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segunda-feira, 29 de janeiro de 2024

O estado de Israel usa a lavagem rosa para demonizar a Palestina. Mas há quem o denuncie


A propaganda de Israel usa o pinkwashing para minimizar a homofobia no país e maximizá-la na Palestina. Quer criar uma oposição binária que, quando justaposta, demonstra a sua suposta superioridade civilizacional para ganhar apoio para levar a cabo o extermínio do povo palestiniano.

Multiplicam-se os crimes de guerra hediondos cometidos pelo Estado de Israel na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. Já se cumpriram mais de 100 dias desde o início da fase mais recente e mortífera deste outrora chamado “conflito”, cuja dimensão genocida e colonialista se tornou difícil de ocultar aos olhos do mundo.

Entretanto, aguarda-se, da parte do Tribunal Internacional de Justiça, a decisão sobre a acusação de genocídio do povo palestiniano defendida pela África do Sul e apoiada por várias nações do Sul global. O desenlace será decisivo: ora dará carta branca a outras potências imperialistas para aniquilar populações a seu livre desígnio, ora criará mais uma condenação que Israel não tem incentivo para respeitar, erodindo ainda mais a autoridade dos órgãos internacionais.

Para largos setores da sociedade civil, é incompreensível que um genocídio possa ser levado a cabo com o conhecimento do mundo e o apoio tácito dos dirigentes políticos do Norte global, incluindo dos de Portugal. Para aqueles já próximos da causa palestiniana - que se distingue de outras lutas pela libertação precisamente pela sua relativa visibilidade há largas décadas -, esta incompreensão, mais do que frustrante, deve ser encarada como potente. A indizibilidade do terror a que assistimos força-nos a novos balanços que expliquem como aqui chegámos.

Como pode a “única democracia do Médio Oriente” revelar-se, afinal, o agente terrorista por excelência com o apoio das outras “democracias” que garantem o cumprir do direito e da ordem internacional?

Décadas de pinkwashing israelita
Será talvez surpreendente que no seio de alguns ativismos queer e LGBTQIA+ se tenha encontrado, em especial mas não exclusivamente nas últimas duas décadas, uma das resistências mais consistentes e combativas à propaganda imperialista. Pessoas e coletivos à margem da cisheteronormatividade denunciam, um pouco por todo o mundo, o pinkwashing (“lavagem a rosa”) do Estado de Israel tanto no seu próprio território como nas suas atividades no estrangeiro. Mas o que têm, concretamente, as questões de sexualidade e de género a ver com a ocupação israelita dos Territórios Palestinianos Ocupados (TPO)? Afinal, não é Tel Aviv um oásis de liberdade?

Recuemos no tempo. Israel partilha, na verdade, uma cronologia muito semelhante à de Portugal. O sexo entre adultos do mesmo género foi despenalizado em Portugal em 1982, enquanto em Israel aconteceu seis anos depois, em 1988. Em ambos os casos tratou-se de um ajuste nominal a leis que já não eram exercidas, mas abriu caminho para que os esforços de um novo movimento associativo dessem frutos.

Este ativismo, capaz de dialogar com as instituições e com a sociedade civil, despontou na década de 1990 e celebrou uma série de feitos: interditou a discriminação com base na orientação (1992), promoveu a total participação de soldados homossexuais nas forças armadas (1998), defendeu a adoção por casais homoparentais (2008) e a mudança de género legal sem requerimento de cirurgia de redesignação sexual (2015). Ambos os países superaram a sua imagem retrógrada e desajustada - no caso de Israel, particularmente veiculada ao fundamentalismo religioso - para serem vistas como inquestionavelmente integradas no Norte global, ícones do cosmopolitismo e da tolerância, destinos turísticos com o carimbo LGBT-friendly.

A Marcha do Orgulho de Jerusalém, que tem lugar desde 1997, foi palco de dois esfaqueamentos pela mão do mesmo atacante ultra-ortodoxo, dos quais resultaram vários feridos e a morte de uma adolescente. Em 2019 foram detidos outros 49 possíveis atacantes.

