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segunda-feira, 4 de julho de 2011

Da Agricultura para a Permacultura


by Albert Bates e Toby Hemenway, in
STATE OF THE WORLD 2010 - Transforming Cultures, From Consumerism to Sustainability
A Worldwatch Institute Report on Progress Toward a Sustainable Society

Acima do lintel das portas do museu cultural de Tlaxcala, a capital de estado mais antiga do México, existem murais representando a ascensão da civilização. Primeiro, vêem-se os caçadores vestidos com peles e portando arcos e lanças. Uma mulher descobre uma pequena planta gramínea e começa a cultivá-la, e, na sequência, todos já a estão plantando, e a recém domesticada planta cresce tão alta quanto uma pessoa. Aparecem ferramentas especiais para preparar o terreno, plantar, colher e processar o grão. Nos painéis que se seguem, surge a civilização, em toda a sua complexidade.

Algo semelhante a esta história é contado em muitas, se não em todas, as culturas. No Crescente Fértil do alto dos Rios Tigre e Eufrates, existem moedas antigas com imagens de um arado puxado por bois. Cenas de arados aparecem na cerâmica do Egipto e Anatólia e no papel arroz do Japão e da China, alguns deles, com mais de 14.000 anos. Com o recuo do gelo e o aquecimento climático, há 20.000 anos, a área de solo fértil e estações adequadas para o cultivo aumentaram, e junto com esses fenómenos, a caça selvagem diminuiu e os mamutes e outros animais de grande porte foram extintos.

Há 8.000 anos, a criação de animais domésticos começou a crescer em função da domesticação da fécula de trigo, trigo selvagem, cevada, linho, grão-debico, ervilha, lentilha e ervilhaca amarga. Os
humanos tinham começado a alterar suas paisagens profundamente, desmatando florestas para criar áreas de cultivo, construindo vilas e cidades maiores e redireccionando os rios para irrigação e controle de inundações.

Há cerca de 7.000 anos, em todo o mundo, a maioria das pessoas, se não a maioria, eram agricultoras.
Isso talvez pudesse ter continuado até que a humanidade ingressasse na próxima Era do Gelo — um mundo de desertos gelados, istmos conectando Continentes, e montanhas maciças de gelo.

Mas, a civilização mudou essa trajectória utilizando o carvão, o gás e o petróleo que alimentaram a Revolução Industrial. Uma vez mais, o homem alterou os ritmos do planeta de uma forma que ainda não compreendeu totalmente.

No espaço de um único século — o actual (XXI) — é possível que o clima da Terra aqueça mais rapidamente e em maior grau do que nos 20.000 anos anteriores. Os sistemas agrícolas serão profundamente desafiados e assolados por sucessivas intempéries. Assistiremos à redução do fornecimento de combustível, dificultando o seu uso em tractores, fertilizantes e transporte; veremos também a destruição de colheitas devido a ondas de calor, resultando na expansão de pragas e diminuição do abastecimento de água para irrigação; veremos também o crescimento e a migração de populações clamando por comida, em particular, carne e alimentos processados. Tudo agravar-se-há e a instabilidade financeira trazida pela ultrapassagem dos limites da Terra, irá forçar a humanidade a um recuo para um estágio anterior ao desenvolvimento industrial.

Antes de meados do século 20, a maioria dos produtos agrícolas era em boa parte produzida sem o uso de produtos químicos.

As pragas de insectos e ervas daninhas eram controladas pela rotação de culturas, pela destruição do "refugo" das colheitas, o plantio era sincronizado de modo a evitar períodos de alta população de pragas, o controle de ervas daninhas era feito de forma manual e eram aplicadas outras práticas agrícolas testadas ao longo do tempo e específicas de região.
Apesar de esses métodos ainda serem usados, as mudanças na tecnologia, os preços, as normas culturais e as políticas governamentais levaram à agricultura industrial intensiva de hoje.

O sistema agrícola dominante praticado actualmente em todo o mundo, denominado “agricultura convencional”, é caracterizado pela mecanização, pela monocultura, pelo uso de fertilizantes sintéticos químicos, pelo emprego de pesticidas e pela ênfase na maximização da produtividade e do lucro.

