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quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

O mais e o menos do Portugal agrícola

Nesta semana estou a fazer balancetes de sectores-chave para políticas mais sérias e assertivas num Portugal em rápida mudança, mas imensamente desfocado e "seduzido", "trabalhado", "condicionado" pela média e depois resulta que textos como este, se percam e retirem os leitores de uma focagem sobre um tema caro: a alimentação, os custos e o estado da arte, sobretudo no que nos diz mais respeito, isto é, Portugal. Assim, republico esta notícia/crónica que vai de encontro ao que eu referi.

Factor humano é uma das maiores limitações
Os pontos fortes
O sector leiteiro Portugal não só é capaz de produzir o leite que consome como ainda dispõe de uma ligeira margem para exportar. Mais: num sector aberto ao investimento estrangeiro, as marcas nacionais continuam a dominar o mercado. O sucesso do sector resulta em grande parte do trabalho da rede de cooperativas do Norte e do Centro do país que se uniram para criar o gigante Lactogal. A concorrência e a procura da eficiência afastaram dezenas de milhar de pequenos produtores do negócio e, nos dias de hoje, a redução dos preços está a causar ameaças aos que restam. Mas, numa área difícil, a agricultura nacional saiu-se bem.
Azeite É talvez o mais fulgurante caso de sucesso dos últimos anos. Por volta de 1960, a produção de azeite foi ameaçada pelos incentivos políticos concedidos aos óleos vegetais. Quando entrou na CEE, Portugal importava mais de três quartos das suas necessidades, embora reexportasse uma parte. A cultura caiu no esquecimento, mas uma série de investimentos espanhóis, nota Sevinate Pinto, “ensinou-nos como se faz”. Ainda que tenhamos de comprar quase metade das nossas necessidades, na última década fez-se o maior olival do mundo, a área cresceu 10 mil hectares entre 2005 e 2009 e quando os jovens olivais entrarem em produção Portugal pode ficar perto da auto-suficiência.
Frutas e legumes Há anos que se anunciava o potencial nacional para as frutas e legumes e agora esse potencial começa a dar frutos. No ano passado, as exportações do sector ficaram quase 200 milhões de euros acima das do vinho. Sem alarido, nas zonas do Oeste ou no vale do Mira, jovens empresários, voltados para o mercado e abertos à exportação começaram a tornar o sector num caso sério. Portugal é excedentário em legumes, mas, apesar do lento salto na produção de fruta, ainda depende em 35 por cento do que consome do exterior. O país está ainda a ganhar fôlego em novas produções, com o destaque para o kiwi.


Vinhos Os vinhos portugueses ganham cada vez mais prémios internacionais, mas, se não fosse a expressão do vinho do Porto, que vale quase metade dos 594 milhões de euros exportados em 2009, o desempenho externo do sector seria duvidoso. Ainda assim, a viticultura e a enologia deram saltos para níveis internacionais, há empresas com músculo (a Sogrape tem propriedades na Argentina e na Nova Zelândia) e mercados que começam a ficar consolidados, como o do Brasil ou de Angola. No ano passado, as exportações cresceram 17 por cento.

Os pontos fracos
Cereais Em 1990, a agricultura produziu 44,2 por cento das necessidades de consumo de cereais; em 2008, já só respondia por 25,3 por cento. Durante os primeiros anos da PAC, os preços altos ou os subsídios foram mantendo o nível produtivo; quando, depois de 2005, as ajudas da PAC começaram a ser pagas sem qualquer ligação às sementeiras ou às colheitas, os agricultores fizeram as contas e concluíram que a venda de grão não dava em muitos casos para compensar os gastos com adubos ou mão-de-obra. Metade da área foi retirada da produção e em muitos casos transferida para pastagens, nota António Serrano. As condições do solo e do clima nacionais não tornam a produção competitiva.
PAC A arquitectura da PAC foi feita a pensar no Norte da Europa e não no Mediterrâneo. Por exemplo, os cereais ou a carne bovina são altamente subsidiados, mas as frutas e os legumes não. E como o valor dos subsídios se associa aos índices históricos de produtividade, uma agricultura atrasada como a nacional ficou condenada a ser uma espécie de parente pobre . Depois de 2005, a PAC mudou e cristalizou este modelo, concedendo um “pagamento único” por exploração com base nesses índices. Ao permitir que o agricultor escolha o que fazer nas terras, promoveu o abandono de áreas menos competitivas. A nova PAC, prevista para 2013, corrigirá esta situação.
Perfil dos agricultores Há 30 anos, um milhão de portugueses trabalhava na agricultura (nem todos a full-time); em 2009, resistiam 540 mil. Quem ficou? Os mais velhos. Quase 45 por cento têm mais de 65 anos. Nem um por cento tem formação agrícola completa, contra 8,7 por cento da média europeia. Alguns, poucos, lideram empresas, que representam dois por cento das explorações. Não há um retrato padrão dos agricultores, mas sabe-se que, na maior parte dos casos, estão longe de ser capazes de responder à competição actual.

por Manuel Carvalho em Público (8/3/11)

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