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segunda-feira, 21 de agosto de 2023

Experiências de vida e genética influenciam a forma como vemos a Natureza

Para alguns de nós, a Natureza pode estar refletida em espaços verdes bem mantidos e cuidados (à direita), ao passo que para outros ela está em lugares ‘selvagens’, em que o toque e presença humanos é residual ou praticamente inexistente (à esquerda). 

A Natureza é definida por muitos como um ‘universo’ além dos espaços humanos, ao qual estão confinados os animais e as plantas selvagens, lugares intocados, ou ligeiramente alterados, embora as paisagens agrícolas possam também caber nessa categoria.

Apesar de o conceito de Natureza, como algo destacado da experiência e vivência humanas, tenha as suas raízes no pensamento ocidental, que pressupõe uma linha divisória entre os mundos social, ou humano, e natural, continua a ser a base da tradição científica dominante. Como tal, e numa altura em que se mobilizam muitos esforços, vontades e fundos para atenuar os impactos humanos sobre o planeta, saber como as pessoas veem a Natureza é fundamental para que se possa perceber onde estará o epicentro dos problemas.

Cada pessoa tem uma forma diferente de percecionar a Natureza – umas adoram-na, outras olham para ela como um conjunto de recursos a explorar, e outras são indiferentes –, mas investigadores suíços acreditam que essas perceções são influenciadas quer pela nossa genética, quer pelas experiências e aprendizagens ao longo das nossas vidas.

Num artigo publicado na revista ‘Trends in Ecology & Evolution’, os cientistas da Universidade de Gotemburgo e da Universidade Sueca de Ciências Agrárias defendem que a hereditariedade e o ambiente em que crescemos são ambos fatores que determinam as nossas atitudes para com a Natureza.

Através da revisão de múltiplos estudos sobre como os humanos percecionam o mundo natural, os investigadores concluíram que essas perceções são construídas por “uma interação entre a hereditariedade e a influência ambiental”, salientando que cada um de nós reage de forma diferente perante a Natureza.

Um dos trabalhos revistos foi um estudo realizado no Japão que comparou os batimentos cardíacos de pessoas enquanto passeavam na floresta e na cidade, e revelou que 65% dos sujeitos experienciou uma redução do ritmo cardíaco enquanto caminhava por entre as árvores. Os investigadores consideram que esta é uma prova de que nem todas as pessoas reagem da mesma forma à Natureza.

Outro estudo apontava que as pessoas cujas infâncias tiveram uma forte componente de contacto com o mundo natural eram mais atraídas pela Natureza do que as demais.

Isto, relativamente ao peso das experiências de vida na forma como vemos a Natureza. No que toca à influência genética, Bengt Gunnarsson, um dos autores do artigo, recorda que um outro trabalho sobre gémeos idênticos e ‘falsos’ mostrava que “uma componente genética influencia a relação positiva ou negativa de um indivíduo com a Natureza”, acrescentando que esse trabalho “também salientava a importância do ambiente”.

A dupla de cientistas suecos diz, no entanto, que devemos evitar generalizações sobre como as pessoas veem a Natureza e sobre o que entendem que ela seja. Para uns, a Natureza pode ser vista em jardins urbanos bem mantidos, com relva aparada, ao passo que para outros pode significar florestas repletas de animais e plantas selvagens.

E acreditam que mesmo essa distinção pode ser influenciada quer pela genética, quer pelas experiências que essas pessoas tiveram aos longo das suas vidas.

Apesar das conclusões desta investigação, Bengt Gunnarsson afirma que futuros estudos que aprofundem a compreensão “das interações entre os fatores de hereditariedade e ambientais são essenciais se quisermos compreender o que molda as relações dos indivíduos com a Natureza”.

Diversos são os planos implementados e em marcha para tornar mais verdes as cidades em que vivemos. Mas a diversidade de visões sobre o que é, ou o que deveria ser, a Natureza, poderá ter efeitos muito diferentes sobre cada uma das pessoas. Por isso, o cientista sublinha que “temos de nos recordar que somos todos diferentes” e que os planos para aumentar os espaços verdes em contextos urbanos devem ter em conta as diversas perceções e não assumir que existem ‘soluções de tamanho único’.

A consciência dessa diversidade de perceções, na ótica destes autores, será fundamental para que todas as pessoas possam encontrar nas suas cidades espaços verdes que correspondam à sua ideia de Natureza e nos quais possam experienciar os benefícios que têm sido associados a esses lugares.

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