Esse tipo de agricultura não é sustentável porque destrói os recursos dos quais depende. A fertilidade do solo está declinando em virtude da erosão, da compactação e destruição de matéria orgânica; o abastecimento de água está a ser exaurido e poluído; as reservas de energia fóssil finita estão a esgotar-se e as economias das comunidades rurais estão a ser arruinadas pelo envio da produção agrícola para mercados distantes.

A escassez de terras agrícolas produtivas, a diminuição da fertilidade do solo e a grande quantidade de lixo, a par da economia alimentar em escala industrial, são responsáveis pela insuficiência recorrente e acelerada de alimento e água, pela desnutrição, pela fome em massa e pela destruição da biodiversidade.

Para além de tudo isto, a agricultura é responsável por 14% das emissões de gases de efeito estufa. De 1990 a 2005, as emissões agrícolas no mundo aumentaram em 14%.

A humanidade depara-se agora com um desafio crítico: desenvolver métodos agrícolas que capturem o carbono, aumentem a fertilidade do solo, preservem o ecossistema, usem menos água, mas simultaneamente consigam retê-la mais tempo na terra — tudo isso enquanto utilizamos produtivamente a oferta constante e diversificada de trabalho humano.
Em resumo, necessitamos de uma agricultura sustentável.

Definindo Agricultura Sustentável
Felizmente, nos últimos cinquenta anos, alguns pioneiros foram preparando a agricultura do futuro, e as suas ideias estão agora deslocando-se para o centro das atenções. O plantio orgânico sem manejo do solo, a permacultura, o sistema de agrofloresta, as policulturas perenes, a aquaponia e a agricultura biointensiva e biodinâmica — consideradas por muito tempo como ideias marginais — estão agora se tornando componentes estruturantes de uma agricultura sustentável.

Uma das pedras fundamentais foi colocada no início do século 20, quando Franklin Hiram King viajou para a China, Coreia e Japão para aprender como os terrenos agrícolas desses locais eram trabalhados há milhares de anos sem destruir a fertilidade nem aplicar fertilizante artificial. Em 1911, King publicou "Farmers of Forty Centuries: or Permanent Agriculture in China, Korea and Japan", que descrevia a compostagem, rotação de culturas, a adubação verde, o cultivo intercalado, irrigação, culturas resistentes à seca, a aquacultura e agricultura em terras alagadiças, bem como o transporte de adubo humano das cidades para zonas agrícolas rurais.

O trabalho de King inspirou muitos, inclusive Sir Albert Howard. Em 1943, Howard publicou "An Agricultural Testament", que descrevia a montagem de pilhas de compostagem, reciclagem de lixo e criação de húmus do solo como uma “ponte viva” entre a vida do solo – rica em organismos como as micorrizas e bactérias –, ao lado de culturas, animais de criação e pessoas saudáveis.

No cerne do trabalho de Howard estava a ideia de que os solos, as culturas agrícolas nutritivas e organismos em geral não são apenas matrizes de minerais, mas sim partes de uma ecologia complexa da matéria orgânica cíclica, e que esses ciclos de sustentação da vida são primordiais para uma agricultura autorregeneradora.

Em meados do século 20, Howard envolveu-se num aceso debate.
De um lado estavam discípulos de químicos como Carl Sprengel e Justus von Liebig, que apoiavam ativamente a fertilização, em especial com nitrogênio, fósforo e minerais de potássio, e defendiam o uso da mecanização, argumentando que o crescimento da planta é potencializado pelo acréscimo de uma quantidade mínima de minerais. Rapidamente, isso foi amplamente aceite e serviu de base para a  Revolução Verde.

Do outro lado estavam os defensores orgânicos, que aderiram ao ponto de vista de Howard, segundo o qual a saúde da agricultura depende da manutenção da ecologia do solo, que passa por devolver-lhe não apenas o mineral perdido no cultivo, mas também a matéria orgânica que sustenta os ciclos de nutrientes de sua vida.

