sábado, 6 de junho de 2020

Não temos motivo nenhum para não ter esperança. Mas temos também de ter responsabilidade.

Fonte: aqui

Nos últimos meses, o mundo assistiu à rápida disseminação do novo coronavírus. De pequeno surto a pandemia global, em pouco mais quatro meses a Covid-19 chegou e atingiu-nos a todos. Colocou-nos em isolamento, afetou economias e criou restrições a pelo menos de um terço da população mundial.

Apesar de estarmos em modo reação, este momento deve ser encarado como uma oportunidade para reflexão, também na Ciência. Uma rápida e evidente conclusão a que todos chegámos, com esta pandemia, é que a Ciência e os cientistas são importantes. Se algo que se tornou claro durante esta pandemia, é que a Ciência feita ao longo destes anos está a revelar-se essencial no desenvolvimento de respostas e tratamentos à Covid-19.

António de Sousa Pereira, Reitor da Universidade do Porto [e médico] foi o mais recente convidado do Dean’s Lounge. Numa conversa informal com Patrícia Teixeira Lopes, associate dean da Porto Business School a propósito da "Ciência da Pandemia”, o Reitor da Universidade do Porto partilhou a sua visão sobre a mudança de paradigma eminente, na Ciência.

Segundo o Reitor da Universidade do Porto, “temos atualmente doenças de países pobres, que não merecem grande atenção por parte da grande investigação internacional. Felizmente, temos doações de fundações como a fundação Bill & Melinda Gates, mas os avanços no combate a doenças como a malária ou a tuberculose têm sido muito poucos”. O grande investimento tem recaído na investigação do prolongamento da vida. Veja-se o investimento da Google e da Microsoft na replicação celular perfeita, em projetos como o Calico - California Life Company.

“A COVID-19 veio colocar-nos os pés no chão. Estávamos no domínio do mirabolante, com investimentos de milhões em técnicas sofisticadíssimas que iriam estar acessíveis apenas a alguns e, de repente, estes que pensavam poder comprar com dinheiro a eternidade, percebem que há uma coisa tão simples como um vírus que pode destruir a vida destes, que se julgavam ser absolutamente inatacáveis”.

Para António de Sousa Pereira, o contexto que estamos a viver obriga a repensar tudo o que estava a ser feito. “Vamos ter de perceber que só somos saudáveis se a sociedade em que estamos inseridos for saudável.”

E aponta o caso paradigmático de Singapura, país exemplar no combate à COVID-19 , mas que, por não ter em consideração as comunidades imigrantes a viver em guetos, não conseguiu controlar a disseminação da doença e deixou cair por terra todo o trabalho desenvolvido. E isto obriga a repensar tido aquilo que estava a ser feito, obriga a que as Nações olhem para doenças não tão sofisticadas” e se tomem decisões de investimento que possam beneficiar toda a humanidade.

Para isso, a cooperação entre países é essencial. Talvez por isso, António de Sousa Pereira mostra-se preocupado com a posição dos EUA - “Quando vemos que uma das nações tecnologicamente mais evoluída se está a colocar à margem de tudo isto, fico preocupado. Pensar que a Ciência, de uma certa forma global, possa evoluir sem a participação dos EUA é estranho para mim, pelo menos para já.”

Sobre a capacidade de adaptação da Ciência, António de Sousa Pereira é claro, no papel que os decisões políticas (e económicas) têm: “a Ciência tem tido uma capacidade enorme de se adaptar às circunstancias. E diga-se circunstâncias como sinónimo de financiamento. Quando os decisores decidem o investimento para uma determinada área, a Ciência vai atrás desse financiamento. Foi o que aconteceu recentemente. A União Europeia muito rapidamente decidiu criar um programa para financiar projetos na área da COVID-19 e a resposta da nossa comunidade foi fantástica. Os nossos laboratórios mudaram rapidamente a direção e estão a fazer investigação aplicada e a fazer bem.”

Um sinal promissor de viragem no rumo que a investigação científica que a a Europa estava a seguir. - “A Europa andava muito diletante (...), andava a fazer investigação sem rumo. Neste momento, acho que já todos perceberam, na Europa, que a investigação tem de ser direcionada para os produtos inovadores e para a criação de mais-valia. Esta é uma consequência já visível [do contexto] e que acredito que já não volte atrás. (...)

Não temos motivo nenhum para não ter esperança. Mas temos também de ter responsabilidade.”

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