociências ensinaram-me a fazer menos julgamentos sobre os outros”, por Rui Costa


Rui Costa, que dirige um grupo de investigação no centro de neurociências da Fundação Champalimaud, fala em entrevista ao DN do seu trabalho, de algumas das suas descobertas e desse órgão complexo e maravilhoso que é o cérebro humano
Na Guarda, onde nasceu e cresceu, e na aldeia dos pais, lá perto, Rui Costa aprendeu a amar a natureza. Na televisão, David Attenbouroug falava-lhe doutros mistérios e ele acabou por ir para veterinária, para poder estudar o comportamento animal. Daí às neurociências foi um passo. Já fez várias descobertas, algumas das quais poderão conduzir a novas terapias para doenças como a de Parkinson, ou os distúrbios da compulsão. Dirige um grupo de investigação na Fundação Champalimaud. É lá, no seu gabinete fronteiro ao Tejo, que nos encontramos, numa manhã cheia de sol.
Primeiro formou-se em veterinária e depois vieram as neurociências. Não foi uma grande reviravolta?
Pode parecer, mas a minha inclinação para veterinária aconteceu porque eu gostava de comportamento animal. No estágio fui para a Suécia fazer investigação em comportamento animal, sobre a amamentação. Fiz manipulações com a oxitocina, a hormona que está relacionada com a ligação mãe-filho e com a ejeção do leite. Pus cateteres nos animais e por controlo remoto conseguia dar mais oxitocina ou bloqueá-la para ver o que acontecia.
Percebeu coisas novas?
Sim. Há uma teoria chamada optimal foraging, ou valores de otimização mínima, segundo a qual há uma estratégia ótima para explorar o mundo para um objetivo. Descobri que isso se aplica à amamentação. A cria mama numa glândula e quando o leite diminui muda para outra, e isso é governado pela oxitocina. No estudo, se eu injetava mais hormona na mãe, a cria ficava mais tempo a mamar numa glândula, se bloqueava, ela mudava. Vimos que o padrão obedece àquela teoria e descobrimos que aquele comportamento não é inato, é aprendido, e leva três ou quatro semanas a ficar ótimo. Pensei que devia estar ali a acontecer qualquer coisa e, então, um professor de etologia disse-me: "Isso já não é etologia, é neurociência". E eu pensei: então é isso que quero fazer.
Que idade tinha?
Tinha 23 anos, e regressei a Portugal. Entrei no programa de doutoramento GABBA[ Biologia Básica e Aplicada] da Universidade do Porto e dei-me conta de que a neurociência clássica estava à beira de uma grande revolução, com a biologia molecular e a genética. Percebi que tinha de fazer neurociência ligada à genética. Fiz o doutoramento nos Estados Unidos com um português, o Alcino Silva, a primeira pessoa que fez uma mutação genética no cérebro de um ratinho. Escolhi a área de aprendizagem de memória, com um estudo sobre a neurofibromatose do tipo 1, uma doença causada por mutações num gene, que causa deficiências de aprendizagem. Criámos um modelo em ratinho, com as mesmas mutações, e isso permitiu-nos estudar o que acontece quando há memória e aprendizagem normal e quando há a mutação.
E o que viram?
No cérebro há neurónios inibitórios e excitatórios e o que vimos foi que a inibição dos neurónios está aumentada com a mutação, porque há uma molécula sobreactiva. Conseguimos diminuir a inibição dos neurónios e baixar a atividade da molécula, e verificámos que isso normalizava os problemas de aprendizagem. Foi a primeira vez que se falou numa doença ligada a este equilíbrio de excitação e inibição nos neurónios e também que se conseguiu reverter problemas de aprendizagem no rato adulto, e depois em adolescentes e adultos humanos. Esta é uma doença do neurodesenvolvimento e há a ideia de que, se se perde a janela da aprendizagem, depois já não há nada a fazer. Nós verificámos nesta doença que não é bem assim. Isso depois levou a ensaios clínicos, em que participou o Alcino Silva. Eu já não estava envolvido, mas continuo a seguir esses estudos.
Já existe uma terapia?
Há vários compostos em estudo. Ainda não há resultados dos últimos ensaios clínicos, mas há algumas indicações positivas anteriores. Há muitos fármacos que já foram testados em pessoas e que são seguros, mas que foram testados para outras coisas. E para este tipo de doença, há um ou dois desses que, se funcionarem, já estão aprovados. A minha filosofia é a de que para muitas doenças pode-se encontrar soluções.
É o caso dessa doença?
É. No meu trabalho estudo coisas interessantes, mas ligadas a um problema, ou uma doença, porque sei que isso é relevante. Depois do doutoramento sobre as memórias, decidi estudar a aprendizagem das ações. É incrível o que nós, humanos, fazemos com a informação. Construímos edifícios, criamos carros e máquinas. É a nossa capacidade de mudar o mundo. Isso interessava-me muito. Por exemplo, como é que iniciamos uma ação de forma espontânea? O que governa essas coisas em nós? E depois, se gostamos de qualquer coisa, como voltamos a fazê-la? Como é que o cérebro sabe, e como ganhamos uma capacidade que parece inata, mas que foi aprendida?
Como é que essas coisas se estudam no laboratório?