Estas vitórias são-no em ambos os casos porque não foram dadas de mão beijada. No caso israelita, a sua cooptação ofusca as tendências sociais mais reacionárias, bem como as suas próprias contradições enquanto Estado teocrático por definição.

Estas contradições não são menores, mas fundamentais à génese do projeto de Estado desde o seu início, entre forças democráticas e ultra-nacionalistas cuja influência é minimizada mas cujo domínio sobre a legislatura e a sociedade civil são reais. As tensões estão presentes mesmo nos momentos mais simbólicos da tolerância LGBTQIA+. A Marcha do Orgulho de Jerusalém, que tem lugar desde 1997, foi palco de dois esfaqueamentos (em 2005 e em 2015) pela mão do mesmo atacante ultra-ortodoxo, dos quais resultaram vários feridos e a morte de uma adolescente. E, na Marcha de 2019, foram detidos outros 49 possíveis atacantes.

Não nos esqueçamos da celebração do festival WorldPride em Jerusalém, também em 2005, que foi forçosamente adiado para o ano seguinte por causa da acérrima oposição de representantes das três religiões monoteístas e do próprio parlamento israelita. E, em 2009, duas pessoas foram mortas num ataque armado ao centro LGBT de Tel Aviv. São certamente exemplos extremos, mas ilustram um terreno mais complexo do que o de uma meca harmoniosa e isolada contraposta tanto ao fundamentalismo religioso como à violência do “restante” Médio Oriente.

A questão do casamento entre pessoas do mesmo género também é ilustrativa. A 11 de dezembro de 2023, a conta X (antigo Twitter) oficial do Estado de Israel publicou a foto de um casal de dois homens, um pedindo o outro, um soldado em uniforme, em casamento. O tweet congratulou “o lindo casal”, entre um emoji de coração, a bandeira arco-íris e a bandeira israelita. O post omitiu convenientemente que o casamento não poderá ser celebrado no país. É que projetos-lei foram rejeitados no Knesset (assembleia legislativa) cinco vezes e o desafio cultural, bem como o legislativo, que o casamento representa revela o tipo de complexidade que o pinkwashing nos tenta esconder: não existe simplesmente casamento civil num país que não separa a religião do Estado.

O pinkwashing é isto: uma lavagem a cor-de-rosa das realidades complexas em ambos os lados da ocupação. Em Queer Palestine and the Empire of Critique, o antropólogo Sa’ed Atshan sistematiza da seguinte forma os pilares desta retórica: minimizar a homofobia em Israel e maximizar a homofobia na Palestina, para dessa forma criar uma oposição binária que, quando justaposta, demonstra a superioridade civilizacional da primeira face à segunda para ganhar apoio para levar a cabo o seu extermínio. Ou, como o próprio primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, o colocou: “o povo da luz contra o povo das trevas”, o “mal” contra a “liberdade e o progresso”.

Se esta oposição entre Ocidente e Oriente é, como nos mostrou magistralmente o crítico literário Edward Said, antiga e falaciosa, o pinkwashing tem recortes particularmente contemporâneos. Primeiro, lembremos que, tanto lá como cá, a consideração das questões LGBTQIA+ no barómetro da “luz” é extremamente recente. Segundo, há uma convergência particular nos anos 2000 que justifica a identificação das comunidades LGBTQIA+ como locutor-alvo de uma campanha de propaganda concertada.

O termo surge especificamente no contexto Israel/Palestina, embora seja hoje usado para qualquer contexto no qual a promoção dos direitos destas comunidades seja feita como manobra publicitária. Inspirado pelo greenwashing (falsa promoção de causas ambientalistas, em si um trocadilho com o verbo “to whitewash”, branquear), pinkwashing já existia no contexto anglófono em referência às campanhas em torno do cancro da mama. Mas ganhou nova vida em 2010, quando foi cunhado pelo coletivo californiano Queers Undermining Israeli Terrorism (QUIT) para descrever o que identificaram como um tipo de propaganda perpetuada pelo Estado de Israel visando as comunidades LGBTQIA+ em particular. Grupos queer de ação direta como o próprio QUIT e os israelitas Black Laundry (כביסה שחורה, Kvisa Shchora), ambos fundados em 2001, depois da Segunda Intifada, assim como vários grupos na América do Norte com o nome Queers Against Israeli Apartheid (QuAIA), estavam na linha da frente do combate contra o apagamento da realidade da ocupação em prol da “tolerância” para com as minorias.

