Quase todos os dias assistimos ao drama associado à migração de pessoas em busca de melhores condições de vida. Bem perto de nós, sucedem-se os naufrágios no Mediterrâneo, e apesar de interpelados pela tragédia e pelo desespero de homens, mulheres e crianças, não conseguimos pôr termo a tanto sofrimento e consensualizar uma solução. Por outro lado, numa contradição em que a humanidade parece ser pródiga, nunca a economia mundial gerou tanta riqueza, mas a sua distribuição não é uniforme e a desigualdade continua a prosperar. De acordo com a informação publicada por organismos internacionais dedicados, cerca de metade da riqueza mundial está na posse de cerca de 1.1% dos mais ricos, enquanto os 55% mais pobres do mundo – mais de 4 mil milhões de pessoas – detêm apenas 1,3% da riqueza global. Esta disparidade não seria tão chocante se aqueles que ficam com uma pequena parte tivessem o suficiente para viver uma vida digna. Infelizmente, sabemos que não é assim; cerca de 10% da população mundial vive em condições de extrema pobreza.
À pobreza e carência de recursos que esta condição significa, acrescenta-se a falta de poder e influência. Invariavelmente e à escala universal, as taxas de pobreza são mais elevadas entre os jovens ou idosos, não brancos, mulheres, e aqueles que têm níveis mais baixos de educação. Por outro lado, muita riqueza garante a influência sobre a maioria das decisões, o que se traduz numa situação em que, por exemplo, os principais partidos políticos de um país são financiados pelos mais ricos e pelas empresas que existem para gerar lucros para distribuir por indivíduos maioritariamente ricos.
É neste contexto de profunda desigualdade económica e social, que o mundo enfrenta agora uma crise planetária, destacando-se o impacto das alterações climáticas, da desflorestação, da perda de biodiversidade ou da escassez de água doce. A crise social agrava a crise planetária. Quando analisamos a problemática das alterações climáticas, verificamos que 10% das economias mais ricas emitem cerca de 50% das emissões de gases com efeito de estufa, enquanto os 50% mais pobres geram apenas 7% das emissões. Ou seja, os países mais afetados pelas alterações climáticas são os que menos fizeram para as causar. Importa ter consciência que as alterações climáticas estão já a matar pessoas, desde logo, pelo impacto na saúde e pela perda da produtividade agrícola e menor acesso a bens alimentares.
É tempo de afrontar um sistema económico absurdo e injusto, baseado no crescimento medido em Produto Interno Bruto (PIB). Quando nos concentramos no PIB, omitimos o essencial: a construção de uma economia que funciona para as pessoas e para o planeta. Como Robert F. Kennedy muito bem expressou em 1968, o PIB “mede tudo (...) exceto o que faz a vida valer a pena”.
Continuar a fazer crescer a economia através de uma insana delapidação de recursos, esperando que a riqueza verta para os cidadãos mais pobres, não alivia a pobreza e convida ao colapso ambiental. Se estamos a transgredir as fronteiras planetárias agora, como pode o planeta sustentar uma economia que será quatro vezes maior em menos de 5 décadas? Precisamos de uma economia capaz de dar resposta às pessoas e respeitar os limites do planeta, reduzindo a pegada material. Precisamos de abandonar o PIB como a principal medida de prosperidade e começar a medir as coisas que importam, construindo um mundo sem pobreza e sem indústrias nocivas para o planeta e para as pessoas. Para resolver a crise planetária, temos que priorizar as pessoas e criar uma sociedade mais igual e mais justa, e não permitir que o excesso de riqueza resulte num poder absurdo e desproporcionado.
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