Há uns anos, tudo isto era do domínio da filosofia. Mas há pessoas que não conseguem iniciar ações espontâneas, que são os pacientes de Parkinson. No cérebro destes doentes os neurónios da dopamina na zona lateral morrem. Nós vimos que estes neurónios são fundamentais na atividade neuronal para a iniciação do movimento, e que há duas vias para isso: uma direta e uma indirecta. Pensava-se que estes circuitos neuronais eram como um acelerador e um travão. Nós descobrimos que estão os dois ativos e que são ambos importantes para a ação, e agora pensamos que uma, a via direta, é mais importante para iniciar e sustentar a ação, e a outra para mudar de ação. Há doenças, por exemplo, em que o problema é fazer esta mudança da ação, como nas compulsões, ou no autismo. A nossa hipótese é que na compulsividade a via indireta está menos ativa, ou a direta está mais, e no défice de atenção seria o oposto. O que se vê em termos de sintomas são coisas muito diferentes, dependendo de onde está a desregulação, mas há circuitos em comum que aprendem e controlam ações. As doenças oferecem-nos janelas para percebermos o que está a acontecer, e isso depois ajuda-nos a encontrar soluções para as doenças.
E quando poderá haver novas terapias para as doenças ligadas a esses circuitos da ação?
Talvez dentro de 10 anos. Sou um otimista.
O seu grupo participou no projeto Brain Flight para fazer voar um drone só com o pensamento. Como se põe um drone a voar assim?
Neste momento já fazemos voar um avião. A Daimler modificou um avião e há duas semanas e meia [no princípio de dezembro], em Munique, fizemos isso. O piloto, a certa altura, no ar, largou os comandos e fez o voo só com comando cerebral. Há várias formas de fazer isso. Uma é perceber o que acontece no cérebro quando se mexe um braço, por exemplo, e depois usar isso para um comando. Outra é pedir à pessoa que pense, por exemplo, em nuvem, e a essa atividade cerebral atribuir o comando de viragem à direita. Depois, pensar em Sol para virar à esquerda, e assim fazer um classificador. A terceira, que é o nosso trabalho, é através da aprendizagem de ações.
Como é que isso funciona?
No fundo é muito simples. Quando nascemos não sabemos controlar os braços ou as pernas, mas aprendemos e ao fim de muita prática isso automatiza-se de forma natural. Quando aprendemos a mexer um cursor num computador, com um rato, é a mesma coisa. Ao fim de uns dias a experimentar, a pessoa fica muito boa naquilo. Então pensámos: vamos fazer a mesma coisa. Temos o jogo do avião, ligamos a atividade do cérebro ao jogo com elétrodos externos que medem essa atividade, e o avião anda para a esquerda e para a direita, como o cursor do computador, baseado só na atividade do cérebro. No início não se consegue, até que se começa a ter algum controlo, e ao fim de duas semanas, em média, as pessoas estão acima dos 80% no número de vezes que querem ir para um lado, ou para outro, e vão.
Mas as pessoas pensam em quê?
No início podem pensar em relaxar, ou em concentrar-se. Mas ao fim de duas semanas pensam: quero ir para a esquerda. E vão para esquerda. Depois de 15 dias deste treino paramos três semanas. A seguir as pessoas voltam e fazem aquilo na mesma, sem problemas.
É como andar de bicicleta?
É, e era isso que queríamos. Ou seja, conseguimos aprender uma coisa nova, o cérebro sabe fazê-lo. E nós sabemos como é que ele aprende. Portanto, em vez de tentarmos imitá-lo, fazemos com que ele aprenda outro instrumento, porque ele tem capacidade para usar mais instrumentação, para além do próprio corpo.
Como lhe surgiu essa ideia?
Não sei. Fiz teatro amador, e pensei muito sobre a ação do ponto de vista do ator. Sempre me interessou muito isto da ação e do movimento.
O que é que os estudos das neurociências lhe ensinaram sobre a natureza humana?
Ensinaram-me muito. Por exemplo que a memória é uma coisa relativa e que as pessoas têm naturalmente perceções diferentes. Isto ajudou-me muito porque me fez olhar para a diversidade das pessoas e de comportamentos, com menos julgamento sobre os outros. Nesse sentido, mudou muito a minha visão dos outros.
E a nossa mente? Ela está no cérebro?
Acho que sim. A minha opinião é que está nos cérebros: no nosso cérebro e no cérebro dos outros, e a comunicação entre cérebros cria coisas maiores do que no cérebro de cada um. Por exemplo, aquilo que chamamos inteligência coletiva.
Como se houvesse uma mente coletiva?
Sim, mas não é uma coisa etérea. É o cérebro construído, mapeado no mundo. Hoje, por exemplo, guardamos muito da nossa memória em computadores. Isso é parte da mente? Se estiver ali só guardado, não. Mas aquilo em utilização é parte da minha mente. É o cérebro mapeado ao mundo.
O que é que isso quer dizer?
Há uma mente muito básica, mas o resto é o mapeamento que se faz ao longo do desenvolvimento de cada um, na relação com o mundo e com os outros, e que cria complexidades. O nosso cérebro não é biologicamente diferente do cérebro do homem das cavernas. No entanto, cada um de nós aprende a história da humanidade em capacidades e cultura. Cada geração aprende os skills todos. Biologicamente a mente é a mesma, mas o conteúdo de cada desenvolvimento individual é um sumário da história humana. O cérebro seria o hardware onde se constrói a mente, e não se pode explicar a mente só com o hardware. É preciso estudar a dinâmica de como o hardware se constrói culturalmente e evolutivamente.
Haverá coisas nunca chegaremos a perceber sobre o cérebro?
Se falarmos do hardware, acho que é possível conhecer tudo. Mas se falarmos de tudo o que o cérebro faz, e nós não conhecemos os limites do que ele pode fazer, é diferente. O cérebro que percebe muda e passa a haver o cérebro que sabe que sabe. A partir do momento em que percebemos, há um novo nível de mente. Será que conseguimos perceber o cérebro que sabe que sabe?
Essa seria a última fronteira do estudo do cérebro?
[Risos] Espero que sim, para termos que fazer, porque eu gosto muito de estudar.