Esta lavagem a cor-de-rosa das realidades complexas em ambos os lados da ocupação, tal como Sa’ed Atshan explica, tem como retórica minimizar a homofobia em Israel e maximizar a homofobia na Palestina, para criar uma oposição binária que demonstra a superioridade civilizacional.

Este tipo de militância é indissociável do movimento palestiniano pelo BDS (Boicote, Desinvestimento e Sanções), fundado em 2005. Como o apelo geral ao boicote é da Palestina para o mundo, foram as duas principais organizações LGBTQIA+ palestinas: a ASWAT (أصوات, Palestinian Feminist Center for Sexual and Gender Freedoms) e a al-Qaws (القوس, al-Qaws for Sexual & Gender Diversity in Palestinian Society) quem lançou o apelo através de duas iniciativas maioritariamente digitais: Palestinian Queers for Boycott, Divestment, and Sanctions,em 2010, e Pinkwatching Israel, em 2011.

Na mesma altura, foram publicadas duas das denúncias mais conhecidas do pinkwashing e que popularizaram o termo: da teórica Jasbir Puar, em 2010, e da autora, ativista e historiadora Sarah Schulman, em 2011. Ambos os textos identificam a campanha “Brand Israel” como a origem dos esforços de promoção da nação aos olhos do Norte global. Schulman publicou mais tarde uma cronologia detalhada da campanha, segundo a qual, citando meios de comunicação israelitas, o público gay é explicitamente identificado como um dos alvos em 2009, particularmente para o turismo de Tel Aviv e para a promoção de filmes pró-Israel em festivais de cinema gay e lésbicos nos Estados Unidos.

Não é coincidência que o rebranding israelita coincida com a plena integração das “minorias” sexuais nas instituições da família e das forças armadas nos Estados Unidos e noutros países do Norte global. Puar já publicara em 2007 o seminal Terrorist Assemblages: Homonationalism in Queer Times, no qual descreveu a interdependência da nova cidadania “homo” e das invasões do Afeganistão (2001) e do Iraque (2003). Mais recentemente, a tese póstuma do historiador marxista Christopher Chitty apontou como “aos gays e às lésbicas”, como escreveu, “só lhes é permitido sonhar com a boa vida precisamente no momento da sua liquidação política e económica.” O pinkwashing bebe do Orientalismo, mas na sua acepção racializada e islamofóbica contemporânea, construída pela máquina de guerra norte-americana. Ambas as potências manobram os “direitos” num pano de fundo generalizado de crise e de colapso.

E a denúncia do pinkwashing israelita em Portugal?
Em Portugal, os dois autores que mais têm produzido em torno das questões de género e da sexualidade, bem como sobre o seu lugar na luta palestiniana, são os investigadores Shahd Wadi e Bruno Costa. A história da mobilização contra o pinkwashing no nosso contexto nacional conta com três momentos-chave.

Em 2010, a 14ª edição do festival de cinema Queer Lisboa foi alvo de uma ação de boicote que denunciou o apoio financeiro da Embaixada de Israel. A campanha convocada pelo coletivo Panteras Rosa mobilizou apoio de congéneres na Europa, no Canadá e no Médio Oriente e contou com a solidariedade de um dos realizadores presentes no festival, que retirou os seus filmes do programa. Os materiais da ação refletiram o apelo do movimento BDS e a necessidade de sensibilizar as comunidades LGBTQIA+ para o pinkwashing.