A posição de Howard era a de que, nas palavras do biólogo Janine Benyus, é a própria vida quem melhor cria as condições propícias à vida.
Howard perdeu a batalha, mas talvez tenha vencido a guerra, pois está a tornar-se óbvio e evidente que muitos aspectos da agricultura industrial, tais  como a destruição da camada superficial do solo, que chega a quase 75.000 milhões de toneladas por ano, não são sustentáveis. O iminente esgotamento do fósforo – um fertilizante crítico – e os retornos negativos exemplificados por culturas que usam 10 calorias de energia de combustível para a produção de uma caloria de energia de alimentos, são disso bons exemplos.

A agricultura do século 20 degradou de forma drástica quase todos os ecossistemas, consumindo, ao mesmo tempo, cerca de 20% da produção energética mundial. O funcionamento do chamado estilo “convencional” depende quase inteiramente dos combustíveis fósseis que estão hoje a escassear, a custar cada vez mais e que se extinguirão irremediavelmente.

A agricultura sustentável, por outro lado, pode ser uma proposta por um prazo indeterminado porque não degrada nem exaure os recursos de que necessita para subsistir. Como a maior parte do solo arável da Terra já está a ser cultivado e as populações humanas continuam a aumentar, uma meta muito mais positiva e exequível seria a de melhorar a capacidade produtiva da terra.

Temos assistido ao surgimento de algumas abordagens cujo foco é o ganho líquido, mas elas não são um elixir mágico.

Embora as práticas agrícolas otimizadas possam aumentar a capacidade produtiva do solo durante um longo prazo, elas não podem ser consideradas isoladamente; uma solução de peso para a existência da humanidade neste planeta deve incluir a adoção de estilos de vida sustentáveis e manutenção da população humana em números sustentáveis.

Agricultura Orgânica: Aspectos Gerais
As principais características da agricultura orgânica são:

* o uso de fertilizantes produzidos biologicamente, tais como adubos enriquecidos com carbono em vez de nitratos e fosfatos inorgânicos manufacturados; * o uso pouco frequente de pesticidas produzidos por métodos biológicos em vez da aplicação rotineira de compostos sintéticos – tóxicos para todo o sistema;

* e mais crucial ainda, a manutenção da ecologia do solo e da matéria orgânica com uso de forrageiras, adubação verde e compostagem.

Uma comparação de longo prazo feita pelo Rodale Institute de 1981 a 2002 revelou que os sistemas orgânicos produziam colheitas com rendimento equivalente ao dos métodos convencionais.
Os ensaios mostraram que, quando a precipitação era 30% menor que o normal — nível típico de seca — o rendimento dos métodos orgânicos era 24% a 34% superior ao dos métodos convencionais.
Os investigadores atribuíram o aumento do rendimento a uma melhor retenção de água em virtude de níveis mais altos de carbono no solo.

Os dados recolhidos do ensaio constataram que o solo sob manejo de agricultura orgânica consegue acumular cerca de 1.000 libras de carbono por acre/pé por ano. Isso equivale a 3.667 libras de dióxido de carbono por acre (4.118 quilogramas por hectare ao ano) retirados do ar e sequestrados na matéria orgânica do solo.

Além disso, os métodos orgânicos utilizaram de 28% a 32% menos energia e foram mais rentáveis do que os métodos industriais.

 Esses resultados sugerem que os sistemas orgânicos representam uma grande promessa na redução do uso do combustível fóssil e das emissões de gases de efeito estufa.

O estudo indica que, se os 64 milhões de hectares das terras cultiváveis dos EUA, atualmente com plantação de milho e soja, fossem convertidos em lavoura orgânica, ter-se-ia capturado 264 milhões de toneladas de dióxido de carbono; isso é o equivalente a fechar 207 fábricas de carvão para a produção de 225 megawatts, aproximadamente 14% da capacidade instalada de energia elétrica gerada com carvão nos Estados Unidos ou na China.

Policulturas Perenes
Wes Jackson e seus colegas do The Land Institute em Salina, Kansas, estão desenvolvendo novas culturas perenes para a substituição de grãos que precisam ser replantados anualmente. Esses grãos são cultivados em sistemas de policulturas, misturados a outras espécies perenes que fixam o nitrogénio para a fertilização e produzem óleo de sementes para alimento, combustível e lubrificantes. Essas policulturas imitam as comunidades vegetais que compõem a pradaria selvagem.

