Este fim de semana voltámos a mexer nos relógios para os atrasar 60 minutos e voltar a hora de inverno. Estes são os argumentos para mudar (ou não) a hora
Foi esta madrugada que voltámos a mexer nos relógios, mas desta vez para ganhar uma hora de sono. Na madrugada de sábado, 30, para domingo, 31, em Portugal Continental e na Madeira, quando eram 2h00 da manhã, os ponteiros recuaram 60 minutos. Já nos Açores o mesmo sucedeu à 1h00, voltando à meia-noite.
Ao contrário do que aconteceu a 27 de março, quando Portugal entrou no horário de verão – o horário que mais questões levanta, dividindo as opiniões dos especialistas e também dentro da União Europeia (UE) – e todos ficámos com menos uma hora de sono nessa noite, desta vez, e como acontece todos os anos, com a chegada do horário de inverno, “ganhámos” essa hora.
O horário de verão foi implementado na Alemanha, a 30 de abril de 1916. Esta foi a primeira vez que os relógios foram adiantados e o objetivo era poupar energia. Estando o Velho Continente em plena I Guerra Mundial, poupar na iluminação artificial e economizar combustível para depois ser usado no esforço bélico era essencial. Muitos foram os países que seguiram o exemplo da Alemanha, como Portugal que o fez ainda em 1916. Muitas oscilações se deram ao longo dos anos, levando os vários países da UE a alternar entre mudar e não mudar a hora. No entanto, esta tornou-se definitiva em 2001, com a implementação da diretiva 200/84/EC na UE, que faz com que todos os estados-membros sejam obrigados a mudar a hora duas vezes por ano.
Se em tempos de guerra a mudança era consensual, passado mais de um século o mesmo não se verifica. Estados-membros, como a Finlândia e a Lituânia, têm vindo a manifestar o seu desagrado com esta prática e este descontentamento ganhou amplitude em 2018, quando a Comissão Europeia (CE) revelou os resultados de um inquérito online em que a maioria dos participantes mostrava querer acabar com a mudança horária. Este foi um dos estudos de opinião com maior participação realizados pela CE, com um total de 4,6 milhões de respostas. Cerca de 84% eram a favor do fim da mudança, com 76% considerando-a “negativa” ou “muito negativa”. É importante notar, no entanto, que a União Europeia tem cerca de 450 milhões de cidadãos, sendo que este inquérito também não tem uma distribuição igual entre todos os estados-membros. Em Portugal, por exemplo, a participação foi de apenas 0,33 por cento.
O caso seguiu para o Parlamento Europeu (PE), onde em 2019, foi aprovado o fim da mudança bianual da hora. A decisão teve 410 votos a favor de abolir, 192 contra e 51 abstenções. Esta decisão foi, então, adiada para 2021, ano em que os países deveriam fazer a última mudança da hora, decidindo se ficavam com o horário de verão ou de inverno. Os países deveriam avisar, até 1 de abril de 2020, qual seria o horário com que iriam ficar. Mas, então, o que aconteceu? “Devido à pandemia a CE ainda não tomou a decisão sobre esse assunto e não há nenhuma informação de quando será tomada”, explica à VISÃO Suzana Ferreira, astrónoma do Observatório Astronómico de Lisboa.
Em Portugal, o primeiro-ministro, António Costa, manifestou, ainda em 2018, a intenção de manter o atual regime bi-horário. No entanto, como afirma a astrónoma, quando for tomada a decisão na UE “todos os países têm de fazer igual”. Assim, mesmo não querendo, se for essa a decisão da CE, teremos de escolher com que fuso horário ficamos. “Portugal pode escolher se fica com a hora de inverno ou se fica com a de verão. Mas pode nem chegar a esse ponto” explica Suzana Ferreira. Depende, então, se a decisão da CE irá, ou não, avançar.
Argumentos para continuar (ou não) a mudar a hora
O argumento de António Costa baseia-se no relatório do Observatório Astronómico de Lisboa realizado em 2018, pelo seu diretor na altura, Rui Jorge Agostinho, onde se defende a posição de “aproveitar a luz solar ao máximo”. “Na nossa posição a nível geográfico faz sentido haver mudança da hora, enquanto que outros países, mais a norte, como têm dias muito pequeninos ou muito grandes, não faz sentido” acrescenta Suzana Ferreira, explicando que o principal problema de não mudar a hora seria desperdiçar a luz solar, uma vez que, no verão, o sol nasceria por volta das 5h da manhã, não sendo aproveitado pelas pessoas por ainda estarem a dormir. Já no inverno, só nasceria às 9h, o que nos faria ir para o trabalho e para a escola de noite. “A população iria começar o horário de trabalho ainda de noite e isso é mau para o nosso organismo. Nós acordamos com a claridade do sol e naquele caso ainda estaríamos um bocado dormentes”, explica.
Já o principal argumento de quem defende, em Portugal, que se deveria acabar com esta mudança tem a ver com a alteração dos ritmos biológicos e do sono. Miguel Meira Cruz, diretor clínico do Centro Europeu do Sono e autor de um estudo sobre a temática, afirmou, em 2019, à Lusa, que não fazia sentido continuar com a mudança da hora, considerando que mudar a hora duas vezes por ano pode ser “bastante nocivo sobretudo para alguns grupos populacionais”, como é o caso de pessoas vulneráveis em relação ao sono, pessoas imunodeprimidas ou pessoas mais velhas. “A agressão maior não é exatamente nós mudarmos a hora, porque adaptar-nos-íamos, uns mais depressa e outros menos depressa. A questão é que duas vezes por ano ora andamos para a frente, ora andamos para trás, e exigimos que os nossos genes, que são coisas que demoram muitos, muitos anos a adaptar, se adaptem imediatamente. E isso não acontece”, explicou. Já em 2020 afirmou que devido ao confinamento este impacto nocivo pode ainda ser mais problemático.
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