Mais recentemente, em 2022, a Comissão Organizadora da Marcha do Orgulho de Lisboa (COMOL) foi acusada pelo embaixador israelita Dor Shapira de “tiques autocráticos” pela sua decisão de não autorizar a presença da embaixada na marcha. Em resposta, a COMOL denunciou a falsa equivalência entre uma “igualdade” onde só entram alguns, imposta por um Estado de Direito, e uma marcha organizada de forma voluntária pela própria comunidade. “Enquanto Israel não cessar toda a violência contra a Palestina, intimidação e regime de apartheid, a sua autoproclamada tolerância e aceitação são somente atos performativos de exclusão e não políticas de liberdade e igualdade,”, afirmou a organização. Este direito de resposta nunca foi publicado no Público, pois o jornal considerou que a utilização da expressão “campanhas de genocídio”, sendo controversa, poderia incorrer na sua responsabilidade criminal. A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) deu-lhe razão. Mas MOL manteve o compromisso de solidariedade na edição seguinte, de 2023.

Não é coincidência que o rebranding israelita coincida com a plena integração das “minorias” sexuais nas instituições da família e das forças armadas nos Estados Unidos e noutros países do Norte global.

A denúncia do embaixador ecoa vários pontos-chave da propaganda do Estado que representa quanto às questões LGBTQIA+. “Em muitos dos países vizinhos de Israel – e especialmente na Faixa de Gaza – não há Comunidade LGBTI+ por uma razão muito simples: se alguém o assumir será sumariamente punido. Na melhor das hipóteses, com a prisão e na pior com a execução. Israel acolhe estas pessoas”, afirmou o embaixador israelita.

Vamos por partes. É verdade que o sexo entre adultos do mesmo género é crime na Faixa de Gaza, mas não o é na Cisjordânia. Esta inconsistência não foi criada pela vitória do Hamas em 2007, mas resulta de disparidades no quadro legal palestiniano que refletem uma herança colonial complexa. Foi sob o domínio britânico na região (1918-1948) que foi criada a primeira lei contra a homossexualidade, repelida na Cisjordânia aquando da sua anexação pela Jordânia, em 1950. Este não foi o único contexto geográfico no qual a homofobia e a transfobia, tal como as conhecemos hoje, podem ser diretamente traçadas até ao colonialismo europeu.

Contudo, no caso de Gaza, a atual aplicabilidade da lei - e a realidade no terreno após a conquista pelo Hamas - é debatível. Não existe consenso, mesmo entre observatórios dos direitos humanos internacionais, quanto ao quadro legal da homossexualidade em Gaza neste momento — entre o código britânico, o governo do Hamas e a legislação da Autoridade Palestiniana (AP) impera a incerteza. O certo é que a imagem de uma sociedade sufocada pelo fundamentalismo islâmico aplicado a ferro e força é uma miragem: em “Hamas Contained: The Rise and Pacification of Palestinian Resistance”, o autor Tareq Baconi demonstra a fragilidade da soberania do Hamas e a complexidade de Gaza no que concerne questões de governo e direito.

É, certamente, um ambiente hostil para as minorias. Isto significa que o movimento LGBTQIA+ palestiniano se depara com uma dupla luta: contra a ocupação e contra a homofobia. Uma vez que “não existe um palestiniano, em Israel, nos TPO, ou na diáspora, que não tenha sido negativamente afetado (...) pela distribuição de poder que relega os palestinianos às condições de cidadãos de segunda, apátridas, ou exilados”, como escreve Atshan em Queer Palestine and the Empire of Critique, “os ativistas queer palestinianos gozam com a existência de um portão cor-de-rosa para Israel que deve aparecer por magia quando um palestiano queer se aproxima”.

O que nos leva ao “acolhimento” que Israel proporciona a estas minorias. É verdade que existem comunidades palestinianas LGBTQIA+ em várias cidades de Israel que procuram refúgio no anonimato e a possibilidade de viver de forma mais assumida. Mas Israel recusa-se categoricamente a ceder estatuto de refugiado a qualquer palestiniano, mesmo provando-se o risco de morte no seu local de origem. Fá-lo em plena violação do direito internacional. Seria demasiado perigoso, pensa Israel, abrir um precedente legal para o retorno de refugiados palestinianos às suas terras ancestrais.