“Aqui é onde devemos pensar mais profundamente”, afirma Jackson. “A agricultura teve início há 10.000 anos. Como eram os ecossistemas 10.000 atrás, após o recuo do gelo?
Esses ecossistemas reciclavam matérias e eram movidos a luz deste mesmo sol de hoje. O ser humano ainda precisa construir sociedades desse tipo. Será possível que, bem lá no fundo do sistema económico da natureza, estejam incorporadas sugestões para uma economia humana na qual a conservação é uma consequência da produção?

A riqueza ecológica, argumenta Jackson, é a patrocinadora mais confiável dos sistemas de alimentação humana do que os combustíveis fósseis, empréstimos bancários ou subsídios governamentais.

As pesquisas do Land Institute mostram que, comparadas às plantas anuais, as plantas alimentícias perenes oferecem maior proteção contra a erosão do solo, aproveitam a água e nutrientes de forma mais eficiente, sequestram mais carbono, são mais resistentes a pragas e intempéries e precisam de menos energia, trabalho e fertilizante.
O rendimento, por enquanto, ainda é menor em comparação com o das colheitas anuais, mas está aumentando. Os estudos realizados em África sugerem que diversos grãos, frutas e vegetais hoje cultivados em monoculturas anuais produzirão resultados semelhantes aos obtidos em policulturas perenes.

Sistema Agroflorestal
O sistema agroflorestal combina árvores e arbustos com culturas agrícolas anuais e a criação de animais de forma a amplificar e integrar o rendimento da safra e os benefícios para além do que cada componente oferece separadamente.

Da mesma maneira que outros métodos de agricultura sustentável, este sistema tem como base observar os ecossistemas naturais produtivos e imitar os processos e relações que os tornam mais resilientes e regenerativos.

Numa das formas de sistema agroflorestal, denominada cultivo em aléias, grãos ou outras culturas de espécies não lenhosas são plantadas em faixas entre fileiras de castanheiras, árvores frutíferas, espécies lenhosas ou de árvores forrageiras. Gado, aves e outros animais de criação podem pastar e alimentar-se da própria cultura agrícola.

Perto da cidade de San Pedro Columbia, na parte sul de Belize, há 20 anos que Christopher Nesbitt cultiva alimentos nesse estilo de floresta tradicional na sua quinta Mayan Mountain Research Farm. Ele mistura algumas espécies de árvores nativas de crescimento rápido, com um certo número de culturas anuais e mais um punhado de árvores com ciclo produtivo de médio e longo prazo, promovendo a formação de solo e a produção de colheitas contínuas.
Algumas dessas árvores são leguminosas e retêm o nitrogénio através da atração microbiana de suas raízes; outras são polinizadoras e atraem abelhas e beija-flores para a transferência do pólen fértil de plantas alimentícias importantes. Plantas de sub-bosque como o café, o cacau, a mandioca, a pimenta das Américas, a fruta de noni, o gengibre e o mamão beneficiam das culturas intercalares com árvores que proporcionam cobertura vegetal alta, tais como a árvore de fruta-pão, o açaizeiro, o coqueiro, o cajueiro e a mangueira. Culturas de crescimento rápido, como o abacate, frutas cítricas, a banana, o bambu, o inhame, a baunilha e as abóboras trepadeiras, garantem um rendimento para a propriedade agrícola enquanto aguardam o amadurecimento das culturas mais lentas do sândalo, do cedro, da teca, da castanha e do mogno.

O World Agroflorestal Centre relata que métodos como estes conseguem duplicar ou triplicar o rendimento agrícola e reduzir a necessidade de fertilizantes. 

Um relatório do Programa de Meio Ambiente da ONU estima que, se as melhores práticas de manejo fossem mais disseminadas, em 2030, poderiam ser capturadas por ano o equivalente a 6 gigatoneladas de CO2, com o uso do sistema agroflorestal, ou seja, o equivalente às actuais emissões totais da agricultura como um todo.

