Lynn Margulis (Ilustra por Juliana Adlyn) |
Atualmente, a teoria da endossimbiose é amplamente aceite e reconhecida, mas o primeiro trabalho de Lynn Margulis a defendendo foi rejeitado por mais de uma dúzia de revistas. Ainda após a publicação, Margulis precisou de muita argumentação e persistência para defender suas ideias. Tais qualidades, no entanto, faziam parte de sua personalidade desde cedo. Quando criança, era considerada uma má aluna, pois não aceitava argumentos de autoridade e acreditava apenas no que via com seus próprios olhos. Margulis achava o ambiente escolar tradicional entediante. Aos 14 anos foi aprovada na University of Chicago Laboratory Schools, onde pôde desenvolver sua paixão pela ciência, num ambiente que considerava academicamente estimulante e onde tinha acesso a trabalhos científicos de diferentes áreas. Margulis foi uma “naturalista à moda antiga”. Não se contentava em fazer o que diziam que ela deveria fazer e não se restringia a uma área de conhecimento ou a uma época. Buscava informação sobre tudo que despertava seu interesse e que a ajudasse a entender o mundo, sempre com uma visão abrangente. Lynn Margulis dizia que seu amor pela ciência surgiu porque percebia que a ciência não era uma questão sobre sua opinião política ou orientação, mas uma forma de descobrir o mundo diretamente a partir de evidências: “E eu nunca havia visto isso na minha vida. Eu via apenas pessoas dizendo ‘você deve fazer isso porque ele disse, e ele sabe mais do que você’.” (tradução livre).
Além da teoria da endossimbiose, Lynn Margulis colaborou com James Lovelock no desenvolvimento da hipótese Gaia, que defende a ideia da biosfera como um sistema ativo de controle, capaz de manter a Terra em homeostase. Perceba que essa ideia é diferente do que muitos pensam sobre a hipótese de Gaia, considerando o planeta como “um organismo”. Tal má interpretação do conceito originalmente proposto por Lovelock e Margulis colaborou para que ele se tornasse popular entre movimentos anti-ciência. Ainda, essa hipótese gerou mais discussão entre cientistas de diferentes áreas, pois muitos consideram uma hipótese bonita, poética, mas difícil de ser testada. Mais uma vez, a visão de Margulis ia contra o que a maioria dos cientistas de sua época pensavam. Para ela, entretanto, Gaia nada mais é do que a “simbiose vista do espaço”. Ainda hoje, Gaia trata-se, no mínimo, de uma hipótese inspiradora e intrigante, e muita discussão ainda deve rolar a respeito dela.
Lynn Margulis recebeu diversos prêmios ainda em vida, principalmente por causa da teoria da endossimbiose. Dentre eles, destacam-se a “National Medal of Science”, dada pelo presidente dos EUA a cientistas por suas contribuições de destaque, e a medalha “Darwin-Wallace” – dada pela Linnean Society of London a cada 50 anos em reconhecimento a “grandes avanços na biologia evolutiva” Como se não bastasse a carreira brilhante como cientista, Lynn Margulis também escreveu diversos livros (muitos em parceria com seu filho Dorian Sagan) para divulgação de suas teorias e de ciência em geral para público leigo. Margulis faleceu em novembro de 2011 – sua história e seu amor pela ciência, entretanto, continuam a nos inspirar.
Para saber mais:
Teoria da endossimbiose:
Sagan, L. 1967. On the origin of mitosing cells. Journal of Theoretical Biology. 14 (3): 225–274. doi:10.1016/0022-5193(67)90079-3
Gray M. W. 2017. Lynn Margulis and the endosymbiont hypothesis: 50 years later. Mol. Biol. Cel. doi:10.1091/mbc.E16-07-0509
Hipótese Gaia:
Lovelock, J.E.; Margulis, L. 1974. Atmospheric homeostasis by and for the biosphere: the Gaia hypothesis. Tellus. Series A. Stockholm: International Meteorological Institute. 26 (1–2): 2–10. doi:10.1111/j.2153-3490.1974.tb01946.x
Doolittle, W.F. 2017. Darwinizing Gaia. Journal of Theoretical Biology. doi: https://doi.org/10.1016/j.jtbi.2017.02.015
Margulis, L. 1998. The symbiotic planet: a new look at evolution. (Recomendo fortemente a leitura deste livro!!)
Livros de Lynn Margulis e Dorion Sagan traduzidos para português:
Microcosmos (em Espanhol)
Fonte: Cientistas Feministas
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