Mais recentemente, em 2022, a Comissão Organizadora da Marcha do Orgulho de Lisboa foi acusada pelo embaixador israelita Dor Shapira de “tiques autocráticos” pela sua decisão de não autorizar a presença da embaixada na marcha.

Assim, o governo alega, então, duas coisas: 1) não existe (afinal) homofobia nos TPO que justifique o seu tratamento como refugiados em função da sua orientação sexual ou identidade de género e 2) que estas pessoas representam um risco de segurança. Esta clandestinidade, que resulta do cruzamento da sexualidade com o apartheid, faz de quem emigra alvo de perseguição pelas forças de segurança israelitas e pela AP, envolvendo vigilância, chantagem e colaboração coagida.

Mas celebremos a liberdade, façamos como a embaixada de Israel no passado verão, quando patrocinou uma festa com o mote “Israeli Pride Party” no bar Finalmente, o mais antigo estabelecimento gay em Lisboa. A festa foi denunciada como ato de pinkwashing por várias organizações LGBTQIA+ de vários pontos do país e recebeu um protesto à porta do bar. O desfecho foi mais uma vez ilustrativo da retórica que temos elencado.

Tratou-se de mais um “cancelamento da liberdade dos outros”, de acordo com a carta aberta em solidariedade com o Finalmente, assinada pela Variações - Associação de Comércio e Turismo LGBTI de Portugal, cujo ex-presidente Diogo Vieira da Silva é atualmente press officer da embaixada de Israel. A denúncia do branqueamento de um genocídio através da celebração do orgulho é equiparada à “visão autoritária” responsável pela “opressão de pessoas LGBTI+ em todo o mundo.”

Esta mesma acusação de homofobia a quem critica o pinkwashing foi depois usada pelo neonazi Mário Machado. O neonazi condenado fez uma queixa ao Ministério Público contra o protesto identificado pelos media como se do protagonizado pelo Comité de Solidariedade com a Palestina e pelas Panteras Rosas.

Olhemos para a denúncia de Machado como um momento pedagógico, pois revela a ineptidão de categorias identitárias como capazes de responder, por si só, às questões levantadas pelo pinkwashing. É claro que o boicote a iniciativas LGBTQIA+ israelitas é homofóbica, pois são esses os termos do jogo: onde há gays a festejar (e a cumprir serviço militar) é bom, onde não os há é mau; a verdadeira inclusão e solidariedade queer deve ser para com todes que partilhem as etiquetas, concebidas como factos tão estáticos como a nacionalidade e a cidadania; qualquer outra questão é um desvio da conquista da sexualidade como significando algo por si mesma. Afinal, não era isto que queriam?

O pinkwashing não faz mais do que manobrar a lógica do essencialismo estratégico que tornou os direitos LGBTQIA+ legíveis, e cujo sucesso fossilizou as suas limitações nos discursos políticos sobre a sexualidade dentro e fora das instituições.

A luta queer e unida com a Palestina apenas faz sentido, como o têm demonstrado tantas organizações a nível global (e particularmente, como não podia deixar de ser, na própria Palestina), rompendo com este esquema, entendendo a identidade como meio de relações e práticas sociais. Só assim, escreve a teórica travesti Amanda Palha, podemos compreender o seu carácter histórico e social e “convertê-la em instrumento potente de ações políticas anticapitalistas”.

Além da solidariedade imperativa e ativa com as exigências dxs queers palestinianos, questionar o lugar da guerra, do racismo e do imperialismo como se fossem dissociáveis das lutas queer não é um problema de agora. Leslie Feinberg, histórico autor e militante trans, levantou-o sucintamente em 2002: “Este é um velho debate no nosso movimento, e as respostas que gera tendem a anunciar ou o colapso do movimento, ou uma nova vida”. Em vésperas de eleições legislativas e da celebração do festival EuroPride em Lisboa, em 2025, talvez seja um momento propício para se avançar com um balanço.

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