Plantio Directo e Plantio de Baixo Impacto no Solo
Alguns dos elementos de acumulação de nutrientes e conservação que permitem aos ecossistemas naturais criar e sustentar a fertilidade do solo incluem o seu revolvimento mínimo, a presença de uma camada protetora de resíduo das plantas cobrindo a sua superfície com poucas áreas descobertas por muito tempo, e uma cobertura constante de plantas vivas cuja função é absorver e armazenar qualquer nutriente que se torne disponível por meio da decomposição.

Esses elementos de criação e conservação de nutrientes podem ser incorporados aos sistemas de cultivo, convertendo para isso tais sistemas em métodos de plantio direto ou plantio de baixo impacto no solo, o que pode ser obtido com a redução do período de pousio das áreas descobertas, plantio de forrageiras, reinserção de palhadas (ou palhagem) e resíduo de plantas, aplicação do método “keyline” ao arar (ou em linha mestre – método desenvolvido por Neville D. Yeomans) e redução da ventilação do solo.

Na sua fazenda de 2.000 hectares perto de Wellington, em Nova Gales do Sul, Austrália, Angus Maurice está convencido de que as pastagens permanentes e o que ele chama de sistemas de plantio “sem matar” serão o futuro da produção de grãos. “Constatámos uma utilização significativa de gramíneas perenes nos últimos 5 anos, o que é bastante animador”, diz ele, “mas percebemos também que, para atingir o pleno potencial do sistema, teríamos de eliminar completamente o uso de herbicidas, o que dá para conseguir com o aprimoramento e uso adequado das gramíneas certas.”

Os estudos resultantes das pesquisas de longo prazo revelam perdas médias de 328 libras de matéria orgânica por acre ao ano com o sistema de arar convencional, enquanto que as análises do plantio directo relatam um aumento médio de 956 libras de matéria orgânica por acre ao ano. Constatou-se que a erosão de uma bacia hidrográfica com preparação do solo foi 700 vezes maior do que a erosão em bacias com plantio direto.

Os sistemas de plantio direto que utilizam forrageiras com grande quantidade de resíduos, desenvolvem matéria orgânica no solo e reduzem a movimentação da água sobre sua superfície, permitindo assim que ela penetre em maior quantidade.
Em Nova Gales do Sul, Maurice relata sua mais importante descoberta: os níveis de carbono no solo eram significativamente mais altos em áreas de gramíneas perenes na vegetação remanescente — cerca de 4%, em contraposição a 1,5% em áreas do sistema tradicional de cultivo contínuo.

Permacultura
O termo permacultura, uma contração de “agricultura permanente”, foi criado pelos australianos Bill Mollison e David Holmgren e refere-se à "translação" dos sistemas agrícolas para o planeamento de ecologias humanas, incluindo todas as suas dimensões – propriedade agrícola, domicílio, cidade – e que imita as relações encontradas nos biomas naturais.
Este sistema integra conceitos de agricultura orgânica, sistema sustentável de agrofloresta, plantio direto e técnicas de projeto de aldeias inspiradas nos povos nativos.
A permacultura aplica a teoria ecológica para entender as características dos diferentes elementos do projeto e as possíveis relações entre eles.

O método de desenho da Permacultura usa ainda um conjunto de princípios trazidos da ciência dos ecossistemas. Um desses princípios é o uso do modelo “do berço ao berço (cradle to cradle) que advoga a reciclagem de todos os recursos sem geração de lixo. Uma outra premissa que pode ser mencionada é a busca de interações entre os componentes de modo que as necessidades e os rendimentos estejam integrados dentro do "processo de desenho" permacultural.

Por exemplo, uma galinha precisa de alimento, água, habitat seguro e de outras galinhas, e ela produz ovos, penas, carne e adubo, além de comer ervas daninhas e auxiliar no controle de insectos. Um planeamento que integre as galinhas atenderia as necessidades do animal usando os recursos disponíveis na propriedade agrícola e asseguraria que a produção trazida pelas galinhas atendesse as necessidades de outros elementos do planeamento, tal como o cultivo de certas espécies ou um sistema de aquacultura.
Logo depois de começar a funcionar, o projecto de permacultura evolui naturalmente, capta sinergias e produz uma grande quantidade de alimento e de outros produtos, com decréscimo de mão de obra e recursos energéticos ao longo do tempo.
Um exemplo de uma estratégia de permacultura é a combinação de culturas em alianças sinergéticas chamadas associação, tal como a tradicional combinação de milho, feijão e abóbora.
Os Investigadores constataram que essas combinações conseguem gerar o dobro, ou mesmo o triplo, do rendimento que se consegue com as monoculturas.

