Desde há algum tempo alastrou a moda de construir passadiços, baloiços, pontes suspensas, teleféricos, miradouros e outros equipamentos de recreio sem qualquer critério e norma reguladora, espalhados por todo o território.
Independentemente do mau gosto (subjetivo) de muitas dessas intervenções, elas constituem, na generalidade, um atentado às paisagens, desvalorizando os territórios onde se inserem.
Podem, durante algum tempo, favorecer os negócios locais e atrair visitantes, mas não o farão com continuidade pois, como todas as modas, também esta passará, deixando o território mais degradado e os locais mais feios.
Estas intervenções estão a ser feitas, frequentemente com apoio de dinheiros públicos, sem obedecerem a qualquer quadro normativo, quer quanto aos impactos no território, quer quanto à segurança dos próprios equipamentos que, frequentemente, por desadequada instalação e falta de manutenção tornam-se perigosos e não respeitam, sequer, o Decreto-Lei n.º 309/2002 que regula a instalação e o financiamento dos recintos de divertimentos públicos, nem o Decreto-Lei n.º 379/97 que estabelece as condições de segurança dos espaços de jogo e recreio.
Ora o Decreto-Lei n.º 152-B/2017, de 11 de Dezembro que atualiza o regime jurídico da avaliação de impacte ambiental dos projetos públicos e privados suscetíveis de produzirem efeitos significativos no ambiente, transpondo a Diretiva n.º 2014/52/EU, determina, na leitura da FAPAS, que muitos desses projetos deveriam ser sujeitos a AIA (Avaliação do Impacte Ambiental), vejamos:
- A lei define “«Impacte ambiental», [como o] conjunto das alterações favoráveis e desfavoráveis produzidas no ambiente, sobre determinados fatores, num determinado período de tempo e numa determinada área, resultantes da realização de um projeto, comparadas com a situação que ocorreria, nesse período de tempo e nessa área, se esse projeto não viesse a ter lugar;”
- E mais determina a lei que são objetivos dos procedimentos de AIA “a) Identificar, descrever e avaliar, de forma integrada, em função de cada caso particular, os possíveis impactes ambientais significativos, diretos e indiretos, de um projeto e das alternativas apresentadas, tendo em vista suportar a decisão sobre a respetiva viabilidade ambiental, e ponderando nomeadamente os seus efeitos sobre: i) A população e a saúde humana; ii) A biodiversidade, em especial no que respeita às espécies e habitats protegidos nos termos do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, na sua redação atual; iii) O território, o solo, a água, o ar, o clima, incluindo as alterações climáticas; iv) Os bens materiais, o património cultural, arquitetónico e arqueológico e a paisagem; v) A interação entre os fatores mencionados, incluindo os efeitos decorrentes da vulnerabilidade do projeto perante os riscos de acidentes graves ou de catástrofes que sejam relevantes para o projeto em causa.”
Mas mesmo sem interpretações generalistas, reconduzindo a nossa argumentação ao texto da lei, os passadiços, baloiços e semelhantes integram-se no conceito de “Parques temáticos”, logo sujeitos obrigatoriamente a AIA se interferiram com mais de 10 hectares, ou 4 hectares em áreas sensíveis.
Ora qualquer quilómetro de passadiço interfere, no mínimo, com 4 hectares de território se consideramos (muito modestamente e com muitas variáveis) que o impacto da presença e do ruído dos visitantes alastra 20 m para cada lado do passadiço (20 m+20 m = 40 m x 1000 m = 40.000 m2 = 4 ha).
Tomemos como exemplo passadiços em Rede Natura 2000: os da Ria de Aveiro interferem com 30 hectares de território e os da Barrinha de Esmoriz com 32 hectares e, nem uns, nem outros, foram sujeitos a AIA.
É, pois, altura de exigir que se reveja o regime jurídico da avaliação de impacte ambiental, nele incluindo a obrigatoriedade de qualquer intervenção no território, de qualquer tipo e dimensão, ser sujeita a AIA, eventualmente num processo simplificado a criar. Deveria a lei, também, prever um prazo para legalização das (na sua maioria) desastrosas intervenções já feitas, sob pena de desativação e desmontagem.
Isto enquanto se vai a tempo de salvar um dos principais ativos de Portugal, a paisagem, diariamente agredida por inúteis passadiços, construídos onde frequentemente existem caminhos antigos, por baloiços sem sentido (e sem seguro!), ou pontes “maiores do mundo” que a todos nos deviam incomodar, quer por saírem dos nossos impostos, quer por hipotecarem o nosso futuro.
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