Um dos exemplos mais conhecidos de permacultura bem-sucedida é encontrado num dos locais da Terra menos propícios para a agricultura. A área de Kafrin no vale da Jordânia, a 10km do Mar Morto, é praticamente só deserto e recebe apenas duas ou três chuvas leves no inverno. O sedimento fluvial é fino e salgado, e mesmo os poços na região são muito salinos para serem usados na irrigação.

Foi lá que Geoff Lawton e uma equipa de permacultores montaram um pequeno sítio de 5ha, e em 2001, começaram o projecto.

Inicialmente, cavaram valas em linha sinuosa acompanhando todo o perímetro da propriedade, e com a terra retirada da escavação fizeram montes com largura de 2 metros. Depois, plantaram leguminosas nos montes, para fixação do nitrogénio e utilização como forrageiras. Cada árvore recebeu então um nódulo que gotejava água enviada por um aqueduto proveniente de uma represa construída para captar água lixiviada; o lago formado pela represa estava repleto de tilápias e gansos, que contribuíram com fertilizantes orgânicos para as árvores.

Nas valas húmidas, plantaram azeitona, figo, mandioca, tâmara, romã, uva, frutas cítricas, alfarroba, amora, cacto e uma grande variedade de vegetais. Cevada e alfafa foram plantadas para consumo humano e também para servir de forragem para os animais do sítio que pastavam entre as valas. As folhas das árvores e alguns vegetais foram misturadas a jornal velho e pedaços de algodão e fizeram a vez do "manto morto", e tanto antes quanto depois do plantio, foi esterco animal como adubo.

Os animais criados no local eram galinhas, pombos, perus, gansos, patos, coelhos, carneiros e vacas leiteiras. Esses animais alimentavam-se com o que se obtinha no próprio sítio, pois existiam árvores e plantas suficientes para abastecê-los sem sobrecarregar o sistema.

Após um ano, o solo e os poços de água começaram a apresentar considerável redução da salinidade, e as áreas plantadas haviam crescido expressivamente.
A presença de pragas era baixa e o controle era feito quase que apenas com os animais do sítio. A combinação de plantas e animais trouxe a integração dos elementos que alimentam o sistema e o que ele produz, de acordo com uma gestão do ecossistema pautado pela produção contínua, conservação de água e melhoria do solo.

Em menos de dez anos, já havia um equilíbrio em termos de permacultura, com menor uso de elementos externos e maior aproveitamento dos recursos internos.

Agricultura de Transição
Os antigos plantadores de milho representados nos murais em Tlaxcala nunca imaginaram que estavam a transformar a relação dos humanos com a ecologia da Terra.
Embora a existência de uma grande missão de recuperar o equilíbrio da natureza possa servir de inspiração, a maioria dos agricultores que se aventuram na agricultura sustentável, estão simplesmente interessados em melhorar a produtividade do rendimento das culturas agrícolas ou em economizar mão-de-obra ou dinheiro.
Ainda que os créditos negociáveis da captura de carbono possam talvez propiciar, em breve, mais uma nova fonte de rendimento, é possível que muitos agricultores adoptem a agricultura sustentável simplesmente porque a agricultura que depende do gás e da gasolina está a ficar mais cara.
Tal como demonstra a propriedade familiar de Angus Maurice na Austrália, a agricultura sustentável não é uma proposta "ou isto/ou aquilo" e haverá, necessariamente, um período de transição a partir do sistema actual para outro mais sustentável.
Mesmo se a maioria dos agricultores não aderir integralmente à agricultura orgânica nem aplicar os princípios da permacultura, eles podem aumentar seus ganhos — e os dos planeta — fazendo um pouquinho de cada vez, pouco a pouco.

Toby Hemenway: How Permaculture Can Save Humanity and the Earth, but Not Civilization

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